Luanda - O Cofre de Previdência e de Pessoal da Polícia Nacional (CPPPN) é a maior associação mutualista do país. Possui cerca de 90 mil associados, e é dirigido pelo comissário Luís Alexandre, o homem a quem foi incumbida a missão de traçar políticas que permitam a melhoria das condições de sociais dos polícias associados.

Fonte: O País
Estes reclamam de quase tudo, desde a casa, empréstimos de dinheiros, aos problemas de saúde, mas pena mesmo é que, apesar de muitos deles já terem sido contemplados nos projectos em curso, a maioria dos polícias não cumpre os compromissos assumidos com os bancos e o próprio Cofre, o que acabou por prejudicar significativamente as acções da instituição.

Mais pormenores sobre os projectos em curso e as actividades do Cofre na entrevista que se segue com este economista e oficial superior da Polícia Nacional.

Qual é o estado de saúde do Cofre de Previdência e de Pessoal da Polícia Nacional (CPPPN)?
O CPPPN está com dificuldades financeiras. E a saúde financeira é que determina a saúde de qualquer instituição. Estamos com algumas dificuldades financeiras porque estamos a investir muito naquilo que é a necessidade mais imediata dos nossos associados, que é a habitação. Estes investimentos já vêm sendo feitos há muito tempo e agora estamos naquele momento em que precisamos de começar a receber aquilo que investimentos.

Os nossos associados ainda estão um bocadinho cépticos em relação a isso por uma questão de cultura.

O angolano vem de um partido único, onde as coisas eram dadas, oferecido e tudo era do Estado, mas hoje temos que começar a mudar de mentalidade, porque estamos num mercado livre, numa economia de mercado onde as coisas têm de necessariamente ser pagas. Estamos com essa dificuldade de as pessoas entenderem que a forma que têm de ter uma casa própria é pagando essa casa, através das instituições que foram criadas para o efeito.

A falta de um instrumento do Estado que regula as taxas de juros ligadas ao crédito habitação também tem estado a criar algumas dificuldades, por isso o Cofre, mais uma vez, disponibilizou-se em suportar, subsidiar parte destes juros. Nós vamos pagar metade dos juros que os nossos associados deviam pagar aos bancos, mas estamos ainda num processo de sensibilização e acredito que, dentro em breve, teremos respostas positivas em relação a isso. Aliás, alguns já estão a assinar e dispostos a irem aos bancos.

Quem é o associado do Cofre de Previdência e do Pessoal da Polícia Nacional?
O associado do Cofre é o polícia, desde o agente ao comissário e todo o funcionário civil que trabalha no Comando-Geral da Polícia Nacional. Estes, em princípio, são os associados do Cofre. Estamos a prever estender a nossa acção para o Ministério do Interior, mas estamos primeiro a arrumar a nossa casa para depois darmos eventualmente estes passos.

É verdade que, neste momento, têm cerca de 90 mil associados?
É verdade.

E os associados são sobretudo polícias?
Sim, confirmo.

Mas o senhor comissário deu-nos a entender, no início desta conversa, que os associados, neste caso os polícias, são de alguma forma incumpridores, sobretudo no pagamento aos bancos e o próprio Cofre. Será isso que o comissário quis transmitir?
Não é bem isso. Falei de cultura, a questão é de cultura, é geral. Há-de concordar comigo que tudo tem a ver com a educação que a gente transmite. Então, até hoje fomos dizendo que era tudo do povo, do Estado. Mas hoje temos que passar a mensagem ao contrário, dizer que ‘você precisa de ter bens próprios, mas para que possas ter um bem próprio tens de começar a pagar’.

Nós também estamos habituados a pagar tudo a pronto pagamento, temos que começar também dizer que é possível comprar pagando em prestações. Portanto, é uma questão de cultura e acho que o que falta é um bocadinho mais de divulgação, diálogo, publicidade e acredito que vamos… As pessoas já estão a aderir, a nível dos comissários, por exemplo, já não temos estes problemas. A maior parte deles assinaram no Conselho Consultivo.

