Luanda - "Senhor Ministro - Petróleos -, para quando a transparência total relativamente aos petróleos? Quando é que os angolanos vão saber verdadeiramente o que produzimos"? Questionou o líder da bancada parlamentar da UNITA Raúl Danda. Quanto a falta de luz e água afirmou: "A falta de água e de luz neste país tornou-se num verdadeiro escândalo. Não encontro outro termo para qualificar isso. Falta-nos luz porque há vento; falta-nos luz porque há muita poeira; falta luz porque há muita água; falta luz porque não há água;  falta água porque não há luz, falta água porque não choveu, falta água porque choveu a mais...Mas a verdade é que esses dois bens essenciais, básicos faltam, faltam e faltam. Confira a seguir a intervenção na íntegra:

 

Fonte: Club-k.net

INTERVENÇÃO  NA ESPECIALIDADE, SOBRE O OGE 2013 - 21.01.2013
(Encontro com os Ministros do Sector da Economia)

Ponto Prévio: Sr. Presidente da Sessão:

A discussão, na Especialidade, do OGE (como aliás de qualquer Lei) destina-se a ir até à minúcia, ao detalhe. Foi certamente com esse espírito que o Legislador terá estipulado que sejam dedicados 30 dias para a discussão do OGE, na Especialidade, e não produzir uma decisão ao cabo de 30 dias, claramente diferente. Basta olharmos para o Art. 237º do nosso Regimento para perceber isso. Ora, limitar o tempo de intervenção dos Senhores Deputados a 3 ou 5 minutos não me parece que seja a melhor forma de mantermos essa discussão, nos moldes estabelecidos pela Lei. Se não se pode dar mais de 5 minutos ao Deputado que queira intervir (já que muitos não o fazem, pelas mais variadas razões – todas elas pertinentes, acredito), o melhor seria alargarmos o tempo de discussão para que isto não seja apenas um exercício que se pareça com mais uma encenação do que outra coisa. É que, Sr. Presidente, ter 10 dúvidas sobre este documento e darem-nos a possibilidade, porque limitados pelo tempo de uso da palavra, a exprimir apenas duas, não me parece de todo muito coerente nem justo.


Senhor Presidente da Sessão;
Ilustres membros do Executivo;
Caros Representantes do Povo
:


Eu tenho algumas questões específicas a colocar aos Senhores Ministros aqui presentes, para as quais gostaria de obter respostas. Desde já, peço, com toda a humildade, que me perdoem qualquer demonstração de ignorância, caso essa eventualidade se verifique.


A. Senhor Ministro da Construção


1. Eu pretendo que me preste alguns esclarecimentos sobre, nomeadamente, o seguinte:
a) O seu Ministério tem inscrita uma verba de 1.5 mil milhões de kwanzas (cerca de 15 milhões de dólares) para, e eu cito “Estudos e Projectos de Estradas e Pontes”, sem que se saiba de que estudos, de que projectos, de que estradas e de que pontes se trata, concretamente (pág 200). Não acha a despesa demasiado vaga para uma verba nada módica? Que estudos são esses? Que projectos são esses? De que estradas e pontes se trata, exactamente? O mesmo esclarecimento se imporá, a meu ver, no que toca os cerca de outros 15 milhões de dólares para o que chama de “Programa Especial de Reabilitação de Pontes” (Pág 201). Quais? Onde estão? Se na página 203 foi possível precisar, porque não aqui? Se estivesse no lugar de fiscalizador, como nós estamos, como faria para fiscalizar a execução disso?


b) Fazendo recurso a uma linha de crédito, o seu Ministério tem, ainda no Programa de Investimentos Públicos, inscrita uma despesa de cerca de 3 mil milhões de Kwanzas (o equivalente a aproximadamente 30.3 milhões de dólares) para a “Construção de Infraestruturas do Lar do Patriota” (Pág 199). Com esse dinheiro e essa intervenção, o Lar do Patriota vai, finalmente deixar de ter aquele aspecto de aldeia de 4º mundo, para ter ruas asfaltadas que confiram um pouquinho mais de dignidade àquele local?


c) Os últimos itens das páginas 197 e 199 falam de despesas destinadas à realização de obras específicas que visam combater ravinas aqui e ali. Foi falta de tempo, distração ou achou desnecessário dar a mesma precisão relativamente ao item da página 197, onde apenas se indica “Combate às Ravinas”, sem especificar quais nem onde? E estamos a falar de cerca de 6.2 milhões de dólares.


d) O meu colega de Grupo Parlamentar colocou uma pergunta, durante a última sessão, relativamente ao item inscrito na parte final da página 198, cito, “Construção de Edifícios no âmbito do Protocolo de Lusaka”. Sabendo todos o que isso significa e porque o Senhor Ministro de Estado e Chefe da Casa Civil não conseguiu responder à pergunta, gostaria, já que se trata do seu pelouro, que nos desse uma explicação plausível: o que é que isso significa, concretamente? Estamos a falar de cerca de 5 milhões de dólares.


