Luanda - Numa sociedade que se pretende pacífica, a paz social encontra no respeito pelas leis justas a sua fonte bem como a sua sustentabilidade. As leis justas contêm os princípios e os critérios que permitem a avaliação da justeza das acções de todos os indivíduos e instituições no plano social, cultural, económico e político.


Fonte: Club-k.net


No processo eleitoral em curso, a Constituição, a Lei Orgânica das Eleições Gerais, a Lei Orgânica sobre o Funcionamento da Comissão Nacional Eleitoral, a Lei de Observação Eleitoral, a Lei do Financiamento dos Partidos Políticos, a Lei de Imprensa, a Lei dos Partidos Políticos, a Lei da Nacionalidade e a Lei do Registo Eleitoral – com o subsídio de outras mais – no essencial contêm as regras que ditam o que deve e não deve ser feito, como deve ser feito, que instituições e seus respectivos titulares têm competência para praticar actos pré-definidos, quando devem ser praticados os actos e os prazos para tal.
 

Aceitas as regras do jogo, inscritas nas sobreditas leis, de boa-fé, do processo eleitoral podemos gerir a conflictualidade e corrigir os erros de maneira a que o seu resultado seja aceito por todos, sem reservas. Salvo melhor opinião, todos os partidos políticos e organizações da sociedade civil hão-de querer saber, conhecer, as regras que se aplicam a cada situação e a cada caso concreto para desta maneira evitarmos os subjectivismos e os irracionalismos, que os haverá sempre. Neste quadro, preocupa-me deveras a hipótese de os partidos políticos não estarem preocupados com o escrupuloso respeito pelas regras legais estabelecidas para todo o processo eleitoral. Igualmente, que as balizas da discussão livre e pública de todos os problemas com os quais nos confrontamos ou venhamos a confrontar no processo eleitoral não sejam as regras legais, mas outros meios, como sejam por exemplo, a mentira, a manipulação, o terrorismo e a violência verbal e/ou física irracionais.
 

Constato que a Comissão Nacional Eleitoral, a Procuradoria-Geral da República e o Tribunal Constitucional têm estado a dar sinais preocupantes quanto ao respeito que devem às leis (art. 6.º/1 da CRA). Os membros da Comissão Nacional Eleitoral e magistrados da Procuradoria-Geral da República têm de certeza assistido aos programas da TPA, Rádio Nacional e lido o Jornal de Angola e testemunhado a permanente campanha que esses órgãos de comunicação social de todos os angolanos fazem a favor de um partido e candidato. Perante dúvidas e gritante violação de regras da Lei de Imprensa [art. 5.º/2; al. a) do n.º 1 do art. 7.º; 10.º; 11.º; al. e) do n.º 2 do art. 74.º]; da Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais [art. 65.º;]; da Lei Orgânica sobre a Organização e Funcionamento da Comissão Nacional Eleitoral [as als.  i) e k) do n.º 1 do art. 6.º;] da Lei do Registo Eleitoral [arts. 33.º, 43.º, 44.º, 46.º, 47.º, 48.º, 68.º, 74.º] – que impõem o dever legal de isenção e igual tratamentos dos partidos e candidatos pelos órgãos de comunicação social do Estado, o contraditório no tratamentos de matérias de interesse público, a exposição dos cadernos eleitorais para que os cidadãos possam conferir a sua correcção no tempo previsto pela lei, a não alteração dos cadernos eleitorais senão nos termos previstos pela lei, não alteração dos cadernos eleitorais 15 dias antes do início da campanha, o limite temporal e os procedimentos para a emissão de nova via do cartão de eleitor,  e o princípio de que as eleições que se realizarem durante o período de actualização efectuam-se com base nos dados de registo eleitoral da actualização anterior – a Comissão Nacional Eleitoral e a Procuradoria-Geral da República observam um silêncio tumular. Todavia, vêm fazendo afirmações públicas que mais se parecem com “sentenças judiciais” em defesa do direito à honra e ao bom-nome de um partido e de um candidato, quando a Constituição e as leis ordinárias são claras no que concerne à não censura e à liberdade de expressão.


 As pessoas são livres de dizer o que quiserem e devem poder exteriorizá-lo assumindo as consequências da responsabilidade civil e criminal quanto ao que dizem sobre terceiros. Quer dizer, os lesados têm os meios constitucional e legalmente previstos para a defesa dos seus direitos necessitando apenas que o sistema judicial esteja preparado para decidir as suas queixas com celeridade. Não faz sentido nenhum que a corrupção e os seus agentes, não sejam abordados nos tempos de antena e não só, de maneira responsável: durante todo o tempo e em especial no período da campanha eleitoral. A Constituição e as leis ordinárias impedem que candidatos corruptos ou agentes políticos corruptos atinjam ou se mantenham no poder. Para que o Estado e a sociedade se livrem dos corruptores e corruptos é necessário, primeiro, que haja denúncia [art. 73.º da Constituição da República de Angola (CRA)] baseada em factos verdadeiros, feita publicamente, e que as consequências jurídico-políticas tenham lugar.
 

O Tribunal Constitucional (TC) tem agido com duas medidas e dois pesos. Compete ao Tribunal Constitucional “verificar e declarar a elegibilidade dos candidatos a Presidente da República e a Deputados à Assembleia Nacional nos termos da Lei Eleitoral.” [al. k) do art. 16.º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional]. Ex officio, o Tribunal Constitucional está obrigado a verificar o registo criminal de cada um dos candidatos, sendo certo que pelo facto de um candidato ser figura pública, a opinião pública sabe que foi condenado por um tribunal. O registo criminal não pode aparecer limpo fazendo os juízes do TC e o representante do Ministério Público nesse tribunal vista grossa a esse facto.


No mínimo, por um lado, o Tribunal Constitucional ou o representante do Ministério Publico devem esclarecer a opinião pública sobre o assunto, até porque o bom-nome, a consideração, a imagem e a honra da pessoa em causa foram maculados e, por outro lado, mantém-se a dúvida dessa mesma opinião pública no que concerne à elegibilidade e ao favorecimento por parte do Tribunal Constitucional e do Ministério Público em relação àquela pessoa. Esse mesmo tribunal terá colocado no seu site (lugar) eletrónico informações sobre formações políticas expondo-as: exigindo-se, pois, igual tratamento para situações e casos nos quais a legalidade também esteja em causa. Note-se que, contrariamente ao que se pretende fazer crer, o TC tem a competência de verificar se os candidatos reúnem as condições legais para ser eleitos em função dos documentos e informação apresentadas ao tribunal. Como pode o TC pôr em causa a autenticidade de documentos de alguns partidos e em relação a outros partidos fazer vista grossa!? Como pode a Procuradoria-Geral da República vir a público defender direitos de um cidadão, direitos de que só ele tem legitimidade processual para os defender perante os tribunais, quando perante crimes públicos, anunciados via TPA e dos quais resultaram graves danos morais e físicos para as vítimas, obrigada a agir, não o tem feito? Quais são os fundamentos e critérios legais que levam esses órgãos a agir dessa maneira?
 

Será que queremos todos, ou o maior número, ou os partidos políticos, ou as organizações da sociedade civil, ou apenas a título individual, ou os órgãos do Estado, que o processo eleitoral tenham lugar com respeito pelas regras legais? Estamos todos interessados na paz social fundada no respeito de todos nós, sem excepções, pelas leis justas em vigor?