Quando os interessados aderem ao Cofre não têm noção dos seus deveres e direitos?
Eles são informados, têm consciência, mas como há-de concordar comigo há sempre os cépticos, aquelas pessoas que nem sempre querem ir para o caminho que é indicado, mais certo. Muitos deles até preferem sair para uma noite, gastar 500 dólares, do que pouparem este valor, porque também não temos a cultura de poupança. Este é outro problema que temos. Portanto, é um processo.

'Quando viemos para cá o Cofre estava numa falência absoluta' 

Para uma instituição como o Cofre, que existe de 1933 mas cuja revitalização ocorreu somente depois do alcance da paz no país, como é que foi o processo de reorganização, mentalização e angariamento dos associados?
Tivemos que fazer um trabalho muito forte, muito grande de marketing. Tivemos que dar algumas facilidades e esse trabalho resultou. Nós, inicialmente, quando começámos, a estratégia que adoptámos foi massificar os empréstimos. A massificação dos empréstimos permitiu que as pessoas percebessem que podiam através do Cofre buscar empréstimos para atender questões ou situações urgentes e inadiáveis.

Por exemplo, um empréstimo até 500 mil kwanzas para atender uma consulta, evacuação e de facto isso resultou, mobilizou e sensibilizou as pessoas. Pena é não conseguirmos continuar a dar isso porque chegou uma altura em que tivemos que optar, entre continuar a dar empréstimos e construir casas.

Hoje estamos a trabalhar no sentido de, se calhar, constituir uma cooperativa de crédito. Com a cooperativa de crédito vamos poder buscar dinheiro fora para dar aos nossos associados, mas também em parte acabámos assinando um protocolo com o Banco Sol, para onde temos encaminhado os nossos associados na falta da nossa possibilidade de intervenção.

Isso, de facto, resultou e sensibilizou grande parte das pessoas para a adesão no Cofre. Mas também o nosso trabalho em si tem estado a ajudar, porque as pessoas têm estado a ver resultados, o Cofre tem estado a evoluir e a desenvolver-se. Isso tem levado as pessoas a acreditarem mais no nosso trabalho, no Cofre e num futuro promissor, o que tem levado as pessoas a aderirem cada vez mais.

Os próprios agentes ou alistados quando se inscrevem solicitam para que possamos para lá mandar os nossos representantes, para que, logo na altura da inscrição, possam aderir ao Cofre. Hoje por hoje as pessoas é que nos procuram, aqueles cépticos uma conversa basta para eles continuarem, porque há pessoas que às vezes aparecem dizendo que ‘quero desistir porque não sinto nada’.

Mas se colocarmos aqui, dizemos que tem esta ou aquela possibilidade, o seu dinheiro que está a descontar não está sendo atirado ao ar mas é um dinheiro que está sendo aplicado numa instituição que um dia lhe dará um retorno. Como sabe, é praticamente uma poupança, nós estamos a construir com parte do dinheiro dos fundos do Cofre, mas acredito que este dinheiro depois terá retorno e será aplicado para atender os compromissos futuros que temos com os associados.

Quais são as principais acções desenvolvidas pelo Cofre, até porque o senhor comissário Luís Alexandre já está a cumprir o seu segundo mandato?
O balanço do que fizemos é positivo. Quando viemos para cá o Cofre estava numa falência absoluta. O Cofre já foi uma das instituições mais ricas do país, segundo consta dos documentos. Mas a inflação, troca da moeda e toda a conjuntura que decorreu ao longo dos 30 anos de guerra levaram o Cofre à falência.

Encontrámos o Cofre em situação de falência absoluta, adoptámos uma estratégia que conduziu a que hoje seja reconhecida como uma das maiores associações mutualistas do país.

O que é que nós fizemos? Primeiro, olhámos para a reestruturação em si, a parte administrativa tratámos de actualizar os estatutos. Aprovámos um novo estatuto, fizemos estratégias que levaram com que, por exemplo, fosse possível estes empréstimos, a construção de casas. Também adoptámos uma estratégia de investimento criando, por exemplo, o Grupo C, que é o veículo de investimentos do Cofre que também resultou.

