Brasil - Ontem acordei tranquilo, como sempre, depois de um final de semana muito abençoado pela graça de Deus; e, como de costume, decidi saber das notícias da nossa terra, já que pelo menos posso ouvir a RNA e ver a TPA Internacional pela WEB; (claro que não me limito somente a esses dois órgãos informativos; aliás, se assim fosse estaria perdido) assim, mesmo estando na diáspora eu fico sabendo das nossas "malambas" e não me perco, pois fico sabendo e crio uma capacidade própria abordagem da nossa realidade ainda que subjetivamente.


Fonte: www.nelsoncustodio.com


Porém, ontem, dia 26 de março de 2012 meu dia começou de forma atípico por conta de uma notícia surpresa que ouvi ao sintonizar a RNA no noticiário das 13 horas. Como manchete e em primeira mão, uma notícia que me deixou bastante atormentado ao ouvi-la.


A manchete dizia respeito à alteração do estatuto dos deputados à Assembleia Nacional prevendo várias punições a todos os deputados que saírem da sala no momento de uma votação. Por alguns minutos parei e não me contive, decidi colocar um post no meu facebook, sobre o assunto, como sempre faço; mas à medida que fui escrevendo fui percebendo que deveria evoluir para uma reflexão; não tenho muito tempo para escrever um artigo científicosobre o assunto - gostaria muito -, mas penso que não custa nada fazermos uma reflexão em torno do que, realmente, está acontecendo no nosso cenário político.


Entendo que nós só conseguimos entender as ações de um indivíduo, ou uma coletividade, se conseguirmos entender as motivações por trás de suas ações; em síntese, para cada ação existe sempre uma motivação, - princípio dos motivos determinantes - mas às vezes pela imprevisibilidade do ser humano nem sempre as ações são proporcionais às motivações. Entender isso é de epítome acuidade para a compreensão da realidade humana e, claro, da nossa realidade!


Acontece que, cada vez mais, e isso não é segredo para ninguém, o MPLA tem tomado atitudes flagrantemente inconstitucionais; algumas atitudes são tão radicais, ridículas e antidemocráticas que, claro, não ferem apenas a lei, mas também ferem, terminantemente, vários princípios tais como os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. É um jogo tão sujo que chega a ser "nojento" (espero não ferir a sensibilidade de ninguém, mas penso que não tem outra forma de dizer).


A bola da vez, como disse, é essa proposta de lei de revisão do estatuto dos deputados. Na proposta de lei, de autoria da bancada parlamentar do MPLA, está previsto a punição dos deputados que saírem da sala na hora da votação; essa punição abrange ainda, segundo a proposta da lei, descontos nos salários e advertências.


Sem dúvidas nenhumas é claramente perceptível que se trata de uma atitude (pressão política, à força) em que o MPLA quer fazer com que a oposição faça parte da sala de votação (dizendo, desta forma, para todos que eles também estavam presentes na hora da votação de qualquer lei), ainda que a lei a ser votada seja categoricamente inconstitucional. É uma forma de legitimar o ilegitimável; uma atitude antijurídica e antidemocrática.


Sem dúvidas algumas, isto está a acontecer por conta das várias saídas da sala de votação que a oposição tem tomado nos últimos tempos, e, diga-se, com muitarazão, como forma de protesto contras às flagrantes inconstitucionalidades que o MPLA tem tomado não somente na propositura de algumas leis que são materialmente falando inconstitucionais, mas ilegais, sobretudo nas fases de deliberações e votações., e uma clara forma de legitimar as suas ações e aplacar os ânimos da opinião pública, - já que isso tem gerado um descontentamento público - surge essa forma de pressão na tentativa de contornarem a situação para mais tarde virem à público e dizer que a oposição é irresponsável e não faz nada no parlamento mesmo quando se trata de votar leis que digam respeito a vida pública da nação.


É caso mesmo para dizer que o MPLA não é bobo. Sabe como contornar e manipular as coisas; afinal, tem maioria absolutíssima no parlamento, o que lhe dá o direito - na ótica deles, é claro - de fazerem e desfazerem a seu bel prazer o que quiserem ainda que sejam atitudes que violem a lei e a própria constituição(coitado do nosso povo com os representantes que tem).


O que o MPLA não percebe, do ponto de vista político e jurídico, é que quanto mais eles tentarem contornar a situação do país usando a mordaça, a ilegalidade e as imoralidades, mais a sociedade angolana vai se dando conta de tudo isso; e mais; o MPLA vai caindo em descrédito para a maior parte da sociedade angolana informada e formada. Pode ser que os argumentos que o MPLA tem utilizado para violar a lei e a constituição valham para os mais"tapados"; mas mesmo assim, essa é uma situação que não conseguirá se sustentar por muito tempo, pois ninguém consegue sustentar a falsidade a todo tempo.


Na hora certa a motivação de tudo acaba aparecendo e quando aparece, não adianta tentar manipular tudo, pois, seria o mesmo que tentar tampar o sol com a peneira (o que é impossível). Ao tentar contornarvárias situações unilateralmente do ponto de vista político ou jurídico, o MPLA se arrisca, cada vez mais, a ser considerado um partido ditatorial e intolerante despertando, contra si, uma visão contraria da consciência coletiva nacional.


