Luanda - Um dos queixosos está a leccionar naquela instituição há mais de 6 anos e disse que os problemas que agora decidiram tornar públicos já vem de há muito tempo. “A Gregório Semedo, no seu projecto de concepção ou na sua constituição, não valoriza o quadro nacional. Não temos nenhum angolano a exercer um cargo de direcção ou, pelo menos, na linha intermédia”.

Fonte: O País
Os docentes foram unânimes em dizer que os licenciados angolanos têm um contrato de trabalho com um salário fixo de 250.000,00 kz, que difere dos expatriados (estes auferem acima de 300.000,00kz) estando ou não capacitados.

Além de auferirem um salário relativamente superior, os professores estrangeiros, que são maioritariamente de nacionalidade portuguesa e cabo-verdiana, têm direito a outras regalias.

“Lhes é dada uma casa, numa zona residencial no Futungo, pertecente à universidade, onde normalmente o pessoal(estrangeiro) fica; subsídio de alimentação e cartão de saúde que cobre tudo, enquanto o angolano, não”, apontaram eles como algumas das situações que os têm deixado desmotivados.

No ano passado, segundo nos contam, apareceu um cidadão português naquela instituição que, a princípio, era cozinheiro, mas, por ter chega- do na altura das matrículas, e porque alegadamente entende de informática, foi posto a trabalhar neste processo de ingresso.

Um tempo depois, o cidadão passou a leccionar, a dirigir o departamento de Engenharia Informática e a dar orientação de projecto de fim de curso aos estudantes.

Em Novembro, continuaram os queixosos, dois colegas portugueses investigaram sobre este cidadão e descobriram que não tinha licenciatura, quando “era visto como mestre, na UGS”. Os nossos interlocutores lamentaram o facto de aqueles estudantes terem sido orientados por alguém que nem sequer está capacitado para tal e culpabilizam a instituição, já que esta tem noção do pessoal que contrata para prestar serviços.

“Há muita facilidade de entrada de professores estrangeiros na UGS, um grande espírito de camaradagem. Se for angolano eles pedem todo o tipo de documentos e mais alguma coisa, só para lhe dificultar o processo”, sublinham.

Instauração do medo

As coisas na UGS são feitas ao prazer daquele que está a dirigir, segundo os nossos entrevistados, e sem perspectivas do quadro vir a mudar.

“Existe o medo de demissão imediata - e a partir deste medo , eles conseguem manter o pessoal na ‘linha’. Existem angolanos com título de doutores e são bons professores, às vezes, são perseguidos na instituição por causa disso”, acrescentaram.

Os angolanos são cada vez mais prejudicados, de acordo com aqueles professores, pois recentemente constatou-se o caso de um colega que deu aulas e não estava a ser pago, quando reivindicou o seu direito, foi perseguido até ao ponto de decidir abandonar a instituição.

Na Faculdade de Ciências Económicas e Empresariais, por exemplo, ainda reproduzindo o que os docentes disseram, quem a dirige não é formado na área, a sua área de formação é Educação Física.

“Em todas as faculdades não há nenhum angolano a dirigir e alguns os decanos não são formados na área. Muitos de nós não reclamam por medo de perder o pão, senão, existe muita gente em condições de digirir estas faculdades”, fizeram, saber.

Recordam também que tinham um colega, Édio Martins, de nacionalidade portuguesa, que exercia o cargo de assessor do reitor, mas depois duma discussão que teve com o antigo vice-decano da Faculdade de Economia e Ciências Empresariais, Carvalho Simões, tomaram conhecimento de que ele nem sequer era licenciado e tinha apenas o segundo ano do curso de Geografia.

“Passado algum tempo, depois de a informação ter chegado à instituição, aquele indivíduo foi afastado do cargo e hoje sabemos que dirige o Instituto Superior de Ciências Tecnológicas (INSUTEC)”, reforçam.
 
