Luanda - O Secretario-geral da UNITA, Victorino Nhany concedeu esta quinta feira uma conferência de imprensa sobre o Recuo do Processo democrático, cujo texto lido aos jornalistas segue na integra.

 Prezados Companheiros
Caros Jornalistas

Queiram, em primeiro lugar, aceitar as nossas mais vivas saudações patrióticas.

Formulamos convite aos senhores jornalistas para passarmos o nosso ponto de vista quanto ao estado do processo democrático assumido em acordos de Bicesse em 30 de Maio de 1991, fruto de muito sangue vertido, e que feita a radiografia, notamos haver um gradual recuo nesse processo.
Para consubstanciarmos a nossa avaliação, convidamos os senhores jornalistas a sobrevoarmos em volta de 6 pilares da democracia:

I. Realização de Eleições livres, Justas, Transparentes e Periódicas
A história das 3 eleições já realizadas, dita-nos que foram todas elas fraudulentas.

Eleições livres

Existem diversos elementos políticos que caracterizam uma democracia, tais como o respeito aos direitos individuais, o império da lei e a tolerância às minorias. No entanto, se tivermos de buscar um elemento básico que difere os regimes democráticos dos regimes autoritários, esse elemento, certamente, será a prática de eleições livres. Realmente, nos lugares onde o poder político é disputado por meio de eleições livres, existe democracia.

Nos lugares onde isso não acontece, porque as eleições são teatros de Cartas marcadas onde partidos e presidentes são “eleitos” ou “reeleitos” “ad eternum” com mais de 90% dos votos, então não há democracia.

No nosso país, os eleitores que são funcionários, são intimidados tendo em conta a perca de emprego, enquanto nas comunidades os Sobas tomam conta da intimidação na base de meios ao seu alcance incluindo os psicológicos.

Portanto, em Angola nunca houve eleições livres.

Eleições Justas

Os partidos políticos em competição não têm partido na base de justeza de parâmetros.

Nas eleições de 2008 o MPLA obteve um crédito do BDA cerca de 43 milhões de dólares, enquanto os demais partidos não passavam daquilo que o OGE proporcionou.

O acesso à imprensa pública é abusivamente facilitado ao MPLA em detrimento de outros partidos concorrentes.
O MPLA utiliza meios do estado (viaturas, entre outros), enquanto os outros concorrentes se limitam ao que podem.

Portanto, em Angola nunca houve eleições justas.
Eleições Transparentes

São vários os factos que ditam nunca ter havido transparência nos três processos eleitorais já tidos.

A fraude em Angola tem sido processual iniciando mesmo pela legislação, passando pelo registo, evoluindo para a recolha de cartões, urnas fantasmas, envolvimento de estrangeiros, como foi com o caso de Chineses pertencentes à Polícia Política em 2012, tudo preparado por uma estrutura clandestina envolvendo centenas de pessoas, em todo o país, entre militares e civis, sob batuta directa do Gen Kopelipa.
Eleições periódicas

Nesta vertente, de 2008 para cá, tem havido cumprimento em matéria de periodicidade, apesar de que de 2002 a 2008 houve uma elasticidade de tempo que permitiu montar bem a fraude. O que peca são as Autarquias ensobradas por caprichos daqueles que pensam ser donos de Angola.

II. Observância do Principio das Liberdades Individuais e Colectivas.

Tal como nos referimos no Capitulo anterior, não havendo liberdade na escolha de dirigentes, muito menos pode haver liberdades individuais partindo mesmo da própria educação, passando pela saúde, entre outros.

Uma das provas de que as liberdades colectivas não existem, foi o que aconteceu no último fim-de-semana em que os jovens do Movimento Revolucionário que pretendiam manifestar-se, foram levados e abandonados no Gulungo Alto.


III. Princípios de observância das leis pelas Instituições do Estado


Em termos de conceitos, Lei é uma categoria filosófica que revela um carácter obrigatório e ela limita a acção dos homens.
Três exemplos são suficientes para ilustrarmos o não cumprimento das Leis pelas Instituições do Estado.

