Luanda - O antigo primeiro-ministro e secretário-geral do MPLA, partido no poder em Angola, considerou em Luanda que o regime angolano “não é uma ditadura, mas tem efeitos praticamente semelhantes”.

Fonte: Lusa

“Há um grande desfasamento entre a proclamação de um Estado democrático e aquilo que se vive hoje, que provavelmente não é uma ditadura, daquelas que se viveu, por exemplo, no Zaire de Mobutu, ou no Uganda de Idi Amin, mas muitos efeitos são praticamente semelhantes”, disse Marcolino Moco.


“Embora ainda ligado ao MPLA, sei despir-me deste casaco. Angola vive uma hora grave”, acentuou Marcolino Moco.


Moco, que interveio no primeiro dia de trabalhos do congresso extraordinário da terceira maior força política angolana, a coligação CASA-CE, liderada por Abel Chivukuvuku, antigo dirigente da UNITA, foi convidado pela organização a apresentar uma comunicação sobre “O Estado, a Democracia e a Cidadania em Angola”.


Sobre o exercício da cidadania em Angola, Marcolino Moco referiu-se à frustrada manifestação do passado sábado, impedida de se realizar pela polícia, que alegou falta de autorização legal.


A manifestação de sábado, que resultou na detenção durante algumas horas de 18 pessoas, visava exigir às autoridades informações sobre o paradeiro de dois jovens desaparecidos há cerca de um ano em Luanda, quando tentavam organizar uma manifestação antigovernamental.

 

“Impedir as pessoas de se pronunciar sobre o seu próprio país, impedir as pessoas de realizarem actos previstos na própria Constituição, no desenvolvimento de uma situação grave, de dois jovens desaparecidos, mas quando alguém fala nisso, vai para a cadeia também ou apanha porrada” foram situações que criticou.


Marcolino Moco classificou, por outro lado, como “imoral” e “escandaloso” que as riquezas de Angola não sejam distribuídas com equidade.


“Temos a situação gravíssima, que é a da espoliação das riquezas do país por parte de uma família. É difícil falar-se nisso, porque há um certo medo, mas é uma situação escandalosa, que eu na minha idade não posso esconder”, afirmou.


O ex-secretário geral do MPLA, que foi também o primeiro secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) denunciou ainda como “antiético” e “inaceitável” que José Eduardo dos Santos tenha feito da sua filha Isabel, “a mais rica de África”.


“Esse país vive debaixo de um golpe – se calhar não vou chamar de estado, porque senão dizem que estou a exagerar. Há aqui um golpe qualquer, em que as grandes questões não são debatidas”, lamentou.


Outro convidado pela CASA-CE para intervir na abertura dos trabalhos, foi o independente Carlos Rosado de Carvalho, economista e jornalista, que apresentou o que considera serem as diferentes características da economia angolana, antes da independência, em 1975, até à actualidade.


Carlos Rosado também comentou a recente designação de Isabel do Santos, filha mais velha do Presidente angolano, como a mulher mais rica de África na lista elaborada pela Forbes com as maiores fortunas.


“Não é significativo, nem representa efectivamente a nova Angola. De facto, não tem nada a ver com Angola, ou pelo menos não tem nada a ver com 99,9 por cento dos cidadãos angolanos, que vivem uma vida muito difícil”, comentou.


“Tenho dificuldade em falar de coisas que não sei. Não é comum no mundo, se é que acumulou essa riqueza toda, não é comum uma pessoa acumular tanta riqueza num espaço de tempo tão curto”, vincou.