‘Angolanos não sabem nada’

Estas palavras foram reproduzidas durante uma reunião, segundo os queixosos, pelo reitor da universidade. De acordo com os interlocutores o reitor, José Semedo, afirmou que “os docentes angolanos não sabem nada e devem aprender com os colegas estrangeiros”.

“Foi uma autêntica humilhação”, recordam, pois, “depois do reitor ter dito aquilo, os colegas de nacionalidade estrangeira puseram-se a rir de nós. Depois deste dia muitos colegas já não participam das reuniões presididas pelo director da universidade”.

Para finalizar, os professores nacionais suspeitam que deve existir entre os seus colegas, expatriados com o visto de trabalho caducado, falsos bilhetes de identidade, já que alguns deles, inclusive, afirmam categoricamente que nasceram em Angola. Chamam atenção para que haja uma vistoria do SME na instituição e se possível também do Ministério do Ensino Superior.
 
José Semedo: ‘Dizer que o angolano não sabe nada é virar o ‘fuzil’ contra mim’

Diante das acusações que pesam contra si e contra a universidade que dirige, o nosso jornal ouviu o reitor José Semedo. Este, respondeu às nossas inquietações alegando, a princípio, que não existe qualquer tipo de discriminação na UGS.

Não se pratica, nem poderia ser praticada, discriminação (negativa) dos angolanos relativamente aos estrangeiros, naquela instituição superior, segundo o reitor. Quem assim afirma, ou não conhece a realidade ou pretende manchar o bom nome, a imagem e a idoneidade da UGS, acrescentou.

Embora não tenha avançado valores, o reitor fez saber que a “grelha salarial” aprovada e vigente na UGS é igual para todos, independentemente da sua nacionalidade ou do seu local de contratação, variando unicamente em função dos seguintes critérios: habilitações académicas e experiência profissional.

Nem mesmo nas regalias há discriminação, segundo José Semedo, pois fez saber que as regalias básicas são, com base nos princípios da igualdade e da não discriminação, as mesmas. Por exemplo, se exercer cargo de direcção ou de chefia, terá subsídio de comunicação; subsídio de combustível caso use viatura própria para o trabalho, etc.

“Há, contudo, as regalias adicionais em função do vínculo jurídico-laboral com a Empresa. As regalias adicionais não têm como fundamento a nacionalidade do professor, mas sim o local da sua contratação (no nosso país ou no estrangeiro). Um professor contratado a partir do exterior terá, independentemente da sua nacionalidade, direito a alojamento na nossa Guest House; seguro de saúde; transporte colectivo e uma viagem anual de férias, em classe económica”, esclareceu.

As regalias acabadas de referir, de acordo com o reitor, são aplicáveis, também, aos nacionais, caso sejam contratados a partir do exterior do país e não são aplicáveis aos estrangeiros que sejam contratados no país.

Ainda nesta senda, o nosso entrevistado fez questão de referir que existe uma regalia que é concedida exclusivamente aos professores nacionais em regime de exclusividade, que consiste na concessão de bolsas de estudo internas ou externas, em que a Empresa mantém a sua remuneração e participa com 50% nos custos dessa formação.

Contra o desrespeito

Quanto ao facto de os professores queixosos o terem acusado de maus tratos em plena reunião, alegando que os angolanos não sabem nada e que deviam aprender com os estrangeiros, o reitor José Semedo disse que nunca fez tal afirmação e que “seria ‘virar o fuzil’ contra o meu próprio peito, pois, sou angolano e amo o meu país”.

“Apenas temos e exigimos que o professor da UGS deve ser competente, profissional e comprometido com o nosso projecto pedagógico, na base dos princípios filosóficos, políticos, éticos, morais, cívicos e patrióticos de que somos portadores, promotores e defensores”, sublinhou.