Artigo 2º - “ A República de Angola é um Estado democrático de direito que tem como fundamentos a soberania popular, o primado da Constituição e da Lei, a separação de poderes e interdependência de funções, a unidade nacional, o pluralismo de expressão e de organização politica e a democracia representativa e participativa”.

Artigo 47º: 1. “ É garantida a todos os cidadãos a liberdade de reunião e de manifestação pacífica e sem armas, sem necessidade de qualquer autorização e nos termos da Lei”.
Artigo 59º “ É proibida a pena de morte”.

IV. Sistema Multipartidário

A Sobrevivência de partidos políticos em Angola, depende muito da integridade intelectual e patriótica dos seus líderes.

As tentativas de enfraquecer a UNITA, tal como o fizeram com a FNLA, datam desde o surgimento da Organização. Até com o sistema de recolha de cartões tem-se promovido partidos políticos para agradarem o regime e ficar-se com a percepção nacional e internacional de que o sistema multipartidário funciona.

V. Transparência e Prestação de Contas

A partir da altura em que o sistema de separação de poderes ficou truncado, a fiscalização dos actos do governo pelos deputados ficou abolida, imagine-se como o erário público estará a ser gerido!

Voltaria a citar um político russo que dizia: “ os angolanos não vêm os benefícios dos rendimentos do petróleo tal como ninguém consegue ver as suas próprias orelhas”.

Para não cansarmos os estimados jornalistas, vejamos apenas dois exemplos.:

1. O do caso “Kangamba” em que transportou em caixas de sapatos, para França, cerca de 4 milhões de dólares norte-americanos para batota!
Como membro do Bureau político do MPLA, alguém teria ouvido alguma repreensão? Ou a impunidade nos leva a interpretar que duas grandezas iguais a uma 3ª são iguais entre si?

2.O caso do BESA

O BESA emprestou 5,7 mil milhões de dólares que representam um total de 80% da sua carteira de crédito, para investimentos a privados.
Quem são os donos do BESA?
- Banco Espirito Santo de Portugal com 56% de acções;
- Uma Empresa chamada Portnew do Gen. Kopelipa;
- Grupo Geni do Gen. Dino
- Álvaro Sobrinho (como pessoa singular)
Parte dos 5,7 mil milhões de dólares foi utilizada no património imobiliário em Angola, Portugal e finalidades inconfessas. Porém, alega-se não haver informação quanto aos beneficiários. No entanto, informações que circulam ditam que a origem do buraco foram os empréstimos generosamente distribuídos a conhecidas figuras do regime angolano, dirigentes, portanto. Cobrados, dizem que uns não querem assumir os compromissos e outros dizem: pensamos que se tratasse de oferta do nosso glorioso MPLA! Vejam só, um dirigente a receber oferta de 10 milhões de dólares quando cidadãos morrem porque não conseguem 100 Kz para aquisitarem aspirina!

Ainda assim dizem que são partidos de Esquerda?

Em meados do ano 2013 o senhor José Eduardo dos Santos, no quadro do OGE, solicitou ao Parlamento a concepção de um empréstimo no quadro do Plano Nacional sem especificar o verdadeiro objectivo.

Através da Lei nº 13/13 de 31 de Dezembro, ao abrigo do Artº 6º, o Parlamento autoriza o empréstimo até um limite de 2.4 mil milhões de dólares.

No mesmo dia que a Lei é publicada, JES autoriza o Ministro das Finanças a dar uma garantia de empréstimo ao BESA de 5,7 mil milhões de dólares através de um Despacho interno nunca publicado!

Perante esta situação, algumas perguntas se colocam:
a) Se a divida é privada porque razão é paga pelo Estado? E se o dinheiro foi investido no património imobiliário, porquê não vendem tais casas?
b) Se o Parlamento autorizou o Presidente 2.4 mil milhões de dólares, por que razão terá extravasado?
c) O facto de JES ter desrespeitado os deputados, significará que o Parlamento se mantém refém do titular do poder executivo?
d) O forte interesse de JES no assunto não levará os angolanos a concluírem que ele conhece os verdadeiros devedores ou será que o verdadeiro titular do BESA é o senhor JES?
e) Por que razão o Banco não forneceu a lista real de devedores? Para não serem descobertas carecas?

