Luanda - Está a gerar polémica, dentro do sector, a decisão emanada pelo Ministério da Pescas relativa ao concurso público para contratação da construção e fornecimento de um navio de investigação científica de 65 metros, o Baía Farta.

Fonte: Club-k.net


Todo o processo do concurso mostra-se muito nebuloso e com evidentes contornos de favorecimento da entidade vencedora, a DAMEN SHIPYARDS, a mesma empresa que já tinha fornecido ao Ministério os barcos de fiscalização lançados ao mar no final do passado mês de Abril.


A polémica resulta da decisão de adjudicação do Ministério das Pescas a esta empresa holandesa, a construção de um navio de investigação científica denominado Baía Farta, no montante total de 85 milhões de USD, quando a generalidade das propostas submetidas a concurso eram de cerca de 64 milhões de USD, do qual se conclui que o Ministério preferiu gastar mais 21 milhões de USD do erário público para assegurar o contrato à empresa Holandesa.


Recorda-se que já tinha sido lançado em Setembro de 2013 um concurso idêntico para aquisição deste navio por parte do Ministério das Pescas, onde esta mesma empresa DAMEN SHIPYARDS terá concorrido e apresentado uma proposta de 59 Milhões de USD, no entanto, o concurso acabou por ser cancelado, por irregularidades processuais.


Apenas 3 meses depois, no final de 2013, o Ministério das Pescas lança um novo concurso para a construção e fornecimento deste mesmo navio de investigação científica, o Baía Farta, no qual a empresa holandesa se apresentou mais uma vez a concurso, mas desta vez com um preço de 85 Milhões de USD, ou seja, um valor 30% acima daquele que 3 meses antes tinha apresentado para fornecimento do mesmo navio.

Estaleiros Espanhóis Marginalizados

Ao Concurso Público Internacional, foram entregues quatro propostas de estaleiros estrangeiros, todas elas aceites pelo Ministério, num processo que decorreu de acordo com os trâmites habituais destes tipo de concursos, dirigido pela directora do Gabinete de Estudos, Planeamento e Estatística do Ministério, familiar e pessoa próxima da titular da pasta.


Das propostas aceites, uma era da empresa holandesa e as restantes três eram de estaleiros espanhóis, nomeadamente os Astilleros ÁRMON (63,4 Milhões USD), Astilleros ZAMACONA (63,5 Milhões USD) e Astilleros FREIRE (67 Milhões USD) o que fazia crer que a decisão final iria recair sobre um dos estaleiros do reino da Espanha, visto ser abismal a diferença de preços para com a proposta da holandesa DAMEN SHIPYARDS.


Segundo apuramos junto de fonte próxima ao processo, a escolha do Ministério pela empresa holandesa caiu mal junto do sector da construção naval espanhola, uma vez que este reino até é uma das maiores potências pesqueiras do mundo, detentora vasto conhecimento no domínio das pescas e estes estaleiros são conceituados construtores navais, com larga experiência internacional e que apresentaram propostas muito mais competitivas.


Segundo fonte do nosso jornal, a justificação de tal decisão teve fundamentos meramente políticos, até porque o caderno de encargos do concurso era bastante exigente e todos os concorrentes apresentaram propostas para navios muito similares, em certos aspectos praticamente iguais, uma vez que os requerimentos do Ministério eram muito restritos.

Justificação da compra do navio de investigação científica.

Um navio de investigação científica é uma unidade naval construída especificamente para acções de natureza científica a realizar no mar. São barcos tecnologicamente muito avançados, dotados de diversos equipamentos para recolha de dados científicos e amostras que posteriormente são analisados nos laboratórios existentes a bordo do próprio navio. No sector das pescas estes navios têm a missão de estudar e controlar as quantidades de cada espécie, analisar a sua migração e reprodução, com vista à exploração sustentável dos recursos pesqueiros.


A decisão do Ministério das Pescas em avançar para a compra de um navio desta natureza, teve a ver com essa necessidade de se recolher mais informações sobre a riqueza dos mares de Angola, e a principal orientação era a de adquirir uma unidade similar àquela que a Namíbia comprou recentemente com a mesma finalidade. O navio Namibiano RV MARIBILIS, de 62 metros de comprimento, um dos mais avançados do mundo foi adquirido no verão de 2012 ao estaleiro finlandês da STX FINLAND e custou na altura 35 Milhões de Euros, ou seja aproximadamente 48 Milhões de USD.

Outros Navios Similares no Mundo

São vários os países que no passado recente têm adquirido navios de investigação pesqueira de elevado nível tecnológico, dos quais se destaca por exemplo o navio irlandês CELTIC EXPLORER de 65 metros, construído pela DAMEN SHIPYARDS por 38 Milhões de USD e praticamente idêntico a este navio que o Ministério das Pescas vai adquirir agora.


O Reino da Espanha está muito bem dotado de navios de investigação (tem um total de 12 navios), dos quais se destaca a sua mais recente aquisição, o sofisticadíssimo SARMIENTO DE GAMBOA, um navio de 70,50 metros construído nos estaleiros FREIRE (um dos concorrentes ao navio angolano), entregue em 2006 e que na altura custou 26 Milhões de euros, o equivalente a 35 Milhões de USD.


Este mesmo estaleiro iniciou-se na construção de navios de investigação em 1982, com o fornecimento do CORNIDE DE SAAVEDRA, um navio oceanográfico de 67 metros de comprimento que está ao serviço do Instituto Espanhol de Oceanografia, tendo neste passado mais recente construído navios de investigação para o Qatar e Reino Unido.


Igualmente, os EUA possuem o BELL M SHIMADA, provavelmente o navio de investigação mais avançado e sofisticado da actualidade, entregue em 2011 ao NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration), construído nos estaleiros americanos da Halter Marine Inc, por 55 Milhões de USD.

Passado Negro da DAMEN SHIPYARDS em Angola

Certamente os mais jovens não estarão recordados, mas é bom que nos lembremos de quem é esta empresa holandesa DAMEN SHIPYARDS cujos antecedentes de vigarices já são antigos no nosso país, não fosse esta empresa conhecida por liderar os top´s internacionais de empresas que falham dos testes anticorrupção e de falta de transparência.


Nos idos anos 80, no reinado do então Ministro dos Transportes e Comunicações, Bernardo de Sousa, esta empresa foi tema de capa de diversos jornais, por motivo de práticas de corrupção num negócio que envolvia o fornecimento de ferryboats, rebocadores e outros barcos, onde se comprovou que os mesmos estavam a ser fornecidos à República de Angola ao dobro do seu preço.


Dessa investigação, resultou a prova de que esta DAMEN SHIPYARDS procedeu à sobrefacturação dos barcos em conluio com a direcção da Cabotang, na altura presidida pelo mais velho Zito Van-Dúnem, da qual resultou a ordem de prisão a todos os directores da referida empresa estatal.


Este episódio afastou a empresa holandesa do mercado angolano durantes muitos anos, mas agora, uma vez feita a travessia do deserto e uma vez que poucos já se recordam do que se passou nos idos anos 80, voltou à carga no nosso país, garantindo contratos milionários através de esquemas pouco ortodoxos e muito nebulosos.


Restará saber se a história não se repetirá e estes contratos, assinados em 2014, não voltarão a ser tema das capas dos jornais pelos piores motivos.