Por outro lado, defende que deve-se cultivar o espírito de humildade e de superação permanente, cumprindo a máxima de que nunca sabemos tudo e que todos temos algo para aprender e para ensinar, ao longo de toda a vida, uns com os outros.

Tal como nos fizeram saber os professores que denunciaram as injustiças de que se dizem vitimas, o medo de perder o emprego está instaurado naquele meio e, por isso, muitos deles preferem não reclamar.

Sobre isto, José Semedo disse que num país democrático e de direito “quem tem denúncias a fazer e não as faz aos seus órgãos representativos, preferindo, ao invés disso, ir fazê-las nos jornais e encobertado pelo anonimato, não está a dizer a verdade, ou não tem dignidade para ser um estudante ou um professor universitário”.

Quanto ao facto de ser posta em questão a formação de quem dirige a Faculdade de Ciências Económicas e Empresariais, o reitor começou por confirmar que é dirigida pelo Prof. Francisco Tavares, português, continuou dizendo que ele é licenciado em Ciências da Comunicação e da Cultura, mestre em Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação e Doutorando em Gestão, na especialidade de Marketing.

Nesta senda, tocou-se também na questão do professor Édio Martins, que o reitor assegurou que aquele professor apresentou, de acordo com o seu processo individual, em posse da Universidade, documentos atestando que é Licenciado em Geografia e Mestre em Geografia Humana e Planeamento Regional e Local.
 
Angolanos dificilmente aceitam cargos de direcção

A Universidade Gregório Semedo, segundo aquele dirigente, terminou o ano lectivo 2013 com um total de 183 professores, sendo 146 nacionais e 37 estrangeiros. Dentre os nacionais, acrescentou, 135 trabalham em regime de colaboração e 11 em regime de exclusividade, enquanto que, dentre os estrangeiros, 21 em regime de colaboração e 16 trabalham em regime de exclusividade.

Actualmente, “existem muitas dificuldades em encontrar angolanos com Mestrado e Doutoramento interessados e disponíveis a abraçar a carreira docente, principalmente, em regime de tempo integral. Mesmo quando contratados em regime de exclusividade, é muito difícil aceitarem o exercício de cargos de direcção ou mesmo de chefias intermédias”, disse José Semedo.

O responsável enfatizou que têm incentivado alguns dos nossos licenciados e investido nos que se declaram interessados e disponíveis com bolsas de estudo internas e externas, para que a médio prazo possam contar com eles no quadro de pessoal em regime de exclusividade.

Por enquanto, tendo em conta a estrutura orgânica da universidade (que comporta 4 faculdades), encontram-se a exercer cargos de direcção dois angolanos: Prof. Dr. José António Lopes Semedo (o reitor da UGS) e a Prof. Dra. Maria Aline Silva Gomes, da Faculdade de Engenharia e Novas Tecnologias.

‘Temos debilidades administrativas’

Chamado também a falar sobre as queixas de alguns estudantes da UGS sobre a desorganização administrativa que se tem registado naquela unidade escolar, e que têm sido denunciadas também na imprensa, José Semedo disse que quem pensa que existe desorganização administrativa “não quer reconhecer os esforços feitos pela UGS desde a sua criação”.

O reitor acredita que deve haver uma confusão entre desorganização administrativa e “algumas debilidades administrativas que, ainda, possuímos – reconheça-se, honestamente – principalmente, nos Serviços Académicos. Não sei se haverá alguma universidade do país que esteja livre dessas críticas, já que debatem-se, ainda, com certos problemas no domínio dos recursos tecnológicos, financeiros e humanos”, elucidou.

Para finalizar, José Semedo disse que alguns problemas que são levados aos jornais privados de- correm da insuficiente preparação de alguns estudantes na formulação dos seus pedidos ou – pior do que isso – de goradas tentativas e manobras, com objectivos pouco correctos, “que nos obrigam a ser muito cautelosos e zelosos no tratamento das questões, despendendo, assim, mais tempo do que seria o normal”.