Temos aí um projecto de referência que é o Ango-Chi em que participamos, temos uma agência de viagens que acabou por ser a terceira melhor agência a nível do país. Penso que demos alguns passos significativos que marcaram esta mudança, porque tivemos a era 1975-2005 e a de 2005-2014. Há outras acções. Falei ca construção de casas e estamos a levar esse tipo de trabalhos a uma dimensão nacional, pena é que não tenhamos recursos suficientes porque podíamos fazer muito mais.

Quais são as principais preocupações apresentadas pelos vossos associados, neste caso os polícias?
É casa e empréstimos. E uma das maiores preocupações também está ligada à saúde. Temos muitos camaradas com necessidade de intervenção, evacuação e apoio social.

Um dos marcos do ano passado foi o facto de termos conseguido apoiar o Nzoji, onde temos os órfãos filhos de polícias. Aquela instituição tem passado algumas dificuldades e hoje o Cofre é padrinho do Nzoji, onde, no ano passado, demos um donativo significativo. Essa acção já se insere na estratégia de investimentos do Cofre, fomos dar aquele donativo não com os recursos do Cofre, mas sim com o resultado dos nossos projectos.

Hoje a Polícia tem um considerável número de efectivos e o Cofre consequentemente um elevado número de associados. A distribuição de casas que tem sido feita dá para colmatar o elevado número de pedidos? Não tem havido muitas reclamações?
Tem havido algumas reclamações, mas temos estado a atender, primeiro por ordem de entrada do pedido que é dirigido a sua excelência o senhor do comandante-geral da Polícia Nacional. E sua excelência senhor comandante-geral orientou no sentido de que conforme os pedidos forem chegando, nós constituirmos listas e, a partir delas, vamos atendendo às necessidades.

Naturalmente, toda a pessoa que estiver interessado numa casa manifesta o interesse e quem não manifestar é porque não está interessado. O que acontece é que temos aqui uma lista grande de casas e isto levou-nos a constituir uma imobiliária. Dentro de três meses estaremos a lançar uma imobiliária.

Quantos pedidos o Cofre têm de agentes ou oficiais da Polícia a solicitarem casas?
Temos aí controlados cerca de quatro, cinco mil pedidos de casas.

E qual é a percentagem que o Cofre poderá atender imediatamente?
Até agora já temos cerca de mil casas e agora vamos atender mais cerca de 300 casas. Conforme vê, só não estamos a fazer mais por falta de meios financeiros. Estamos perfeitamente estruturados, como vê vamos entregar agora oito edifícios.

Estou-lhe a falar de uma imobiliária, estamos organizados, até a constituímos no sentido de dar vazão a estes pedidos. Havendo dinheiro, estaremos em condições, sim senhor, de atender estes pedidos.

Luanda normalmente é o cartãode-visita. Os projectos que têm em curso na capital ocorrem num mesmo ritmo nas outras províncias do país, onde ,ao que se sabe, os vossos associados acabam por enfrentar mais dificuldades sociais?
Discrepâncias naturalmente que há. Começámos por Luanda. O primeiro passo já foi dado, temos terrenos em quase todas as províncias do país. Terrenos com direito de superfície e projectos. Estamos à procura de meios financeiros para avançar.

Mas não há construções no interior?
Já arrancámos com Saurimo, temos 58 casas já a terminarem. Malanje, Cunene e Bengo, estamos na expectativa de começar. Só não começamos porque não temos condições financeiras para o fazer, porque temos os terrenos e os projectos. Temos tudo pronto para começar.

Quanto custa uma destas casas que oferecem aos vossos associados?
Temos estado a procurar fazer com que as nossas casas sejam as mais baratas do mercado. Aliás, têm sido pelo menos as mais baratas do mercado. Não estamos aqui na perspectiva do lucro, mas da satisfação das necessidades dos nossos associados. Portanto, os preços são relativos. Estamos, neste momento, na luta de conseguir que o Executivo nos apoie na construção de infraestruturas. Já há uma orientação neste sentido.