Alguém se interrogará se é mesmo necessária tal precisão. Pois claro que é. Achamos que, mais do que a autorização ao Executivo para arrecadar receitas e realizar despesas, nós os Deputados, enquanto delegados dos donos do dinheiro (o Povo) devemos saber da pertinência desta ou daquela despesa, e se se trata de facto de uma despesa tendente a satisfazer uma necessidade prioritária. Seria, talvez, uma forma de se evitar gastar dinheiro para elefantes brancos, e os casos no país não são desprezíveis.


2. Há uns anos, anunciava-se, com bastante pompa e circunstância, o ambicioso programa de construção de uma ponte sobre o Rio Zaire (ou Congo, se quisermos), que permitisse ir a Cabinda ou vir de lá, por estrada. Por outro lado, e quase em simultâneo, anunciava-se o projecto de construção de uma centralidade com cerca de 40 edifícios de 16 andares (se a memória não me estiver a falhar, fruto da velhice dessa promessa), tendo sido, inclusive, avançadas datas para a conclusão das obras. Senhor Ministro, diga-nos de forma clara e sem rodeios: esse programa vive ou já morreu há muito sem que haja coragem para se anunciar essa morte? Os eleitores têm o direito de saber.


B. Senhor Ministro do Urbanismo e Habitação:


1. Primeiro, gostaria de solicitar que fossem corrigidos os erros contidos na Página 206. Pode parecer insignificante mas, tratando-se de uma Lei, podemos e devemos evitar esse tipo de coisas. O ministério é descrito nalguns sítios com a abreviação “Minurb”, noutros “Minurh” (com “h” no fim), e ainda noutros com “Minuc”, alusão, se eu não estiver enganado, ao antigo Ministério do Urbanismo e Construção.


2. Um esclarecimento, Senhor Ministro: Na mente das nossas populações ficou como que uma polémica relativamente às já célebres casas da cidade do Kilamba, desde que S. Exa. o Senhor Presidente da República visitou aquela cidade e achou as casas muito caras e parece ter sugerido um preço menos especulativo para as mesmas. Pouco depois, era o ministro que dizia “não; o preço das casas está mesmo bom”. Qual é a verdade sobre isso, já que o preço das casas na realidade não se mexeu nem para a esquerda, nem para a direita? Por outro lado, informações que nos chegam dão conta do facto de que haverá funcionários ligados à imobiliária que está a comercializar essas casas a cobrar montantes que variam entre os 15.000 e os 17.000 dólares a fim de facilitarem a inscrição dos angolanos ávidos de possuir uma residência. Devia verificar isso, Senhor Ministro. E caso precise, eu estou na disposição de lhe fornecer nomes, em “off the record”, que possam ajuda-lo a fazer essa verificação.

C. Senhor Ministro da Energia e Águas:

1. O Senhor está no sector que se constitui no verdadeiro calcanhar de Aquiles do Executivo. A falta de água e de luz neste país tornou-se num verdadeiro escândalo. Não encontro outro termo para qualificar isso. Falta-nos luz porque há vento; falta-nos luz porque há muita poeira; falta luz porque há muita água; falta luz porque não há água; falta água porque não há luz, falta água porque não choveu, falta água porque choveu a mais... Mas a verdade é que esses dois bens essenciais, básicos faltam, faltam e faltam. Num país bafejado pela sorte, no tocante aos recursos hídricos; um país que faz fronteira com uma Namíbia onde as coisas são totalmente diferentes: Se saímos de Santa Clara para a Namíbia, bastará andarmos só um pouco para fazermos uma dolorosa constatação: olhamos para trás e vemos o nosso concidadão a tirar água da cacimba, tomar banho de uma bacia, bem à moda medieval, e a preparar-se para dormir às escuras; enquanto do lado namibiano da fronteira o cidadão tem a torneira em casa, o chuveiro e preparar a refeição num fogão eléctrico sem riscos de morrer à fome: em resumo, tem água e tem luz. O que é que nos falta, Senhor Ministro? E o que falta vai poder ser solucionado com este Orçamento? Não estou aqui a pretender dizer que é sua a culpa. Longe de mim! Mas as barreiras impostas à fiscalização e o incumprimento e banalização da Lei impediram que os Deputados tivessem, até hoje, os esclarecimentos que se impõem, apesar dos pedidos feitos há meses para que o Senhor Ministro viesse a este Parlamento; apesar dos pedidos de explicação feitos junto das direcções das empresas que têm o dever de fornecer esses bens, nomeadamente aqui em Luanda. Senhor Ministro, diga-nos alguma coisa, por favor, porque, como se diz na linguagem popular “é demás”.
D. Senhor Ministro dos Transportes:

