Benguela - Tinha 17 anos de idade, a despontar com imensas dificuldades de uma infância cinzenta… ex-estudante do Liceu Paulo Dias de Novais.

Fonte: Club-k.net

‘A história’

O recuo de Benguela, por parte das FAPLA foi desastroso e doloroso, quase que não acreditamos que as “gloriosas FAPLA” recuaram de Benguela e Lobito.

Dias antes, as notícias das frentes de combate eram um tanto contraditórias e desconcertantes, as FAPLA estavam recuando “de tudo que era frente de combate” pressionados pelas forças militares da UNITA, fortemente coadjuvadas por unidades do exército regular Sul-africano, “os carcamanos”.

Participei pessoalmente de todas as frentes de combate na província de Benguela, na frente de Bocoio-Balombo, Cubal-Ganda e Chongoroi-Quilengues…

esta última foi a mais contundente e que mais vidas ceifou, de jovens angolanos na flor da idade, quase-crianças (em alguns casos, literalmente crianças!), os Sul-africanos militarmente experiente com a sua coluna mecânica ‘rasgava’ as unidades de defesa das FAPLA, qual escaldante faca sobre a manteiga… asfixiando Benguela e Lobito, provenientes dos eixos acima mencionado. O Sul de Angola, estava todo tomado pelo inimigo, a última cidade a cair foi Lubango.

 

Aos 5 de Novembro de 1975, eu e o meu companheiro Cláudio (Dilangue) fomos a Luanda, em missão de serviço, e foi de lá que ouvimos com o coração apertado que Benguela ‘caiu’, solicitamos imediatamente que fossemos integrados na frente de combate, para contribuirmos para a retoma da província. Lembro-me que meu pai, horrorizado pediu-me quase de joelhos que “me deixasse estar em casa”… Tenho que combater pelo meu país, retruquei, quase irado, por o meu progenitor não entender a ‘questão’.

 

Aos 7 de Novembro, chegamos enfim a cidade de Novo-Redondo (Sumbe) e iniciamos a procura dos companheiros da unidade, amigos e conhecidos, fomos integrados na unidade sob o comando do Diabo-negro, no dia seguinte (a nosso expresso pedido, estavamos ansiosos de entrar em acção) fomos integrados na frente de combate, na ‘casa branca’ onde estava traçado a fronteira entre "nós e o in imigo" , porem voluntariamente de acordo opinião do comandante Cassanje e Monty, abandonamos a localidade, por não ser viável a defesa da mesma, ‘recuamos’ alguns quilómetros em direcção a cidade de Novo-Redondo (NR).

 

o meu companheiro Cláudio foi ‘pescado’ pelo comandante Rosas que o ‘introduziu’ na técnica de manuseamento de material explosivo, eu pela minha apetência a artilharia, foi-me ‘designado’ um “simpático” canhão 75, colocado no cume de uma estratégica colina, onde estava instalado o comando… realço um pormenor interessante, Rosas e Dilangue, foram os autores da 'sabotagem' da ponte da Canjala e mais tarde da ponte do Porto Amboim, acções efectuadas para dificultar o avanço do inimigo.

 

Não fiquei parado, estava constantemente a descer a colina e encorajar os meus companheiros, uma linha de cerca de trinta manuseadores de RPG-7 estavam dispostos no fim do declive, protegidos por quase uma centena de ‘infantários’, lembro-me que estava sempre a passar a seguinte mensagem; “Camaradas, amanhã, vamos matabichar no Lobito e almoçar em Benguela!”…

 

Fazíamos “ingenuamente” um barulho infernal, tal barulho foi facilmente detectado a léguas pelos experientes exploradores do inimigo, que espiaram-nos ‘á-vontade’ mapeando a disposição da nossa defesa…

 

A 00h00 foi com incontida emoção que o escutamos o anúncio da independência (anuncio quase trinta ou mais minutos depois das zero horas, o que nos preocupou) e o proclamar da designação da nova Angola: “Republica Popular de Angola”… estupidamente fizemos alguns disparos para o ar, trocamos candando… para a maioria de nós que se encontrava naquela ‘emboscada’ não sobreviveram no dia seguinte.

11 de Novembro 1975

Do topo da colina, um ‘piô’ veio-nos dizer que para lá da curva oculta por duas outras colinas em direcção a casa-branca, ouvia-se o ‘barulho’ de motores de várias viaturas, indigitado pelo comandante desci a coluna para averiguar in-loco tal detalhe, cheguei até a última linha de defesa, e escutei nitidamente o ‘roncar’ de vários camiões, não tive dúvidas, era a esperada ofensiva Sul-africana, apressadamente galguei no sentido inverso a colina, e dei conta da minha constatação ao comandante…

 

Porem, o inimigo estava com muita competência, a contornar-nos (cercar-nos) sem nos apercebermos, não tínhamos nenhum conhecimento de tactica militar, os Cubanos naquela altura eram exíguos e na sua maioria estavam coadjuvando o “alto-comando”… Carreguei imediatamente o meu canhão, solicitei que os outros (só dispúnhamos de três canhões e meia dúzia de morteiros de 60mm) também o fizessem.

 

Momentos depois surgiu nítido do outro lado, um veiculo amarelo, e começou a discussão no comando, lembrei-me nítido da lição “são galgos…são perdigueiros” e sobretudo das consequência de tal discussão.

 

Alguns camaradas diziam que era um tractor, eu berrava que se tratava de um tanque sul-africano e que devíamos fazer fogo imediatamente…

“é tractor do povo…é blindado dos carcamanos!”… a discussão só terminou, quando os sul-africanos, começaram com o bomnardeio matematicamente metódico… a celébre cruz de obuses…

Foi um autêntico massacre…

Escapei por uma unha negra, só tive tempo de tirar a culatra do canhão e mergulhar de seguida no ‘matagal’…