O que é que pretendem concretamente?
Que o Executivo assuma as infraestruturas para que possa baixar o preço das casas. Estamos a trabalhar neste sentido e isso acontecendo vai influenciar no preço, vamos ter casas muito mais baratas. Estamos a falar de casas T3 com 100 metros quadrados a 83 mil dólares norteamericanos, as casas T2 a um preço também um bocadinho mais baixo.

Conforme vê estamos a procurar fazer com que as casas sejam baratas e que vá de encontro com o bolso dos nossos associados.

Qual é o ‘feed back’ que têm recebido dos vossos associados já beneficiados?
É uma satisfação muito grande. Se ler a Folha Azul vai ver que, de facto, temos estado a satisfazer as necessidades de muita gente. Se for à Vila Azul e entrevistar os moradores vai ver que há uma satisfação muito grande. Levantou a questão da saúde como sendo uma das principais preocupações apresentadas pelos associados.

Como é que pensam resolver os inúmeros pedidos de ajuda que têm recebido?
Temos um projecto já concluído da construção de uma clínica, não obstante o facto de o Executivo estar a trabalhar também no projecto de construção do Hospital da Polícia. Penso que as obras do hospital devem estar a começar este ano se não me engano. A nossa clínica está dependente de alguns financiamentos que estamos à procura a nível internacional, mas acredito que num prazo máximo de três anos teremos os problemas da saúde a nível da Polícia Nacional resolvidos.

Temos sentido alguns constrangimentos, porque, como sabe, somos atendidos a nível do Hospital Militar Principal, mas nem sempre as coisas funcionam como esperamos. Esperamos que dentro de três anos tenhamos já as condições criadas neste sentido.

Está a dizer que dentro de três anos teremos a clínica do Cofre?
Estamos muito engajados nisso. Para além do Hospital da Polícia poderá haver uma clínica do Cofre.

Onde é que será construído?
Temos o terreno e o projecto já feito a nível do Vila Azul, onde temos o espaço reservado para a clínica. Vila Azul é o nosso maior projecto, com cento e tal hectares e justifica.

Existe um acordo entre o Cofre da Previdência e do Pessoal da Polícia Nacional e o Banco Sol. A que tipo de créditos os vossos associados têm acesso? Será que um Polícia que pretende fazer negócios também se pode dirigir a esta instituição e solicitar um determinado montante financeiro?
Temos um crédito ao consumo até cem mil e um crédito habitação até 500 mil. Iniciámos com essas áreas todas a funcionar, com o crédito ao consumo, habitação. Lembro-me de termos dado crédito habitação de cerca de 100 e tal mil e a uma associada nossa que beneficiou até de cerca de 300 e tal mil dólares norte-americanos.

Mas, começamos a sentir que os nossos associados não cumpriam com as suas obrigações junto dos bancos e estava sempre o Cofre a cobrir. Então começamos a limitar os valores, hoje temos estado a atender mais os créditos consumo até 20, 25 ou 30 mil dólares. Sempre que podemos e sentimos que é um associado que pode dar uma certa garantia estende-se um pouco mais o valor.

Sentimos que não havia feedback dos nossos associados, uns levantavam os salários antes dos compromissos bancários e isso criou-nos algumas dificuldades. Acabámos pagando muitos créditos vencidos. E esses créditos vencidos que pagámos temos estado a assinar documentos para recuperarmos de forma paulatina, que é um processo um bocadinho mais complexo.

Existe também um acordo entre o Cofre e o Banco de Poupança e Crédito. O que é que prevê? Pensam afastar-se do Banco Sol?
Esse acordo já existe há vários anos, desde 2011 se não me engano. A crise financeira contribuiu para a não execução desse acordo, mas agora creio que as condições estão criadas. Já está tudo acordado, trabalhamos com o banco e acredito que, dentro de mais duas ou três semanas, começaremos a montar as coisas. Temos um protocolo de crédito à habitação, consumo e automóvel. Portanto, temos também com o Banco Sol um crédito automóvel. Há muito efectivo, nós queremos até assinar mais acordos porque a demanda é muito grande.

Além dos efectivos da Polícia Nacional, que constitui o grosso dos vossos associados, têm também recebido solicitações de órfãos e viúvas.

