Benguela - A manifestação do dia 23 de Novembro de 2013, foi uma manifestação pela cidadania, pelo exercício do direito cívico e sobretudo, pelo direito a VIDA, uma manifestação contra a morte, contra o TERROR, contra o medo, contra a intimidação colectiva e desagregação do tecido social angolano.

Fonte: Club-k.net

Não se pode compreender que quase doze anos após o calar das armas, cidadãos angolanos continuam reféns das mesmas situações que caracterizaram o período de guerra, a grossa maioria dos cidadãos estão e vivem cabisbaixos, (não falam em voz alta) murmuram, estão constantemente a olhar a sua volta, temem dizer o que pensam quer ‘cara-a-cara’ quer ao telefone, desconfiam de tudo e de todos; dos vizinhos, dos amigos, dos colegas de serviço, enfim...

Não se pode compreender que nos quase doze anos de paz, centenas de angolanos continuam a morrer, só por DISCORDAREM de “qualquer coisa” na acção dos guardiões do ‘templo’. A UNITA clamou, varias vezes, que dezenas de seus militantes foram, barbara e friamente assassinados, pelo simples facto de serem militantes daquele partido politico. Rafael Marques denunciou na sua magnifica obra; diamantes de sangue (mesmo em tempo de paz), que a morte e a mortandade continua a sua obra indiscriminadamente mortífera e “guerreira” no leste do País... naquelas paragens, a “luta continua”. No Cafunfo, houve a grande manifestação das mulheres, pela vida, porque as mulheres manifestaram-se?...

 

A manifestação no Cafunfo teve a mesmíssima represália que a manifestação do dia 23, cujos guardiões do templo, justificaram a sua acção, afirmando que possuíam documentos a ‘testemunhar’ que uma onda de subversão estaria subversiva e clandestinamente em curso... tal, provavelmente aconteceu também no Cafunfo, certamente as mulheres de todas as cores partidárias que se manifestaram pela vida, tinham também intenção de “mudança do regime”, por isso, ao manifestarem-se contra a violência no género, foram por sua vez violentadas (desta feita oficial e abertamente) pelos guardiões do templo...

 

A manifestação dia 23 tinha fins pacíficos, mas os guardiões do templo assim não entenderam... e fizeram o que sempre fizeram, provocaram mais morte, mais sofrimento, mais dor... mais raiva...

 

O jovem Ganga, foi hoje a enterrar...a sua vida lhe foi tirada, quando questionava e protestava por tirarem prematuramente a vida á dois co-cidadãos... Os guardiões do templo de todas as matizes, culpam a UNITA, pois se esta tivesse adiada a manifestação, conforme “conselho” dos guardiões, provavelmente o jovem Ganga, estaria vivo...

Posso até, com muita relutância concordar com este raciocínio, sublinho a minha relutância, ao lembrar-me do jovem desempregado, lavador de carros que foi morto por entoar uma das músicas do jovem dez pacotes, que mencionava negativamente entre aspas, JES. (um caso insólito no mundo hodierno, alguém, foi morto no culminar do seculo XX e inicio do XXI por entoar uma simples e ‘inocente’ canção, de quem até nem é autor?!)

Ora, quem matou o jovem praticante do rap acima mencionado? Qual foi a reação dos órgãos da justiça, nomeadamente da PGR, o assassino foi-lhe instaurado um processo-crime? Não foi esta impunidade que “autorizou” o colega-guardião a atirar á matar uma vez mais, contra um cidadão indefeso? Disse-o antes e repito-o Camulingue e Cassule, são apenas a ‘ponta’ do enormíssimo iceberg oculto no vastíssimo oceano da impunidade e do terror, por isso ã UNITA utilizou-os como “bandeira”, mas a manifestação do dia 23, não foi apenas pelo Camulingue e Cassule, foram por todos os mortos e para todos os vivos, para que não tenham o mesmo destino dos malogrados acima mencionados, sobretudo para que os angolanos usufruíssem de mais cidadania e LIBERDADE, do que por exemplo usufruímos na era colonial...

Sinceramente, não me lembro de alguém que foi morto pelos guardiões do templo colonial, só por entoar uma ‘cançãozinha’ ou alguém ser morto pelas costas por ser apanhado a colar um panfleto contrário ao sistema...

Quando eu tinha Quatorze-Quinze anitos, já fui apanhado com o meu eterno companheiro Cláudio (Miguel Costa), por agentes da PSP (Policia colonial) por pinchar as paredes do muro da escola posto 15 no bairro prenda, com as palavras de ordem nacionalista/ independentista, que ouvíamos em surdina da emissora “angola combatente” propriedade do MPLA no exilio naltura...

porem, sempre que tal acontecia, os agentes indignados, dava-nos apenas fortes puxões de orelhas e um “bom” pontapé no traseiro, eu era sempre a vitima, pois o meu companheiro veloz e ágil como um gamo, escapulia-se sempre “por um triz” NUNCA os agentes da PSP fizeram a intenção de puxarem das pistolas e alvejarem o meu amigo.

Merecemos mais vida e mais cidadania ou não do que na era colonial?


É crime, lesa-pátria manifestarmo-nos a favor da LIBERDADE e do exercício da cidadania?

Isomar Pedro Gomes