Luanda - A reintegração de ex-presidiários na sociedade esbarra em vários obstáculos, os quais inviabilizam qualquer esforço institucional de recuperação do indivíduo infractor.

Fonte: Club-k.net

Nessa luta é preciso contar não apenas com uma estrutura carcerária eficiente, capaz de proporcionar ao preso uma capacitação mínima de subsistência ao ser libertado, mas também com o apoio da sociedade, possibilitando a volta do preso à vida produtiva, aceitando-o em todos os sectores da sociedade, sem preconceito em relação à conduta anterior.

A condição de infractor tem raízes na própria desigualdade social, com suas condições e distorções, quer no meio escolar, no trabalho e mesmo no ambiente familiar.

Uma falsa crença muito questionada quando se fala sobre a reintegração do preso é a de que a família seria a tábua de solução do regresso, onde ele receberia toda a compreensão e sustentação emocional necessária à sua plena recuperação. Essa visão parece não considerar que, muitas vezes, foram as próprias hostilidades do seio familiar que levaram o indivíduo ao crime.

Portanto, a família não possuía tantas condições para fazer regredir esse trauma, principalmente porque não existe nenhum trabalho terapêutico para que os componentes do grupo familiar reflictam sobre os valores passados e presentes.

Ao preso, ao regressar ao seio de uma família carente, será exigido muito, em virtude do factor económico decorrente das múltiplas necessidades dos filhos e das esposas, que virão somar-se às do próprio preso.

A dificuldade adicional de arranjar emprego actua como um estopim, que irá desencadear antigas emoções e frustrações, levando-o de volta ao crime. A má distribuição de oportunidades, o abandono e o desemprego contribuem, sobremaneira, para o desvirtuamento do indivíduo pobre, que se vê à deriva, sem amparo e perspectiva de solução de seus problemas mais urgentes. As famílias, assim, vêem-se reduzidas a núcleos de vícios e disfunções sociais.

Os pais não têm condições de dar aos filhos a educação que a comunidade requer, enquanto algumas instituições se esquivam a cumprir com o seu papel de amparar a infância e os cidadãos. Desse modo, as crianças encontram hostilidade no próprio grupo familiar, cujos componentes também são vítimas de dolorosas frustrações, ambas levando os jovens ao mundo do crime.

Assim, pouco valeria a pena despender -se o esforço heróico no sentido de reinserção do preso se, ao recolocá-lo na sociedade, ele viesse a encontrar o mesmo caldeirão em que fermentaram anteriormente as suas crises existenciais e o seu desespero, fazendo reincidir no mesmo crime ou em desajustamento mais perniciosos ainda, aprendidos no cárcere.


Essa é, sem dúvida, a realidade da maioria dos centros urbanos do país, onde a política carcerária ou a sua falta não consegue desestimular no ex-presidiário a prática do crime e nem proporciona a assistência de que ele necessita. Na sua maioria, carecem de instrumentalização dos recursos humanos e de materiais necessários ao trabalho de reabilitação do preso para que desenvolvam não somente a sua capacidade laboral, mas também a sua auto-estima.

E isso soa tão bem ao entendimento anacrónico, que se inseriu nos projectos a mesma inversão de valor. Constroem-se mais presídios em vez de mais escolas, para diminuir a criminalidade, e quem não gostaria que se construíssem mais escolas? E como corolário do princípio de que semelhante atrai semelhante, quanto mais se aumenta a truculência mais aumenta a violência dos criminosos.

Propõe-se então a criação nos presídios de uma secção de educação física, desporto e cultura, com o objectivo de fomentar no detido, por meio do desporto e da cultura, o espírito participativo, a solidariedade entre indivíduos que partilham o mesmo espaço social, a cela, o pátio, o presídio em si. Tudo isto seguido das condições para que eles desenvolvam actividades criativas que possam avaliar e melhorar as suas potencialidades humanas.

É importante afirmar que o homem se humaniza por meio da socialização. O facto social são os modos de pensar, sentir e agir de um determinado grupo social. Assim, podemos dizer que é a cultura que humaniza o indivíduo porque o homem é também um ser cultural.


As expressões artísticas, portanto, tendem a essa aspiração criativa do indivíduo, que encontra na música, na literatura e nas artes oportunidade em gerar momentos de lazer, descontracção lúdica, ao mesmo tempo que constrói um saber que certamente será útil no futuro. Além disso, proporciona a remissão da pena, suavizando os momentos de tensão provenientes do claustro.

Assim sendo, é importante que as pessoas de direito, em parceria com outras instituições, possam executar políticas concretas de ampla visão dentro dos presídios, como construção de escolas, igrejas, centros de formação profissional, centros desportivos, entre outros, para a formação de uma personalidade (no presidiário) capaz de responder aos objectivos da sociedade após o cumprimento da pena.

*Activista cívico