Que tipos de apoios têm dado?
No caso das viúvas, aquelas que perderam os maridos nas missões de serviço, o Comando-Geral da Polícia Nacional assume e paga ao Cofre a casa que lhe é concedida. Às outras viúvas, umas porque os filhos já trabalham, demos as casas e ela através do filho paga. Aquelas que têm uma capacidade financeira nós ajudamos, entregamos a casa e ela depois vai pagando.

Mas gostaríamos de fazer um bocadinho mais, gostaríamos de levar uma solução às viúvas, mas só que muitos dos nossos projectos ainda não estão a funcionar, para dar uma margem de lucros tão grande e levar acções concretas para as viúvas. Para os órfãos, além de os criarmos através do Nzoji, temos uma creche onde permitimos que a viúva e o órfão possam ter acesso a preços bonificados. Estamos a pensar levar a cabo colégios e institutos médios.

Temos a nível do Vila Azul um espaço preparado para a universidade. Se nós conseguirmos levar a cabo estes projectos, então estaremos a criar condições para que o órfão possa ter acesso a preços bonificados. Ele entra para creche e sai da universidade com preços bonificados, inclusive teremos a possibilidade de dar bolsas aos nossos órfãos.

'Temos comissários que não querem pagar taxa de condómio'

As pessoas que habitam nos condomínios que estão a construir são sobretudo efectivos da Polícia Nacional, desde o agente ao comissário. É verdade que não aceitam pagar a taxa de condómino?
Mais uma vez voltamos ao início da nossa conversa. É uma questão de cultura, nunca ninguém pagou uma taxa de condómino. As pessoas não estão habituadas e não pagam mesmo. Estamos com dificuldades, porque é o Cofre que tem estado a suportar a limpeza e aquela intervenção básica que é feita. Temos sido nós e vamos aproveitar esta entrevista para apelar a mudança de consciência. Temos que começar a nos consciencializar que as coisas mudaram, o país está em mudança.

Temos que mudar as nossas mentalidades, é a única forma de estar. Temos até comissários que não querem pagar.

Não pagam por quê? Trata-se apenas de uma questão de cultura?
Muito sinceramente, não percebo o que é que se passa de concreto. Tenho que admitir que seja uma falta de hábito, nunca pagou, não se consciencializou até agora que deve pagar e não paga. Mas vão pagar.

Há um sentimento de total impunidade da parte dos comissários, tendo em conta que existem agentes que pagam?
Não pagam. E são 1500 Kwanzas apenas. A partir da altura em que terão de pagar um bocadinho mais, não sei o que haverá de ser quando for três ou quatro mil Kwanzas. Sei que há condomínios aí onde paga-se 500 dólares mês de taxa de condómino e as pessoas pagam. As pessoas querem ver um jardim tratado, ruas limpas, lá estamos a cobrar 1500 Kwanzas e mesmo assim não pagam.

E isso tem criado muitos constrangimentos?
Muitos.

‘Tenho 90 mil homens, não me posso atrever a gerir o dinheiro destes...’

O Cofre teve de criar um braço empresarial para se auto-sustentar. Como é que se deu este processo? Não houve divergência tendo em conta que são polícias a criarem várias empresas?
O Cofre não é da Polícia, é uma instituição privada, mutualista dos polícias e não da Polícia Nacional.

Portanto, nos seus estatutos prevê investimentos, tanto investimentos em títulos como outrem. Está prevista a rentabilização dos valores postos aqui à disposição. E a forma que temos é ir para o mercado, aplicar em títulos, acções e negócios. Desde que sejam negócios limpos.

Quais são as aplicações ou negócios em que está envolvido o Cofre?
Neste momento, temos o investimento feito ao nível da Ango-Chi, da agência de viagens que abordei há pouco tempo. Na agência, por exemplo, ela atende os polícias sem taxas. O polícia vai lá e compra o bilhete sem taxas. O valor que a Taag nos cobra é o que o polícia paga. Na agência de viagem o polícia entrega o dinheiro para lhe tratarem o visto e só paga o que é cobrado na embaixada, não paga taxa nenhuma. É uma forma de ajudarmos os nossos associados.

