Luanda - Acabou a paz das zungueiras nas ruas de Luanda. Quem deambula nos arredores do mercados Congolenses e São Paulo, e curiosamente pela rotunda da Cuca, dá-se conta do estado de quase abandono em que se encontram essas áreas, normalmente apinhadas de senhoras que ai vendiam produtos diversos. Antes das eleições tudo parecia na maior das calmas.

Fonte: U.A

Parecia ter havido, entre as autoridades e a comunidade de zungueiras, uma espécie de pacto de não-agressão. Esses dois agentes sociais partilhavam o mesmo espaço geográfico e coabitavam harmoniosamente. Afinal era apenas sol de pouca dura, era uma estratégia que visava transmitir a ideia de que o MPLA estava interessado no voto das Zungueiras.

Agora, volvidos pouco mais de um mês das eleições, o regime do MPLA, por via do Governo Provincial de Luanda, decidiu acabar com a ilusão criada e está a dar a sua face real de quem não se compadece com o sofrimento do povo.

É nesse sentido que as corridas voltaram às ruas de Luanda, principalmente naqueles locais acima citados, onde os agentes da fiscalização e da polícia fazem valer a lei da força. Dão corrida, destroem e apoderam-se do negócio das pobres mulheres zungueiras.

A nossa reportagem deslocou-se à Cuca e conversou com algumas dessas mulheres que fazem da rua a fonte do sustento de suas famílias. Ermelinda Dias disse ao nosso repórter que os agentes da fiscalização e da polícia nacional, fazem-lhes mal todos os dias.

“Depois das eleições já não querem saber do povo. Estão a dar-nos corrida. Nos perseguem até nos becos, nos maltratam, dão porrada e ainda por cima de mudam os processos (casa onde guardam os produtos para venda). Assim, como é que o governo diz que está a trabalhar?”, questionou.

Uma outra senhora que responde pelo nome de Marta António acabava de perder o seu negócio quando o nosso repórter a abordou e não deixou de manifestar a sua frustração. “A corrida é demais, a pessoa não consegue vender. Há pouco tempo me receberam o meu negócio, partiram a minha banheira. Eles querem que nós ficamos em casa, dizem que estamos a fazer lixo, aqui na rua. Nós, então, vamos fazer como meu Deus, as crianças vão comer o quê, se estão a nos mandar ficar em casa?”, explicou.

Maria Cristina é também Zungueira. Sai de casa cedo para vender na rua, com a finalidade de ganhar o pão para as crianças. Seu marido é desempregado. Segundo afirmou, as mulheres que ficam a vender não têm dinheiro para comprar lugar no mercado formal.

“Estão a nos dar muita corrida, não nos deixam vender à vontade. A praça que nos deram é um sítio que nós não gostamos, lá Africampos, porque estão a nos cobrar trinta mil e nós não temos esse dinheiro. Disseram-nos que era para nós e quando fomos lá encontramos outras senhoras, já não tinha lugar para nós. É por isso que nós continuamos aqui na rua. Eles nos correm, recebem os nossos negócios, nos bicam, há quem vai preso e estamos mesmo assim a vender nesse sofrimento. Os fiscais levam os nossos produtos, não sei se vão vender ou comem. É complicado”, lamentou.

Margarida José, uma outra Zungueira abordada pelo nosso repórter acusa os agentes da fiscalização e da polícia de lhes maltratar e de apoderar-se do negócio das pobres mulheres. “A Polícia e a fiscalização estão atrás de nós, entram nas casas do processo (casa onde guardam negócio), levam o negócio das senhoras, isso é injusto que estão a fazer. Nos maltratam, dão-nos com porretes. Não temos solução, se não vender assim mesmo na rua”, afirmou.

Josefa da Costa denuncia que sua colega Zungueira abortou em consequência de maus-tratos por agentes da fiscalização e da polícia nacional. “Antes das eleições estava tudo bem. Não nos davam corrida, agora que as eleições passaram e nós votamos, estão a nos dar corrida. Nós não queremos assim, deviam dar-nos pelo menos um lugar fixo onde possamos vender à vontade. A nossa colega grávida de cinco meses, lhe bateram e fez aborto. O governo está a trabalhar como? Nós não queremos assim”, desabafou Josefa da Costa.

Esse é o clima entre as mulheres Zungueiras, agastadas com os maus-tratos que recebem da fiscalização e da polícia, quando se fazem à rua para vender produtos, única fonte de subsistência de suas famílias.

Pelo que se pode perceber das lamentações dessas mulheres batalhadoras, o governo devia instituir um mecanismo de diálogo, para que medidas a serem tomadas sejam a contento e conflituem pouco com os interesses dos cidadãos.