1. Enquanto os seus colegas não nos constroem a ponte sobre o Rio Zaire, ir ao Enclave de Cabinda ou vir dele só é possível de avião. Tem certamente noção dos fracos salários que os angolanos ainda auferem. Terá igualmente noção do facto de que, sendo recurso único e único recurso, o preço do bilhete de passagem de avião Cabinda-Luanda ou Luanda-Cabinda é simplesmente proibitivo. A TAAG cobra, em classe económica, mais de 150 dólares só para uma ida. Ir e vir custará pouco mais de 300 dólares, o que chega a ser mais caro do que fazer Lisboa-Londres-Lisboa, na mesma classe. Onde se pode ir de carro, a gente dispensa o Boeing da TAAG, mas... e Cabinda? E ainda por cima, quando chegamos à época festiva – como ocorreu agora no Natal e no Ano Novo – esses preços sobem de forma vertiginosa, com a candonga vergonhosa a que assistimos naquele aeroporto doméstico. Senhor Ministro, não há como reverter essa situação?


2. Outro caso: mesmo nos bilhetes que não tenham as chamadas “datas fixas”, nos voos domésticos, mudar a data da viagem, quer em classe económica, quer em executiva, faz-nos pagar o que se nos diz ser uma “taxa de remarcação” de cerca de 4 mil Kwanzas. E quando nos encontramos perante uma situação de “no show”, esse montante sobe para 8 mil Kwanzas.


3. Entretanto, a TAAG não assume as suas responsabilidades. Os passageiros que perdem um voo de ligação porque o avião da TAAG, até em voo internacional, teve um atraso de muitas horas, são abandonados à sua sorte, mesmo quando transportados num dos mini-autocarros da companhia do terminal internacional para o nacional, ou pagam o parque para que as malas sejam postas no terminal doméstico, ou eles são largados cá fora com a recomendação: “desenrasquem-se”. Postos dentro do aeroporto doméstico, são obrigados, adultos e crianças, a dormir por cima dos bancos duros e gelados, ou no chão igualmente duro e gelado. Isso é simplesmente desumano e uma vil de tratar quem paga, e caro, um bilhete para viajar e não viajou por culpa única da TAAG. Senhor Ministro, veja o que se passa na TAAG. Eu posso ajuda-lo com elementos de prova. Faça visitas não anunciadas, mande para lá outros olhos que não os seus e verá. Correcções impõem-se.


4. Sobre o Porto do Caio tenho fé que desta vez sai, pois acho que ficaria muito feio o Senhor Presidente da República ter ido lançar a primeira pedra de uma obra que não tivesse pés para andar. Acredito, portanto, que não se repetirá a situação dos outros que para lá foram, em tempos idos, lançar as outras “primeiras pedras”. No entanto, Vossa Excelência acha que se deve gastar mais 8 milhões e meio de dólares para a “construção da ponte cais do Porto de Cabinda”? Que ponte cais, Senhor Ministro? Aquela que vive num “ergue-cai”, num “amontoa e tira” de areais? Será mesmo útil essa despesa? Seja como for, eu confio na sua eficácia, eficiência e perspicácia para bem aquilatar o que se deve ou não fazer.

5. A presença da UNICARGAS em Cabinda está a criar problemas em vez de resolvê-los. Os empresários ligados à camionagem, que já se queixavam de falta de carga, dizem que, com a chegada da UNICARGAS, as suas vidas ficaram ainda mais dificultadas: ficaram com oportunidades ainda mais reduzidas de ter carga para transportar; a UNICARGAS, com ou sem carga, quase que duplicou os salários pagos aos motoristas dos camiões privados. Esses empresários fizeram uma reclamação junto dos Deputados do Círculo Provincial de Cabinda, depois de terem endereçado uma petição a Vossa Excelência. Terá dado alguma resposta? E perante esta situação, estaremos a resolver problemas, ou a criá-los?
6. E já agora, Senhor Ministro, no quadro dos esclarecimentos, é possível que saibamos em que pé está o projecto de construção do novo Aeroporto de Luanda – Bom Jesus? É que, com a falta de relatórios de execução orçamental e a “lock-out” total sobre o andamento desse importante projecto, andamos todos à escuras.