E estamos a prever investir noutras áreas, como por exemplo no seguro de saúde do polícia, numa instituição de ensino, para garantir que o nosso polícia, o órfão, a viúva, tenha um espaço onde possa beneficiar de uma bolsa sem pagar. Acho que o importante é nós fazermos negócios que estejam dentro da lei, que não sejam negócios que possam trazer complicações à imagem do Cofre.

Estou cá e um dia poderá estar um civil a dirigir isso. Estou eu porque fui dispensado para esta tarefa, entendeu-se na altura que era uma tarefa muito importante para a estabilidade e dignidade do polícia.

Quem vê o site do Grupo C tem a impressão de estar perante um grande grupo empresarial, com segmentos como a C Capital, C Energia, C Indústria e C Imóvel. O que é que existe concretamente?
Neste momento, estão operacionais alguns negócios destas C’s. Na C Serviço temos a ideia. É uma questão de estratégia, daquelas coisas que só os loucos fazem, que é pensar alto. E nós, em algum momento, ficamos loucos e pensamos alto. O que é que aconteceu? Pensamos que é possível em Angola constituir-se um grupo muito grande, que se defenda a entrada dos grandes grupos que há-de acontecer naturalmente. E nós pensamos no Grupo C e criar as várias C’s.

Vou começar pela C Capital, que foi criada para albergar tudo que é negócio ligado à área financeira e não-financeira. Por exemplo, se eu tiver constituído e vou constituir – uma cooperativa de crédito, vou pendurá-la à C Capital. E vou ter que ter experts ligados à C Capital que possam atender a negócios ligados aos seguros, micro-créditos, fundo de pensões. Estamos já a atender aos fundos de pensões porque os valores futuros dos nossos associados devem ser geridos por uma associação apropriada para o efeito. O Cofre enquanto tinha cinco mil associados podia gerir o dinheiro destes cinco mil homens.

Tenho 90 mil homens, não me posso atrever a gerir o dinheiro destes, construir e dar empréstimos. Estou a constituir um fundo de pensões que vai gerir a parte futura, C Capital. A C Imóveis, por exemplo, faleilhe que vamos criar a imobiliária que vai atender a construção. Não vai continuar a ser o camarada Luís Alexandre, presidente do Cofre, a fazer de C Imobiliária.

Todos os dias tenho aqui uma fila de pessoas a falarem de casa e outros de empréstimos. E a única forma que encontrei perante a demanda que tenho é criar instituições ou empresas que atendem cada área de negócio, interesse ou necessidade identificadas a nível dos nossos associados. Então a C Imobiliária vai atender todo o associado que quiser uma casa ou a decoração da sua casa.

Repare que estamos a ir até ao pormenor, além de comprar uma casa, a própria decoração, vamos criar condições para que ele tenha. Estamos a falar até da casa do agente. Muito brevemente estaremos a oferecer aos nossos associados a possibilidade de comprar uma mobília a preços bonificados, produtos fabricados aqui, mas de alto padrão. Daqui a mais seis meses, se me perguntar, eu vou mostrar a qualidade desta mobília.

Estamos a tentar criar soluções para o polícia, sabe que ele já não ganha tanto e se não ganha tanto tem de haver alguém que crie soluções para que ele possa encontrar, com o bocado que ganha, e possa viver de forma condigna, sem ter de recorrer a outros métodos. Então a C Imovél vai construir casas, ter soluções para decoração e mobílias.

Temos a C Invest, estamos à procura de parceiros para, por exemplo, investir na agricultura, indústria e eventualmente nas pescas. Essa é a nossa estratégia. Poderão perguntar: se eventualmente tiver um parceiro que invista na indústria e os produtos onde é que vão encaminhar? Direi que vou encaminhar estes produtos na C Logística, que há-de eventualmente ter um parceiro para revitalizar as cantinas da Polícia.

A própria logística da Polícia, o serviço 24 horas e a casa do próprio polícia. Há uma coisa que as pessoas não entendem e às vezes faz-se uma comparação entre o polícia e o homem das Forças Armadas, mas há uma diferença muito grande: o polícia está 24 horas pressionado. As Forças Armadas estão mais pressionadas quando há guerra, quando há paz estão menos.

