Luanda  -  O "MPLA C$PITAL" veio uma vez mais mostrar não estar preparado para a mudança, não estar pronto para abraçar a democracia real em que os outros são respeitados e as suas ideias tidas em conta.

Fonte: Club-k.net

No dia 27 de Maio de 2013, emitiu um comunicado, onde ao invés de baixar a humildade e a um verdadeiro espírito   de reconciliação nacional e humanismo, preferiu abraçar o machado de guerra do passado e arremessar a sua arrogância e complexo de superioridade a milhares e milhares de cidadãos, marcados pelas marcas de assassinatos selectivos e prisões sem culpa formada e julgamentos, ao condenar o que considerou “o aproveitamento político do que se passou a 27 de Maio de 1977 por parte de cidadãos que, não tendo estado directamente envolvidos nas acções à volta desses acontecimentos e das suas consequências, distorcem a verdadeira razão dos factos”.


Eis um dos trechos do comunicado divulgado pelo bureau político do partido dos camaradas, que é um insulto a todos que sofreram nas masmorras ou morreram fuzilados em 1977 e, recordo-me, como hoje, ter sido preso, por Carlos Jorge "Cajó", que foi meu "canoa" na prisão de São Nicolau, igualmente, ao meu pai e dois tios, que foram cobarde e traiçoeiramente enterrados vivos…


Hoje, enquanto estamos preocupados com o futuro, pois o passado não volta, mas seria importante o pragmatismo, para que o recalcamento não caminhe incubado no coração dos discriminados e humilhados.


Mas, ainda assim, o "MPLA C$PITAL", estranhamente, em 2013, século XXI, acredita que os horrores cometidos, autênticos crimes contra a humanidade, se explicam muito bem por um elevado grau de imaturidade de alguns dos seus militantes e “a incipiente organização e funcionamento das instituições e excessos de zelo dos seus principais agentes”, que, com a rédea solta que lhe foi dada durante pouco menos de dois anos posta à disposição pelo presidente Neto, a quem hoje, aqui e agora, tal como no meu livro, considero não ter sido um médico profundamente humano, segundo versão partidária, mas sim um "médico profundamente assassino" e que por isso, a sua ordem irresponsável de: "não vamos perder tempo com julgamentos", contribuiu para os transbordamentos que provocaram 80 mil assassinatos e a prisão ilegal de mais de 190 mil cidadãos e militantes do "MPLA de esquerda".


Quando, hoje, o "MPLA C$PITAL" se fica por um simplório reconhecimento de que os acontecimentos à volta do 27 de Maio de 1977, marcaram, de forma bastante negativa, uma época da nossa história e apela a que toda a acção futura deve procurar sempre evitar que comportamentos e atitudes deste tipo não se possam repetir, está a falsear a verdade dos factos, pela sua gravidade.


Este "MPLA C$PITAL" em claro desrespeito a memória das vítimas, quando diz reconhecer que o ideal seria caminhar sem hesitar para “um processo de reconciliação e unidade nacionais, cada vez mais profundo e genuíno”, apenas faz alusão ao seu cinismo. Isso por ser consabido, nunca ter feito nada para ouvir os "chamados vencidos", para que estes possam esbater recalcamentos e ódios.


O "MPLA C$PITAL" frisa que a prática democrática deve, deste modo, constituir o caminho ideal, uma vez que nos últimos dez anos nos têm sido dados com a finalização do conflito militar e com as manifestações de perdão, de tolerância e de reconciliação, são provas evidentes desta nova realidade.

Ora, aqui está a filosofia do capitalismo ideológico selvagem dos camaradas, que não cumprem nada do que textualizam e aprovam, salvo o capital corruptor e corrupto, que passou a nova ideologia e a continuidade de todo tipo de ilegalidades, como prisões arbitrárias, julgamentos encomendados e assassinatos contra opositores.