E. Senhora Ministra da Indústria:


1. O seu ministério está a pedir a verba de mil e seiscentos milhões de kwanzas (cerca de 17 milhões de dólares) para a “Construção do Pólo de Desenvolvimento Industrial do Fútila” (Pág 188). Primeiro, faz-me muita confusão, mas muita confusão mesmo, que se deturpem os nomes das localidades do nosso país, por desconhecimento da geografia ou por outras razões. A preocupação é ainda maior quando se dá conta de que estamos errados e persistimos nele. Recordo-me que, como nos últimos anos vem sempre uma verba para construir esse “Polo Industrial”, já nos referimos a isso várias vezes. A verdade é que, mesmo depois de o anterior Ministro da Indústria, Eng. Joaquim David, nos ter dado razão sobre o facto, o Malembo continua incompreensivelmente a ser chamado Fútila. Não admira que, dentro de algum tempo, o Dinge vira Camabatela, ou Camacupa se torne Sanza Pombo, até que chegue o dia em que seja difícil dizermos onde nascemos, onde estamos, etc. Segundo, eu ainda ontem passei por esse “Polo Industrial do Fútila” e constato que, a exemplo dos anteriores, aquilo não passa de um capim – esse sim, industrial – num terreno que se limpa e se espera que o capim volte a crescer, para voltar a limpar e o capim crescer, numa verdadeira dança fantasmagórica. Ao lado existem aquelas turbinas que têm dificuldade em gerar electricidade, já logo a seguir à sua inauguração pelo Senhor Presidente da República – acho que ainda há responsáveis determinados a enganar o Senhor Presidente... Mas mais nada, além, claro, do capim de que falei. Senhora Ministra, pode, por obséquio, dizer-nos o que vai ser concretamente feito naquele local, pelo menos desta vez?


F. Senhor Ministro do Planeamento e do Desenvolvimento Territorial:


1. Quando olho para o seu Programa de Investimentos Públicos (Pág 165/166), noto que 70% das despesas inscritas são, na maioria construção de escolas (cerca de 57%) e obras ligadas à Saúde. Não cria propositadamente uma grande confusão termos o Ministério da Educação, o Ministério da Construção, o Ministério do Planeamento, etc., etc., a construírem escolas com “X” e “Y” salas de aulas, e esta ou aquela residência para professores? Porque razão não faz isso apenas a Educação, ou apenas a Construção? Às tantas, já ninguém sabe ao certo quantas escolas se pretende construir e quem as vai construir. É uma preocupação.


G. Senhor Ministro dos Petróleos:


1. O sector petrolífero continua a ter muitas desigualdades de tratamento dos trabalhadores do ramo, consoante sejam nacionais ou expatriados. As reclamações não param. Sobre esse assunto, e dirigindo-se ao Senhor Ministro da Administração Pública, Emprego e Segurança Social, já se pronunciou, e muito bem, uma minha colega Deputada. Quais os porquês desses desníveis? Poderá dizer-me que é por causa dos subsídios de, de e de que os expatriados têm. A verdade é que, os angolanos que se encontram na situação de expatriados noutros países não têm essas condições principescas. Porquê? Nas empresas petrolíferas, até o bónus dado aos trabalhadores com a descoberta de mais este ou aquele campo, é absurdamente desigual. Porquê? Presos aos recursos petrolíferos, tal a dependência, o Executivo parece importar-se pouco com as reclamações dos trabalhadores angolanos, relativamente às desigualdades salariais, de tratamento, sendo pressionados, inclusive, quando tentam acionar o mecanismo legal da greve para fazer valer as suas reivindicações. Está certo isso?


2. Senhor Ministro, para quando a transparência total relativamente aos petróleos? Quando é que os angolanos vão saber verdadeiramente o que produzimos, o que ganhamos, o que pagamos como bónus, etc., etc., sobre o nosso petróleo? Para quando, e em nome dessa transparência, a eliminação, nos contratos petrolíferos, do chamado “princípio de confidencialidade”, conforme recomenda, aliás, a organização Transparency International, no quadro do princípio “publish what you pay” (publique o que paga)? Talvez o Senhor Ministro de Estado e Chefe da Casa Civil, nos ajude a esclarecer estas questões.....


Muito obrigado, Senhor Presidente da Sessão. E obrigado aos ilustres membros do Executivo e aos colegas Deputados por terem tido a paciência e a amabilidade de me ouvir.


Raúl Danda