Ora, a meu ver, essa lei ela é inconstitucional, pois fere terminantemente a imunidade material (substancial ou te conteúdo) dos próprios deputados que não podem, de modo algum, ser punidos por opinião, o que inclui a forma de votação de qualquer lei. Essa imunidade é chamada de inviolabilidade e visa garantir a liberdade de opinião, palavras e votos dos membros do Poder Legislativo.


Isso significa que os deputados não podem sofrer nenhuma sansão de natureza penal, civil, administrativa (ou disciplinar) e política no pleno exercício de suas funções e por analogia se inclui a atitude de abandono da sala de votação que os deputados da oposição tem tomado como forma de protesto. É uma forma de dizer "não" tal como se um deputado se abstivesse na hora de votar uma lei, pois, convenhamos ninguém pode ser obrigado a engolir sapos, ainda mais quando em causa está a lisura da Constituição da República! E isso não significa abdicar das responsabilidades a si atribuídas pelo eleitorado necessariamente. É algo que faz parte do jogodemocrático; portanto, ninguém pode ser punido por isso. O que não pode é oMPLA usar o jogo sujo se valendo de inconstitucionalidades e infringir retaliações ainda que em forma de lei para contornar tal situação.


Do ponto de vista de eficácia dessa norma, pode-se dizer que ela surtirá pouco efeito porque mesmo que os deputados fiquem na sala de votação, eles podem se abstiver de votar bem assim como a não estarem presentes, pelo seu estatuto, a um determinado numero mínimo de vezes nas sessões durante o ano legislativo; é um direito que lhes assiste. O que a acontecer; ou seja, se essa modificação nos seus estatutos acontecer, daria azo para impetração de várias ações constitucionais ao Tribunal Constitucional; invés de político, esse problema se transformaria em um problema jurídico constitucional.


Pelo andar da carruagem, daqui a pouco vamos ter outra lei dizendo que os deputados são obrigados a não somente estarem presentes na sala de votação, mas também a votarem sob pena de incorrerem em uma sansão. - definitivamente esse sentimento não coaduna com o espírito democrático -.


Outro aspecto inerente a esta lei, é no que se refere aodesconto dos salários dos deputados que saírem da sala na hora de votação de qualquer lei. Eis, em nosso modo de ver, mais uma inconstitucionalidade do ponto de vista material. O deputado é um agente público como outro qualquerembora seja um agente político exercendo uma função política. A lei só traz a possibilidade de descontos em salários de qualquer funcionário público no caso de faltas injustificadas.


Ora não se pode, portanto, punir um deputado exercendo função política por ter saído de uma sala na  hora da votação, isso porque sair da sala de votação não equivale a não estar presente na sala e naquela sessão legislativa. Não estar presente e sair da lada, são duas coisas completamente diferentes. (grifei)


Salário é o conjunto de vantagens habitualmente atribuídas aos empregados, em contrapartida de serviços ao empregador, em quantia suficiente para satisfazer as necessidades próprias e da família; engloba o próprio salário a remuneração. Tem, portanto, natureza alimentícia; é um direito social elevado à categoria de direito fundamental. Sua garantia é estabelecida na lei, e é implicitamente protegido pela nossa constituição; tem como uma de suas garantias a irredutibilidade, exceto - repetimos - nos casos estabelecidos na própria lei.


O que significa que não pode, a nosso ver, o estatuto dos deputados prever o desconto nos salários dos deputados, - exceto nos casos estabelecidos na lei - ao protestarem a quando da aprovação de uma lei, por, supostamente, ela ser inconstitucional saindo da sala de votação, sob pena de violar a própria imunidade parlamentar, como já disse. A ser assim, tratar-se-á apenas de se colocar um peso, uma mordaça aos nobres deputados da oposição.


Não adianta a sociedade angolana está de olhos e sabe o que está por trás de cada uma dessas atitudes. O parlamento está parado porque a oposição disse que não participaria mais de nenhuma votação enquanto as coisas não mudassem. Mas como estamos em épocas de eleição e têm leis que precisam ser votadas, o MPLA precisa legitimar as suas atitudes e encontra na oposição uma forma de participação para tal escopo, pois, sozinhos a "batota" ficará mais explicita, apesar deles terem maioria absoluta e se quiserem podem aprovar tais leis.


Neste sentido, resta claro, que a oposição angolana, funciona como um instrumento, apenas, de legitimação de uma retórica democrática por parte do MPLA e do seu governo. Isso precisa acontecer paraconvencer a opinião pública nacional e, claro, principalmente, internacional afastando, desse modo, a imagem de um partido com um governo autoritarista. Só que a oposição e a opinião pública nacional já se deram conta disso a muitotempo e não querem mais fazer parte desse jogo antiético e imoral.


Como disse o MPLA não é bobo. Sabe o que faz. Agora, mais uma vez digo: coitado do nosso povo pelos representantes que tem. É preciso que fiquemos atentos e desmascaremos todos os atos atentatórios ao direito e a democracia.


Já deixamos as coisas irem longe demais e o povo angolano não é besta.