Nós estamos pressionados todos os dias, há gatunos e assaltos. Tendo em conta o número de efectivos que temos, nem sempre conseguimos que o homem que passou a noite hoje no serviço possa descansar para regressar um dia depois. Às vezes tem de continuar e, continuando, quem está a tratar da família e das coisas dele? O polícia é um homem permanentemente pressionado.

Incluindo em termos sociais?
Em termos sociais também. Ele está aqui na cidade, está perante essa imensidão de dificuldades que todos nós sentimos. O polícia não é um ser extraterrestre, é um ser humano, um indivíduo como tu.

A única coisa que o diferencia é a farda e o compromisso que tem para com a sociedade. Ele tem de estar naquele local quando às vezes nem devia estar, logo temos estado a tentar encontrar soluções que possam atenuar esta situação, porque ele depois recorre a práticas que não são aceitáveis para poder sobreviver. Mas se encontrar um dia soluções a nível do Cofre, acredito que um dia ele muda. Há-de pensar que entre receber uma gasosa e recorrer ao Cofre, o que há-de ser melhor para mim? Acredito que haveria de vir cá e dizer que tenho esta necessidade gostaria que vocês me ajudassem.

A parceria com os chineses da HS e o Cofre valeu a pena?
Em parte, porque realizámos um sonho, mas temos estado a repensar esta parceria. Temos estado a pensar a forma como vamos estruturar a parceria porque há uma diferença muito grande de cultura. A própria forma de estar, mas estamos a trabalhar neste sentido.

Se eu fosse polícia poderia ir ao shopping Ango-Chi e beneficiar de algum desconto?
Há uma coisa que as pessoas não sabem, o Ango-Chi não é nosso. Uma coisa é o grupo empresarial que é a dona do Ango-Chi e outra coisa é o Ango-Chi. O negócio Ango-Chi é dos nossos clientes, somos apenas os donos daquele espaço.

Quem vende ou deixa de vender são os comerciantes. E até agora não há ainda nenhum acordo no sentido de eles fazerem alguns descontos. O que estamos a fazer é procurar parceiros que possam actuar connosco no espaço para criar soluções para os polícias.

O projecto de construção de um shopping em Viana morreu?
Não, há um espaço já reservado para o shopping no Vila Azul, mas por questões financeiras não conseguimos construir.

O mesmo acontece com a universidade?
O mesmo acontece com a universidade, shopping, salão de festas, etc. As pessoas que visitaram o projecto Vila Azul dizem que é um dos melhores estruturados a nível do país. Visitem aquilo e vão ver.

Existe este reconhecimento a nível interno ou também do exterior? É verdade que algumas organizações congéneres têm procurado o Cofre para ‘beberem’ desta experiência?
Já, têm vindo. Fundamentalmente empresas de construção que estão a fazer projectos similares noutros países, que vêm para cá para ver a forma como o estruturamos e aquilo está feito. Estamos a tentar o Vila Azul a nível nacional. Não obstante o facto de não ser na mesma dimensão, mas um mini Vila Azul a nível nacional. Isto é um sonho.

Este sonho está relacionado com os 30 prédios que pretendem construir no país?
A nível do Vila Azul, em Viana, estamos a prever 50 edifícios. Temos oito já construídos, mas vamos atingir a cifra de 50 edifícios.

Isso em Luanda?
Só no Vila Azul. Mas temos o projecto Zango que também prevê prédios. Temos um modelo já pronto. A nível das outras províncias também estamos a prever a criar uma zona só de edifícios até quatro andares.

Estamos a falar de edifícios que estão em construção e outros ainda no papel. Mas como é que está a situação do património que pertenceu ao Cofre?
Este edifício onde estamos faz parte do património do Cofre do passado. O edifício a seguir, onde está a loja da Fenícia também. Em 1975, as pessoas ocuparam, estamos na luta para se conseguir desalojar as pessoas, no sentido de recuperarmos os edifícios e voltarmos a arrendar. Esta é uma luta mas as pessoas não compreendem. Estamos a convidar a muitos deles para irem aos nossos, porque a tendência hoje é estes projectos tornarem-se dormitórios e aqui a zona da baixa tem estado a virar zona de escritórios. Em relação ao edifício 22, mais pequeno, lá da baixa as pessoas estão sensibilizadas e dispostas a mudarem.

