A teimosia que suporta essa interdição só pode ser achada nos percursos históricos que foram corporizando o tecido sociopolítico de cada país a seguir à independência. Diga-se, em boa verdade, que um dos pesadelos de que os Estados africanos devem se refazer é continuarem reféns e a ressonarem a racionalidade política, cultural e económica do ocidente. O período que se seguiu à independência, obviamente, não foi tão pacífico. Se a luta pela autodeterminação dos povos uniu quebrando as fronteiras linguísticas, geográficas e culturais diferentes comunidades em cada Estado, hoje, é notória a fragmentação de muitos Estados. Os conflitos internos dividiram os povos. O uso da força, as perseguições e a intimidação trouxeram de volta o “xé minino no fala pulitica”. O povo ainda tem medo da política.

Às vezes, primeira face da questão, é fácil apontar o dedo aos impérios que continuam a destruir os recursos naturais dos povos africanos que em troca morrem à fome ou canhões para justificar essa triste realidade, conflitos intraestaduais. Essa acusação pode encontrar a melhor interpretação no facto de a cobra ao entrar para o buraco encurvar a cabeça para onde saiu. Se, por um lado, teme a perseguição (políticas migratórias férreas) por outro, anseia o regresso porque no buraco as paredes estão a cair, não tarda (velho continente). Prova disso é que muitas leis que se foram construindo no pós-independência eram movediças, ou seja, encontravam muletas, entenda-se fundamentos ou doutrina na galeria do colonizador. O mesmo é dizer que só o porco fugiu, mas o javali tinha ficado. A segunda face da questão deve-se ao facto de não ter havido a ponderação necessária para uma reelaboração de uma nova racionalidade politica que tornasse possível o diálogo ou a coabitação do estadual com os sistemas africanos. Infelizmente, olhou-se mais para o poder do que propriamente para os fundamentos sócio-culturais e económicos desse poder. Em resultado, os povos não se identificam ou não se revêem no modelo que a sua razão histórico-cultural não criou. Produzem-se milhares de normas que não cumprem com a sua função conformadora das sociedades. A ética e a moral não fazem morada nas ruas, lugares de trabalho, etc. Contra essa realidade os Estados ergueram um sistema de regulação social, composição de interesses e gestão da coisa pública, infelizmente, de força e repressão. Deixou-se de ler o tecido social, cultural e económico para melhor compreender o homem. Assim, os Estados distanciaram-se da realidade sócio-cultural dos seus povos. Se, antigamente, é na política que o homem se reencontrou consigo próprio e com o seu semelhante, injustamente, ao longo dos últimos tempos, a política mais do que concorrer para o Bem-Comum, a Segurança e a Justiça criou a máquina da guerra que semeia a cada dia dor e luto em muitas partes do nosso continente.

As nossas terras são minadas; os rios envenenados. O batuque foi substituído pelo ribombar dos canhões; as queimadas pela chama das bombas. Milhares de crianças, homens e mulheres são perseguidos, torturados e mortos. A fome atinge proporções alarmantes. A ausência de instrumentos reguladores de choques culturais deu lugar ao snobismo político - cultural. A lógica de desenvolvimento económico e social destrói a cada instante a natureza. A fúria da natureza é, hoje, uma luta incontornável. Na verdade, a política virou um jogo que tendo colocado em diferentes blocos ideológicos divide, ainda, mais a humanidade. Entretanto, multiplicaram-se vários sistemas políticos e, por conseguinte, um sem número de partidos políticos que cercam por todos os lados, com a máfia da hipnotização, os pobres. Os sindicatos vão a pouco e pouco ressonando os interesses das classes dominantes. O bifacialismo de muitos líderes religiosos enterrou as verdades em púlpitos. Morreu a voz da libertação. O que se diz no altar ou púlpito cala-se em público. Afinal, ninguém gostaria de ser apontado como empecilho. O xé minino no fala pulítica persegue-nos porque não se sabe ao serviço de quem o padre, o pastor ou evangelista, o professor, o pescador, o agricultor, o vizinho estão.

Se durante a colonização a política fez reféns milhares de povos em suas próprias terras enquanto outras foram negritando e borrifando de sangue e ódio campos e mares as guerras entre irmãos da mesma terra, fratricidas, dividiram famílias e moveram perseguições étnicas, torturas e mortes. Ser deste ou daquele partido gera ainda conflitos. É a intolerância politica que ganha lugar e faz desaparecer pessoas. O povo ainda tem medo de política. Mesmo em sistemas democráticos os povos africanos votam não, exactamente, como um direito, mas como uma obrigação dos políticos que procuram fundamentar no sufrágio a sua legitimidade. Xé minino no fala pulitica porque as perseguições, prisões arbitrárias e as armas ainda fazem correr sangue entre nós. Como matar o “xé minino no fala pulitica”?

Será necessário reelaborar uma nova racionalidade política e uma nova ordem económica e cultural para que a justiça económica não tenha classes colocando as minorias ricas sem justa causa (mão à coisa pública = feudocracia) contra as maiorias pobres que desde o tempo colonial vivem em casas de pau-a-pique, sem acesso a água potável, luz nem assistência sanitária básica? Repensar a imbricação desenvolvimento/cultura? Deixar de fazer da política um comércio subterrâneo de um círculo reduzido de feudocratas? Eis as ???

Fonte: Club-k.net