VI. Participação do cidadão na Vida Pública

O exercício de cidadania não é mais senão o envolvimento de cada cidadão em busca do bem comum.
Os serviços públicos dependem de um envolvimento directo dos cidadãos para serem mais bem realizados, efectivos e com economia de recursos. O primeiro responsável pelo bem público é o cidadão, que apenas cede uma parte do seu poder ao Estado. As pessoas têm que acompanhar os parlamentares a quem delegaram o poder para a defesa de seus interesses. Para tal, têm de escutar e acompanhar os debates na televisão, na Rádio, nos Jornais, em Rádios Comunitários, que não existem, para melhor opinarem, discutirem e levarem suas opiniões aos mesmos parlamentares.

A política tem a ver com diálogo, negociação e intermediação de interesses. Em Angola é preciso criar canais para que essa aproximação apareça. Os Conselhos de políticas públicas são boas oportunidades de participação do cidadão, dá até para definir a alocação de recursos. A Internet é um fórum de participação discutindo os problemas e ouros espaços para identificação de problemas comuns e procurar soluções.

Praticar política e cidadania, que são praticamente sinónimos, gera bem-estar. A pessoa se sente integrada à sua comunidade, reconhece mais o outro. Quando ela começa a participar nesse tipo de associação, tende até a ser mais activa no trabalho ou estudo. Tende a ser mais sensível e aberta ao diálogo. São espaços de formação pessoal, profissional e cívica. Em Angola há desses espaços? Não. Esse papel é um conjunto de acções importantes de cidadania.

O Cidadão deve participar directamente da produção de bens e serviços públicos, desde ajudar a manter uma praça próxima à sua casa e informar os órgãos competentes sobre erros ou defeitos. Outra forma de engajamento dos cidadãos é por organizações da sociedade civil. Ajudar através de medidas educativas a ter as ruas e estradas limpas evitando-se a poluição do meio ambiente, ajudar uma creche, um grupo a limpar uma praia, dar sangue, entre outros.

Por meio de associações, os cidadãos podem organizar-se e ser parceiros dos políticos e não um partido politico criar ONGs para servirem, dum modo tácito, interesses seus. Isto tem nome: chama-se politicagem. A cidadania tem que se aproximar da política e vice-versa, para que ambas produzam juntos.

Caros Companheiros
Prezados Jornalistas

Se analisarmos milimetricamente aquilo que acontece no nosso País e fizermos uma colagem aos Pilares da democracia, concluiremos que Angola está a recuar cada ano que passa.

Tudo isso porque se o Presidente que devia defender a Constituição ofende a mesma Constituição; se a democracia que devia produzir alternância não permite alternância; se a vontade do povo que é soberana, é substituída pela vontade do Presidente que defrauda o povo; se ainda assim, o povo defraudado continua a pautar a sua conduta pelas regras democráticas nos termos da Constituição que o próprio Presidente outorgou, então não tenhamos dúvidas que isso é um grande recuo no capítulo da Democracia cujo culpado é o senhor Presidente da República.

Foi nessa base que a 11 de Março de 2013 remetemos uma Queixa – Crime ao Gabinete do senhor Procurador Geral da República, contra o cidadão José Eduardo dos Santos.

Perante esta situação toda, em defesa das Conquistas democráticas, fazemos apelo aos intelectuais que são a consciência da sociedade, a tomarem dianteira para a inversão das coisas preparando, agora, todo o Caminho que produza um processo democrático transparente.

A UNITA, analisará toda essa situação na IV Reunião da Comissão Politica prevista para o próximo mês, da qual sairá com um plano virado para tal fim.

Luanda, aos 31 de Julho de 2014

O Secretariado Geral do Partido
Muito obrigado