Não existem outros edifícios nas restantes províncias?
Existe um bairro a nível de Malanje, mas também está ocupado por alguns polícias e populares. Mas sobre este bairro não estamos ainda a tratar nada porque primeiro queremos tratar o que está aqui em Luanda.

Já apresentaram estas preocupações ao Executivo?
Já. Aliás, temos até conhecimento que foi aprovada a reabilitação deste edifício e outro ainda em 2009 ou 2010. Vimos que no Programa de Governo constava este e outros edifícios. Se calhar, devido à crise financeira as coisas não aconteceram.

O Cofre está disposto a rever o que é seu?
Isto é nosso, está registado em nosso nome, somos os legítimos donos, portanto vamos ter que reaver. É que eles não saem e nem querem pagar rendas. O que pretendem pagar são 20, 30 ou 40 dólares norte-americanos. Com 40 dólares hoje nem para fazer a manutenção do prédio conseguimos. A solução é continuar a dialogar com os moradores até que se consciencializem que em vez de estarem numa casa alugada, devem ter o seu bem próprio, que seja privado, pessoal. E estamos a dar a possibilidade destes nossos inquilinos comprarem os apartamentos ou vivendas que temos aí à venda. Muitos deles até já mudaram, os mais cépticos e teimosos ainda estão aí.

‘Já salvámos aqui vidas’

Têm um universo de 90 mil associados, o que dá uma boa contribuição financeira. Quanto é que o Cofre movimenta mensalmente?
São valores mínimos, porque até agora são valores muito baixos. Começamos a descontar, mas vamos ter que ir à segunda fase onde vamos sensibilizar as pessoas de que vem descontar uma coisa significativa para que possamos fazer muito mais.

Mais qual é o montante que arrecada mensalmente com estes descontos? É uma questão que os polícias associados gostariam de saber…

O Cofre realiza todos os anos assembleias onde são apresentadas todas as contas. É lá onde nós abrimos o livro. Mas continuamos a sentir que são valores muito baixos para aquilo que são as nossas necessidades e as soluções que pretendemos criar para os nossos associados.

Ainda existem muitas pessoas, principalmente polícias, que não querem aderir ao Cofre?
Já tivemos muitos casos de pessoas que vinham cá dizer que, a partir de agora, não quero mais descontar. Mostrava-lhes as soluções e benefícios que estavam à volta dele e recuavam. Agora não temos situações destas. Um ou outro fala quando está distante de nós e porque quer falar, mas já não temos assim situações concretas. Mas quem quiser pode escrever e contactarnos, porque estamos abertos a isso. Acredito que, logo a seguir, se arrepende porque já está provado que eles (os nossos associados) precisam mais do Cofre do que nós deles.

O que tem acontecido na prática é ele hoje dizer que não quer mais descontar e, a seguir, na primeira esquina, regressa, diz que está aflito e precisa de um empréstimo, tem que evacuar a mulher, internar o filho e outras situações que temos estado a atender. Tivemos aqui até pessoas que agitavam, mas as evidências falam por si e estão aí. Nós já salvámos vidas.

Não acha que há pouca divulgação das vossas acções no sentido de aproximar mais polícias ao Cofre?
Temos isso em papel, a estratégia está definida. Estamos a dar os primeiros passos, temos alguns colaboradores que já têm estado a trabalhar neste sentido. Gostaria que a imprensa também nos ajudasse e vamos divulgar aquilo que é bom, os feitos colectivos. A nossa luta é para que o polícia tenha as condições mínimas para a sua sobrevivência.

Entendemos que a partir da altura que o polícia tiver a sua casa, o seu empréstimo, os filhos na creche e a saúde garantida, acredito que não há de haver esse fenómeno gasosa. De forma natural as coisas se encaixam.