Lisboa - O magistrado português Carlos Alexandre indeferiu o pedido de instrução criminal, solicitado por Rafael Marques, para continuação das investigações ao vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente, por suposto branqueamento de capitais

Fonte:Visao

O juiz Carlos Alexandre não aceitou o pedido de instrução criminal avançado pelo ativista e jornalista angolano Rafael Marques, que, através de uma acusação particular, elaborada e subscrita pelo seu advogado, Duarte Teives, pretendia prosseguir as investigações a um alegado crime de branqueamento de capitais, praticado em território português e atribuído, em coautoria material, ao vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, ao general Higino Carneiro, governador do Cuando Cubango, e à sociedade anónima Portmill, com supostas ligações a altos funcionários da Casa Militar de José Eduardo dos Santos.


Único magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminal, por quem têm passado os casos mais "quentes" da Justiça portuguesa (BPN, Duarte Lima, BPP, Monte Branco, Operação Furacão...), o juiz Carlos Alexandre fundamenta o seu indeferimento com o pressuposto de o ilícito em causa - branqueamento de capitais - não constar do elenco de crimes em que a lei penal permite a constituição de assistente, o estatuto de Rafael Marques no processo.

Pelo seu lado, o advogado Duarte Teives, no recurso da decisão, que interpôs na Relação de Lisboa, alega que Rafael Marques já fora admitido como assistente no processo em 13 de dezembro de 2012, altura em que o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), do Ministério Público (MP), averiguava, entre outras suspeitas, a da prática de alegados crimes de corrupção. O advogado de Rafael Marques coloca à consideração dos desembargadores a "imediata e mediata identidade entre os bens jurídicos dos crimes de corrupção e branqueamento", para a "realização de justiça".

Recorde-se que o arquivamento deste inquérito, pelo MP, em novembro passado, foi antecedido de grande controvérsia. Houve a polémica entrevista do ministro Rui Machete à Rádio Nacional de Angola, em que o governante declarou que recebera da procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, "informações genéricas", a partir das quais concluiu não haver nos chamados processos angolanos "nada substancialmente digno de relevo e que permita entender que alguma coisa estaria mal, para além do preenchimento de formulários e de coisas burocráticas". Joana Marques Vidal, porém, desmentiria Rui Machete, afirmando publicamente nunca ter prestado tais informações ao ministro dos Negócios Estrangeiros.

Depois, no Parlamento angolano, o Presidente José Eduardo dos Santos daria por terminada a "parceria" com Portugal, no auge da tensão política entre os dois países, com epicentro naqueles processos.

Por fim, no despacho de arquivamento da parte do inquérito que visava Manuel Vicente, Higino Carneiro e a Portmill, o titular do caso no DCIAP, o procurador Paulo Gonçalves, escreveu que esperava que "esta separação de processos venha contribuir para o desanuviar do clima de tensão diplomática que tem ensombrado com mal-entendidos a amizade entre os dois povos irmãos, permitindo, conforme decorre dos requerimentos apresentados [pela defesa do vice-Presidente de Angola], a realização de encontros e cimeiras sem estigmas infundados, numa reciprocidade de 'bom senso'". Esta frase levou a que Joana Marques Vidal, por proposta de Amadeu Guerra, diretor do DCIAP, instaurasse um inquérito disciplinar ao procurador Paulo Gonçalves, cujo desfecho se desconhece.