Cabinda – A vontade de independência de Cabinda "está generalizada" entre a população, mas a luta armada não é opção para os cabindas, defendeu em entrevista à Lusa o padre Raul Tati, antigo vigário-geral da Diocese do enclave.

Fonte: Lusa
Raul Tati mantém a combatividade que no passado o levou várias vezes para a prisão por defender a independência de Cabinda e foi para manter viva a memória dessa luta que lançou há dias um livro sobre o papel da Igreja Católica naquele conflito.

Ao longo de 400 páginas, em "Cabinda - Percurso histórico de uma igreja entre Deus e César - de 1975 a 2012", o padre Raul Tati apresenta pontos de vista, documentos e testemunhos do envolvimento de religiosos e leigos na luta pela autonomia do enclave.

"O pretexto para este livro tem a ver com a história. Todos os povos têm a sua história e a Igreja tem também a sua história que tem que ser escrita, e eu achei que devia, tendo em conta o papel que desempenhei nesta igreja, durante cerca 20 anos, que devia pôr por escrito vários factos que foram acontecendo durante esse período de tempo", disse.

Raul Tati quis ainda, com o livro, homenagear o primeiro bispo da Diocese de Cabinda, Paulino Madeka, e a geração de sacerdotes subscritores do documento "Não podemos deixar de falar", publicado a 10 de fevereiro de 1975, em que pedem aos bispos de Angola e à Santa Sé "especial atenção" a Cabinda.

Questionado se em 2014 ainda faz sentido falar em autonomia para Cabinda, o padre Raul Tati responde que "isso é o mínimo" que se pode reivindicar. "No mínimo uma administração autónoma em Cabinda. É o mínimo. Sublinho bem este aspeto, porque a vontade de independência está generalizada", afirmou.

Quanto à alegada divisão dos cabindas nesta luta, o padre Raul Tati considera-a uma "mistificação". "É verdade que nós temos também alguns problemas no seio dos cabindas relativamente às várias tendências políticas e até a vários interesses em jogo. Todavia, havendo vontade séria da parte do governo de Angola, não há qualquer entrave, qualquer obstáculo para se conseguir um entendimento com cabindas. Não há", considerou.

Para Raul Tati, o que está em causa é a "falta de vontade" de Luanda em encontrar soluções.
"Aliás, entre os documentos que coloquei neste livro tem a ver com a estratégia gizada pelo (partido no poder) MPLA para impedir que todas essas iniciativas de diálogo e de entendimento entre os cabindas aconteçam. Nesse caso, eu sempre digo que a questão da união entre os cabindas é um problema que importa desmistificar", frisou.

O problema, alegou, "está na vontade política das autoridades de Angola em resolver definitivamente o diferendo de Cabinda". E quanto à via para o conseguir, Raul Tati afirma-se "pacifista": "Eu nesse sentido sempre fui claro. Sou um pacifista. Não sou pela via armada para resolver as questões".

A via armada foi "um instrumento", porque, salientou, "os cabindas tiveram que se organizar para resistir", em 1975, ao que classifica como "invasão de tropas do MPLA aliadas aos cubanos".

"A resistência armada, no contexto da luta de libertação de Cabinda, de alguma maneira teve a sua expressão e marcou a história. Agora é preciso procurar outras vias que nos possam levar ao diálogo frutífero em relação à questão de Cabinda", concluiu.