Luanda - Quando o dirigente de uma força política assegura perante uma televisão pública que o seu Partido vai ganhar as eleições e caso isso não aconteça só pode ser devido à fraude, essas palavras não podem ser encaradas apenas como uma atoarda irresponsável;


Fonte: JA

Quando uma organização comemora antecipadamente o sucesso de uma ficção forjada por fanáticos ou bajuladores, com palavras envenenadas que defraudam a esperança dos seus militantes, arrisca a desacreditar-se;

Quando o líder de um novo partido político que se afirma devidamente assessorado (não revela por quem ou por qual entidade suprema ele está protegido), ameaça que o “país vai parar” quando ele começar a falar qual um demiúrgo e se não baixam os valores da nossa Bolsa é porque não a temos, no mínimo, convenhamos, ele exagera.

As palavras como qualquer outra matéria dúctil usada pelos escultores e artistas podem dar origem a figuras e cenários conducentes a levar os homens a entreajudarem-se ou a lutar entre si. Em certas situações ou contextos sociopolíticos podem mesmo despoletar os melhores ou piores instintos. Ainda que sejam espalhadas ao vento.

Nos casos mencionados e noutros do mesmo jaez, que deste meu Observatório um tanto deslocalizado no espaço não me escaparam, notei que o estilo dos protagonistas–“le style c’est l’hommme même” – e os pormenores das figuras de linguagem utilizadas que delas ressaltam para além das nuances literárias, certos traços de carácter dos seus autores deveras inquietantes e para os quais me permito pedir a atenção dos meus eventuais leitores, mesmo aqueles que não estão afeitos a pesquisas psicanalíticas. Eles indiciam a existência de egos extraordinários.

Penso que os muangolé têm que se precaver quanto aos que se querem “estilar” e fazem uso de tudo que possa causar efeitos mesmo maus, como algumas hipérboles. Esses efeitos nem sempre são poéticos e desgastam quem tem que os suportar. Haka! Ninguém merece em vida estar sujeito aos sustos que eles se propõem desencadear.

Imaginem a hipótese de Angola parar – de Cabinda ao Cunene – não dar mais um passo, aboamado, através das revelações de um político ressabiado que o Tribunal Constitucional lhe enxotou das eleições. Foi o que um deles nos prometeu em termos de represálias. Os venerandos juízes do TC já não são mais venerandos? Da mesma maneira que os tribunais vão parar, que dizer das zungueiras, dos camponeses e dos pescadores atentos às marés que têm que dar no osso para sobreviver? Mas se nem todos os descontentes possuem, objectivamente, recursos para fazer pensar, serem protegidos por forças sobrenaturais que lhes permitam paralisar um país ou construir figuras escatológicas de estilo tremendista, tem quem nem por isso desiste de entrar em cacofonias que de tanto serem repetidas começam a causar perturbações que podem tornar-se sérias por quem faz uso delas de modo inocente. Não é o caso dos que o fazem de maneira calculada por terem perdido a noção do ridículo ou do sentido crítico. Trata-se da palavra da fraude que de tanto se repetir passou a ser um lugar-comum.

Mas se há figuras de linguagem que estão a perder a eficácia, a metáfora mantém-se em forma, em benefício não só dos escritores mas também de alguns políticos que passaram a usá-la “indireitamente”. A metáfora de que o Tribunal Constitucional é uma arma que dispara aos ditames ou caprichos do MPLA que se pode extrair da crítica do PDP-ANA (cuja candidatura foi recusada) não colhe. Não é justo nem crível.

Reconheça-se, porém, que espalhar palavras ao vento nem sempre é inócuo. Mas penso que elas ainda não comprometeram a credibilidade das nossas futuras eleições.