E, depois de afirmar que a reconciliação foi a razão principal por que o MPLA se bateu firmemente pelo alcance da paz, quando todos os anos milhares de angolanos pereciam injustamente, acrescenta, terminando assim, ipsis verbis:


«Em relação a todos quantos, de algum modo, estiveram envolvidos nos acontecimentos em torno do 27 de Maio de 1977 e aos demais cidadãos que, de qualquer forma, estiveram associados à guerra fratricida que o País viveu, o MPLA recomenda que as instituições do Estado, com o apoio da sociedade, devam continuar a trabalhar para que as consequências produzidas por estes acontecimentos não criem entraves ou dificuldades de qualquer natureza, ao exercício pleno dos direitos constitucionais e legais, por qualquer cidadão (2013».


Parece ser o fim mas não é, pois para fechar com chave de ouro o BP do "MPLA C$PITAL" sacode toda a água (de lágrimas) acumulada no capote, assim: “Ao virarmos mais esta página da nossa história (não se fala mais nisso, né?) devemos assumir o compromisso, perante o povo angolano e o mundo, de tudo fazermos para que Angola seja a Pátria da liberdade, da tolerância, da democracia e da justiça” (sic).


Quando o "MPLA C$PITAL" diz que houve excessos e nada mais adianta, está a reconhecer os assassinatos e prisões arbitrárias, sem culpa formada, como algo normal e os excessos de assassinatos, como lógica natural que não assaca a ninguém responsabilidade pela barbárie contra dezenas de milhares de militantes e intelectuais autóctones, pela liderança de Agostinho Neto.


Ingenuamente, ainda acreditei que 36 anos depois, o "MPLA C$PITAL", pelo qual me bati em nome de uma Angola mais justa, viesse dizer o seguinte:


a) que a Comissão de Inquérito, liderada por José Eduardo dos Santos, não cumpriu o seu papel, contribuindo com a omissão para a monstruosa chacina; 


b) que os intelectuais da Comissão de Lágrimas, foram autores morais dos maiores assassinatos selectivos em Angola e África, depois da II Guerra Mundial;


c) que elementos, como Agostinho Neto, Henrique Teles Carreira, Henrique Santos Onanbwe, Ludy Kissassunda, Carlos Jorge "Cajó", Miguel de Carvalho Wadjimbi, Artur Pestana Pepetela, Cristiano André, EduardoVeloso, Tino Kabuatu, João Beirão, Jetueira, José Maria, Mainga, Kafuma, entre outros, deveriam ser responsabilizados civil e criminalmente, pela sua participação nos assassinatos;


d) que estava aberto a criação de uma Comissão da Verdade e Reconciliação sobre o 27 de Maio de 1977;


e) que iria solicitar e tudo fazer, para que o Ministério da Justiça, através dos seus órgãos emitisse boletins de óbito dos falecidos;


f) que iria autorizar a realização de um lomba colectivo e a realização de individuais por parte dos familiares das vítimas;


g) apoiar, a discussão, elaboração e aprovação de uma lei de Amnistia;


j) pedido de desculpas aos familiares das vítimas e a todos angolanos em geral    
Infelizmente nada disso foi feito, mais grave, a pessoa ou as pessoas que redigiram este comunicado, foram com certeza dar uma vista de olhos nos arquivos e recuaram até ao ano de 2002, onze anos já passados, à data em que o "MPLA  C$PITAL" também reagiu aos clamores das vítimas do 27 de Maio e, pela primeira vez em 25 anos se dignou reconhecer a veracidade e monstruosidade do sangue derramado no seio do próprio partido e do país.


De notar que, nós não reproduzimos, muito longe disso, o comunicado do BP, mas o que podemos assegurar é que mesmo tendo indicado alguns parágrafos mal amanhados, a servir de introdução com floretes embotados a uma verdadeira abordagem do horror, tudo o que se pode tirar do texto de 2002 é por assim dizer igualzinho ao que foi escrito em 2013, quer dizer, em onze anos o MPLA não saiu da cepa torta, mas saiu-se com um comunicado para adormecer bois. 
Como é possível os angolanos continuarem a acreditar em  indivíduos tão intolerantes, arrogantes e com falta de espírito de reconciliação nacional, pese estarem no poder a tanto tempo e controlando toda a máquina e instituições do poder do Estado, onde nem sequer conseguem promover o contraditório e dar voz aos diferentes?!…