Washington - Estava para escrever sobre um outro assunto esta semana, mas devo confessar que estou completamente decepcionado com a notícia da minha «amiga» da facebook que, afi nal, não existe na vida real. Alguns meses , na facebook, apareceu uma tal de Katya Rossana, que dizia viver em Londres e ser fi lha do falecido ministro angolano Pedro Van-Dúnen, «Loy» e de uma diplomata Filipina. A Katya, que dizia ter vinte seis anos, pareceu-me ser uma pessoa muito intensa - quase excêntrica. Houve vezes em que ela tinha discussões acaloradas com o dramaturgo José Mena Abrantes.


Fonte: Semanario Angolense

Foi um espectáculo interessantíssimo de ver. A Katya Rossana, a um certo momento, começou a publicar poemas – alguns deles altamente eróticos. Vários Angolanos não resistiram em elogiar a criação desta poetisa. Tínhamos, até, muitos amigos em comum. Houve uma vez em que um dos poemas dela pareceu-me ser um disparate e eu disse-lhe isso abertamente numa das nossas correspondências. Não me senti muito confortável em dizer-lhe aquilo porque ela estava a dar os seus primeiros passos literários e senti, talvez, que deveria encoraja-lá. Mas, do outro lado, havia os elogios vindos de Angola… A um certo momento suspeitei que os poemas eram plágios; havia algo – uma certa falta de autencidade – que não soava muito bem com a Katya Rossana. Havia, também, uma certa tendência para um certo exibicionismo que não é típico de meninas Angolanas – mesmo as que são tidas como muito ocidentalizadas.


A um certo momento, começou, então, o namoro, muito público entre a Katya Rossana e um parente meu, que muito admiro. Naquele momento, pensava que a Katya Rossana era real e estava muito feliz por vê-la a interagir com o meu parente. Tinha a certeza que iria ter uma cunhada altamente atraente e sofi sticada embora os seus poemas e intervenções na facebook dessem a entender que se tratava de alguém comalgumas perturbações emocionais. Cheguei, até, a entender a fonte da sua tristeza porque, em conversas que tivemos, ela falou-me do ambiente de tristeza em que cresceu, por ser «órfã» de um pai que «muito admirava» e de quem esteve «muito próximo». A Katya Rossana fazia-se passar por uma grande patriota Angolana, que insistia que os princípios do MPLA tinham sido traídos, etc. Houve algo que achei ser muito estranho: nos poemas que ela publicava na facebook, a declamar à sua paixão ao meu parente, era como se não conseguisse imaginar o futuro sem ele.


Claro que eles nunca tinha se encontrado (frente a frente) e tudo, até então, tinha sido virtual. Quando eu tentava falar da família do meu parente, dos acontecimentos da sua vida que lhe marcaram profundamente, da sua mãe, dos valores do Planalto Central, etc, a Katya Rossana não mostrava o mínimo interesse. Achei isto muito estranho porque tenho gente próxima a mim envolvidas com pessoas vindas de outras culturas; mas pessoas essas que gostam e apreciam saber das origens das nossas famílias.

Atribui a falta de interesse que a Katya Rossana tinha sobre a vida do meu parente à sua idade, visto que em 1992, ela só tinha seis anos. Em todo caso, ela me parecia ser uma «pessoa» muito exótica – fi lha de um nacionalista Angolano e uma diplomata Filipina. Ela parecia ser altamente fl uente em inglês, francês e português. Não tinha nenhuma dúvida que ela era uma jovem que tinha tido uma educação muito multicultural. O meu parente com quem iria se casar não teria problemas em lidar com ela, por ter ele ter vivido, também, em várias partes do mundo.


Senti-me um pouco incomodado pelo facto da Katya Rossana afi rmar que tinha sido formada na Universidade de Coimbra. Sempre associei a universidade de Coimbra a uma Oxford, Harvard ou Soborne, por isso esperava que ela fosse mais sofi sticada. Dava conta das suas limi tações nossas conversas. Conclui que, talvez, os licenciados da Universidade Coimbra de hoje tivessem limitações muito sérias.


Depois correu a notícia de que a mãe da Katya, a diplomata Filipina, tinha falecido. Senti muito e até mandei uma nota de condolência à Katya. Consegui, depois, ter uma conversa com ela, na qual notei que a morte da sua mãe tinha mesmo lhe afectado de uma forma negativa. Porém, esperava que o meu parente, uma excelentíssima pessoa, iria ajudar-lhe a superar as tantas vicissitudes da vida que ela conheceu. A Katya Rossana foi muito gentil e agradeceu- me com bastante sinceridade. A vida na facebook foi andado, os argumentos foram aumentado, e a nossa Katya Rossana não parava de intervir – sempre do lado da Oposição. Alguns de nós sentíamos tão bem, ao ponto de julgarmos que a fi lha de uma das grandes fi guras do MPLA estava, afi nal, connosco. Numa das nossas conversas na net, tentei perguntar à Katya Rossana algo mais sobre o seu falecido «pai» já que, como ela nunca parava de dizer, os dois tinham sido muito próximo.

Além de admitir que o seu «pai» tinha deixado uma enormíssima fortuna, a Katya Rossana não dizia nada mais. Conclui que ela não queria falar mais sobre o seu pai porque era um assunto muito sensível. Nas fotos da Katya Rossana, não havia nenhuma em que ela aparcesse ao lado da sua família, (Que tal do equivalente da famosa foto do Obama com o seu pai Queniano?) o que me levou a concluir que há muita gente na facebook que prefere manter a privacidade da sua família.


Soube, então, agora que a foto que a Katya Rossana usava não é dela. A foto que tanto nos encantou, aquela bela mista tão exótica, pertence à Pricilla Kabeya, produto de união de uma Alemã e um Congolês. Felizmente, o romance entre a Katya Rossana e o meu parente não foi longe, porque ele passou a saber sobre a falsidade da sua identidade. Devo confessar que, como narrador de histórias, sinto uma certa admiração por quem criou a Katya Rossana.

 

O criador desta personagem deveria ser romancista, dramaturgo ou, então, devia começar a escrever guiões cinematografi cos . Somos mesmo muitos que caímos no engodo da personagem da Katya Rossana. Ela desfazia certas noções estereotípicas que tínhamos de certas jovem; afi nal, cá estava uma jovem, lindíssima, mas que mostrava um imenso interesse na política nacional, na grande maka sobre o próprio futuro de Angola. E depois esta jovem apaixonou-se, tão publicamente, não com um milionário Norte-Americano mas com um mwangolê do Planalto Central relativamente humilde.


A sedução da literatura é que depois de nos deixarmos embalados pela narrativa passarmos a saber algo sobre nós. A Katya Rossana, personagem inventada na facebook por um Angolano que queria manipular os outros, fará com que muita gente que tinha sido enganada passe a refl etir sobre a sua credulidade. Haverá, por aí, um lado sinistro – no qual a Katya Rossana foi longe de mais para, eventualmente, poder haver possibilidades de chantagem? Com o tempo iremos saber porque, suspeito, este é, apenas o início da narrativa! ■