Luanda  - A manifestação convocada sábado pela UNITA em Luanda reuniu várias formas de descontentamento na sociedade angolana contra a Comissão Nacional Eleitoral (CNE), num protesto que começou num cemitério, teve dois fantasmas e terminou com alertas à caça ao homem.

Fonte: Lusa


A ação do maior partido de oposição angolano teve início a meio da manhã com centenas de `motards` junto ao cemitério de Santana, na saída norte de Luanda, em frente do Comando Provincial da Polícia Nacional, que pouco teve de se mostrar.


As cores vermelha e verde do partido do Galo Negro dominaram a larga avenida que liga Luanda e Viana, num cortejo pacífico no mesmo dia e local para onde estava prevista uma manifestação não autorizada dos ex-militares, que não apareceram.


"Os cadernos eleitorais estão demorados, das atas [síntese das secções do voto] não sabemos. Os delegados dos partidos não têm cartões. Eu sou delegado e não tenho cartão. Em 1992, foi assim, em 2008 foi assim, em 2012 não vai ser assim", afirmou Domingos Coragem, 28 anos, seguindo as críticas da liderança da UNITA à CNE, à frente de um grupo de jovens cheios de vontade de falar.


"Para fazer estradas, partem casas e metem as pessoas em tendas", acusa um. "E depois há as casas evolutivas, que chegam a ser partilhadas por quatro famílias", prossegue outro, "não há empregos", "não temos dinheiro para a universidade", "os professores são obrigados a ser do MPLA"... "Não somos malucos, é a frustração", resume Coragem, enquanto os seus "maninhos" continuam a desfilar o rol de críticas ao partido no poder.


À frente de um tosco bailado, ergue-se um retrato do fundador da UNITA, Jonas Savimbi, que surge, dez anos após a sua morte em combate, como uma assombração, embalada pelo cântico "queremos um angolano", em alusão ao velho fantasma são-tomense de José Eduardos dos Santos, a outra figura essencial da história recente angolana,

Pela manifestação circulam muitas fotocópias que ligam o Presidente da República a São Tomé e Príncipe, embora a biografia oficial informe que o chefe de Estado nasceu no bairro do Sambizanga, em Luanda, e o grito "queremos um angolano" será ouvido muitas mais vezes.

Apesar de convocada pela UNITA, várias formas de descontentamento, abrigaram-se do guarda-chuva do maior partido de oposição e do seu slogan "unidos pela mudança".

"Nem todos os que estão aqui são da UNITA, mas todos estão aqui pela frustração", afirma José Alberto, um engenheiro mecânico de 33 anos que garante não ter filiação partidária. "É um ato voluntário, não viemos para ouvir cantar ou beber, mas porque esperamos pela mudança há 37 anos."

Vários artistas entoam no palco da concentração final os seus poemas antirregime: "Até na Bíblia está escrito que o pouco é para todos, mas aqui em Angola é só para eles", canta um "rapper" que se identifica como Muçulmano Gangster. A jelaba branca mostra o nome Bin Laden sobre uma cruz cristã, a frase "Xtou Vivo" e ainda "32 é muito", o `slogan" dos jovens da sociedade civil que promoveram manifestações contra o Governo, numa alusão aos anos de poder de José Eduardo dos Santos.

As frases chave estão em toda a parte: "A intimidação é a arma dos fracalhotes", "O arquiteto da Fraude", "onde estão Cassule e Kamulingue?", dois militares veteranos desaparecidos num protesto recente e também recordados por Isaías Samakuva, líder do partido, quando finalmente sobe ao palco para fazer o seu discurso contra a CNE e pedir "coragem" para novos possíveis protestos.

No Largo da Família, estão poucos milhares de pessoas, numa mobilização bem distante das multidões arrastadas pelo MPLA, e o líder da UNITA usa a quantidade como um argumento: "Vocês não precisam que vos metam nos autocarros à força." E um aviso: "Podem andar estar aí para nos caçar, não aceitem provocações, estão a compreender?" Alguns disseram que preferiam ficar.