Luanda - O dia do planeta Terra é comemorado não apenas para repensar a relação do Homem com a natureza, mas, acima de tudo, para alertar os governos para a necessidade de produção de políticas vigilantes face aos riscos e vulnerabilidade sócio-ambientais decorrentes das alterações climáticas. Os países em desenvolvimento como Angola são considerados por vária literatura científica como os mais vulneráveis por falta de capacidades de adaptação e resiliência face aos eventos climáticos extremos decorrentes das alterações climáticas cujos impactes são notórios na economia, no património, na saúde e nas liberdades humanas.

Fonte: Rede Terra


É muito preocupante em Angola a ausência de políticas integradas e, sobretudo, da aceitação do risco ambiental como instrumento processual de tomada de decisão na gestão de políticas públicas num quadro em que os eventos climáticos extremos decorrentes das alterações climáticas desafiam os esforços de desenvolvimento de muitas sociedades humanas.

De acordo com a classificação de sustentabilidade de SACHS (1993), Angola tem um grande défice em:

 

a) Sustentabilidade social. É notória a segregação sócio-espacial, sobretudo, em áreas urbanas e a exclusão da grande maioria às estruturas de oportunidades e serviços bem como a falta de equidade na distribuição da renda num quadro em que a pobreza é considerada, hoje, como um grande indicador de vulnerabilidade face à ocorrência de eventos climáticos extremos. O défice do direito à informação e participação constantes do princípio 10 da Declaração do Rio (92) e da al. h) do artigo 5o da Lei de Bases do Ambiente têm acelerado o uso inadequado dos solos.

 

b) Sustentabilidade económica. Não obstante os últimos registos do crescimento económico a forte dependência ao petróleo tornou vulnerável a economia de Angola que pouco ou nada investe na agricultura de que depende a grande maioria. Os parcos investimentos nos sectores de educação e saúde justificam o quadro actual de capacidades técnicas, cientificas e institucionais que pouco ou nada respondem ao que é considerado neste século o maior desafio da Humanidade. A estiagem que afectou mais de 10 províncias provou que o governo angolano não está preparado para responder aos eventos climáticos extremos.

c) Sustentabilidade ecológica. Não obstante a produção de alguma legislação para a gestão sustentável, a zona costeira de Luanda, tornou-se, na verdade, num campo de enormes conflitos de vária natureza. A segregação espacial é evidente nessa área, considerada, cientificamente, como zona de elevado estresse ambiental e bastante sensível aos choques climáticos. A excessiva pressão antrópica marcada por obras de engenharia que destruíram as zonas húmidas cujas funções ecológicas são de extrema importância e as construções desordenadas em áreas de risco descaracterizaram a sua paisagem com consequências para os seus ecossistemas cujos nexos de sustentabilidade e limites de resiliência se estimam já ultrapassados. Muitas Resoluções que determinam a adesão de Angola à determinados protocolos internacionais não foram publicados em Diário da República: a Convenção sobre a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais em África, a Convenção sobre as Zonas Húmidas de importância internacional, a Convenção sobre a Protecção e Valorização do Meio Marinho da Região da África do Oeste e do Centro e tantos outros. O Corpo de Agentes de Fiscalização Comunitários não foi criado em conformidade com o disposto no artigo 32o da Lei de Bases do Ambiente.

d)Sustentabilidade espacial. Em Angola a excessiva concentração e assentamentos humanos e de actividades económicas em meios urbanos empobreceu o meio rural. Existem desigualdades territoriais e disfunções humanas profundas em Angola.

e) Sustentabilidade cultural. Impôs-se um modelo de desenvolvimento que, claramente, não respeita as especificidades culturais nem as particularidades de cada ecossistema. Não existe diálogo entre as práticas tradicionais e da modernidade violando principio 22 da Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento. As comunidades que vivem da pesca são afastadas e forçadas a outras práticas não tradicionais. Não há dúvidas que determinadas formas de desenvolvimento se não geram, ampliam os riscos e vulnerabilidade sócio-ambientais. Volvidos 10 anos desde a publicação da Lei de Terras, as terras rurais comunitárias protegidas pelo costume continuam sem o reconhecimento do Estado angolano pela titulação nos termos do no 2 do art. 37o da lei 9/04 sendo esbulhadas por terceiros. Essas terras, repositório do património histórico-cultural de Angola, foram descaracterizadas desde a época colonial aos tempos actuais pondo em causa a sua sustentabilidade. A destruição de referentes históricos é uma realidade em Angola.

 

Em sede da sustentabilidade o problema que se coloca, actualmente, prende-se com a forma como o Homem poderá antecipar-se, lidar e recuperar-se dos impactes dos eventos climáticos extremos decorrentes das alterações climáticas. Está provado que o risco é um processo e que nenhum sistema natural é, de todo, estável. É importante que se crie uma sociedade resiliente.

O planeta Terra precisa de ser salvo, mas a sua sustentabilidade não se faz com políticas que ponham em causa a participação de todos em processos de formação e tomada de decisões públicas. O quinto relatório do IPCC (2014) confirmou o Homem como o principal agente das alterações climáticas. Portanto, cabe ao Homem cuidar do planeta Terra para uma vida cada vez mais saudável.

Luanda, aos 21 de Abril de 2014