Luanda - Se votar fosse um acto de liberdade, na verdadeira dimensão e acepção deste termo, teríamos um voto assistido pelos valores que transcendem e alimentam os egos. Explico-me: temos, infelizmente, neste Século XXI, homens e mulheres que fundamentam a sua pertença ou opções político-partidárias em razão da tribo, da herança familiar, de interesses patrimoniais, de cargos ou papel social, de certos proteccionismos, etc., feitos reféns.


Fonte: Club-k.net

Obviamente, há que respeitar essas razões, embora, pequem por defeito por potenciarem o poder de realização do ego. Deste jeito concordaria com Hannat Arendt quando afirmava que o poder se tornou o centro e a essência da acção política quando foi separado da comunidade que se supunha servir. Olhando para as democracias africanas dominadas pelo conceito do chefe, uma espécie de um Soba ou feudocrata que fala para o povo, marca de democratas disfarçados, e não com o povo lemos com facilidade as duas estradas: de um lado a de distanciamentos humanos e sociais que fomenta e nutre as classes, os privilégios, e elites, e do outro lado, a estrada da comunidade (comum+união) cuja marca é o bem-estar comum e não de certos grupos. Na verdade, é a crise da cidadania quando vejo um homem ou mulher  que estuda até à 4ª classe e desiste porque não tem dinheiro para tratar o Bilhete de Identidade; quando vejo alguém que é perseguido, excluído, preso ou morto por assumir e manifestar a sua identidade ideológico-partidária. De outro modo, é a framentação do tecido sócio-político e a ditadura de distanciamentos humanos.


A campanha eleitoral está ao rubro em Angola e, isso é bom. O clima é de proximidade e diálogo com o cidadão, mais do que simples eleitorado. E nesta fase não há lobos, todos são cordeiros. Ou seja, até os lobos viram cordeiros. Contudo, ainda, não ouvi algum pronunciamento dos candidatos à Presidência da república sobre a política ambiental num mundo onde  o maior inimigo comum, ricos ou pobres, é o ambiente. Aliás, o próprio conceito de segurança, hoje, envolve a questão ambiental. Como falar do desenvolvimento sustentável quando não existe política ambiental para quem governa ou pretende governar? Que desenvolvimento se pretende? Essa questão é muito pertinente, senão, mesmo decisiva em actos eleitorais. Hoje, o problema não é distribuir a riqueza, mas garantir a sustentabilidade desta riqueza. O povo precisa de saber que modelo de desenvolvimento se pretende para o país.

 

Outra reflexão vai para o perfil dos representantes do povo ou candidatos a deputados. Temos no país deputados que não são o exemplo de unidade, de fidelidade, de tolerância, de fraternidade e de respeito, sobretudo, com o povo que, supostamente, representam. Andam em carros de muito luxo e com prioridade nas estradas até quando acordam tarde. O lugar que ocupam se fosse, realmente, de representação do soberano, o povo, ninguém mais os queria ver. Peço desculpas, porque há sempre excepção. Digo, supostamente, representam porque não é o povo que escolhe ou elege quem gostaria que o representasse. Para a nossa realidade a disciplina partidária cegou o interesse nacional e todos viraram gladiadores não por causas nacionais, mas por interesses partidários. Em causa estão as posições. Outros deputados se assumem como verdadeiros advogados de partidos e reduzem a sua atenção para esse triste papel. O que é que o povo espera desse deputado? Aprendi e sei que um deputado é um homem ou mulher que se posiciona, acima de tudo, para lá de segmentos partidários. A sua marca é o interesse nacional. Por isso, merecem todo o meu e nosso respeito. Nele convergem as esperanças e expectativas do cidadão. Não é o facto de ser deputado pela bancada X ou Y que, de todo, se transforma num instrumento partidário. Não gostaria de ver um deputado a contornar os fundamentos básicos da ciência para dar lugar a crendice ideológico-partidária. Com a qualidade dos deputados a democracia ganha qualidade. O problema não deve ser o número como factor de desequilíbrio, mas a qualidade. É para aí aonde correm as actuais democracias. E é isso, que em democracia dá dignidade e respeito às minorias. Afinal, todos sabemos que a democracia representativa está enferma ou em crise. 


Para a nossa realidade outra questão vai para a democracia participativa. Há que pensar no modelo democrático participativo que permite que não seja apenas A a tomar iniciativas até decidir sózinho para dar a conhecer ao povo. Isso, está ultrapassado. O cidadão é convidado a participar, activamente, em processos de tomada de decisão. Mais, deve controlar as políticas públicas conjuntamente com o Estado. Nisso, urge a criação de espaços de comunicação que articulem representantes da esfera estatal e da sociedade civil com o fim de estabelecer um canal de mediação entre os diferentes actores sociais. Voto, quo vadis?