Luanda - A semana passada, finalmente, visitei em Washington o Memorial de Martin Luther King, Jr.

Fonte: Morrodamainga

Foi inaugurado por Barack Obama em Outubro de 2011.

A data inicialmente programada para esta inauguração era 28 de Agosto desse ano, numa altura em que também me encontrava nos States.

[Embora não seja o primeiro memorial a um cidadão afro-americano em Washington, D.C., este é o primeiro a ser erguido no National Mall e também um dos quatro únicos que não homenageiam um presidente americano.]

Devido às já habituais complicações meteorológicas, com a natureza a mandar forte e feio na grande potência, o acto teve de ser adiado para cerca de dois meses depois, mas oficialmente a data de inauguração ficou mesmo registada como sendo o 28 de Agosto de 2011.

Ponto final.

Em abono da verdade, diga-se de passagem, os Estados Unidos só obedecem mesmo aos caprichos cada vez mais devastadores da mãe madrasta natureza.

De facto, a meteorologia tem sido implacável nas doses de “mau humor” que tem distribuído por aquelas bandas, como se estivesse a tentar mandar uma mensagem, que os sobrinhos do Tio Sam continuam a não querer perceber, apesar de algumas evidências que as relacionam com as consequências dos abusos ecológicos que são cometidos nos States.

O 28 de Agosto é uma data da maior importância histórica para a luta dos direitos civis dos negros norte-americanos.

Foi nesse dia em 1963 que MLK e os seus companheiros organizaram a famosa “Marcha sobre Washington por Trabalho e Liberdade” que mobilizou mais 250 mil participantes, provenientes dos quatro cantos de uma América intolerante e violenta, então marcada a ferro e fogo pelo racismo branco, que viria, poucos anos depois, a ceifar a vida ao próprio Luther King.

Foi nesse dia que MLK fez o seu mais conhecido discurso, o “I Have a Dream”.

Premonitório Luther King começou a sonhar com as seguintes palavras:

“Eu estou contente em unir-me com vocês no dia que entrará para a história como a maior demonstração pela liberdade na história de nossa nação”.

Terminou dizendo, nomeadamente:

“Eu tenho um sonho que um dia nas colinas vermelhas da Geórgia os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos desdentes dos donos de escravos poderão sentar-se juntos à mesa da fraternidade.

Eu tenho um sonho que um dia, até mesmo no estado de Mississippi, um estado que transpira com o calor da injustiça, que transpira com o calor de opressão, será transformado em um oásis de liberdade e justiça.

Eu tenho um sonho que as minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver numa nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu carácter.

Eu tenho um sonho hoje!”

Curiosamente, durante a visita efectuada ao Memorial reparei que não havia no local nenhuma referência mais explícita às suas sonhadoras e proféticas palavras.

Confesso, que estava a espera de ver, logo a entrada do Memorial, a famosa frase do sonho.

Será, porque já não há mais necessidade de sonhar?

Não creio, porque efectivamente o sonho de King ainda tem muito caminho a marchar até se transformar totalmente em realidade para a maior parte dos negros/afro-americanos que continuam a frequentar as estatísticas mais problemáticas da sociedade dos USA, a começar pelo crime e a terminar no mau aproveitamento escolar, sem esquecer a violência doméstica, o consumo de álcool e drogas e a prostituição.

Curiosamente, nesta altura os Estados Unidos voltaram a estar mergulhados numa violenta onda de tensão racial, depois de no passado sábado algures no Estado do Missouri que está mesmo ao lado do infame Mississipi referido por Luther King, um jovem negro desarmado, de nome Michael Brown, ter sido baleado várias vezes até a morte por um policia branco.

[ "Estou cansado de ser maltratado por causa da minha cor de pele. Estou cansado da brutalidade com que a polícia nos trata", lamentou um dos manifestantes, de 18 anos, citado pela Reuters. "Vou continuar aqui, noite após noite, até chegarmos à justiça", acrescentou.]

 

Os confrontos em Ferguson têm sido particularmente violentos traduzidos numa onda de vandalismo que já obrigou o Exército a sair a rua para tentar restabelecer a ordem civil.

Mais de meio século depois de Luther King ter sonhado com uma América mais justa para todos, os confrontos de Ferguson, que ameaçam, como sempre, espalhar-se, a outras cidades pelo efeito dominó, não são, certamente, o melhor postal que Obama gostaria de oferecer ao mundo a falar desta nova América que tem na sua própria pessoa a maior e mais visível expressão do longo e pedregoso caminho percorrido pelos negros na luta pela igualdade de direitos.

 NA-Texto publicado no “Semanário Angolense” (16/08/14)

 

Notas soltas com sabor a turismo

Foi um domingo, sem dúvida diferente, o último passado na Times Square de New York City (NYC), onde numa rigorosa passagem em trânsito, fiquei algumas horas a espera do avião que iria apanhar na vizinha Newark, depois de ter feito uma fantástica e madrugadora viagem de comboio desde Washington num percurso de cerca de três horas.

Tão (pouco) rigorosa foi, entretanto, a minha escala pela “Big Apple”, que acabei por perder o avião, depois de ter trocado um comboio na Penn Station, o que como consequência obrigou-me a fazer uma viagem de 45 minutos até Stamford em Connecticut, acho que no sentido contrário daquele que devia ter tomado, se entrasse no trem certo, rumo ao International Airport de Newark.

Ainda perguntei a cobradora do Armtrak, uma simpática patrícia nossa, se era possível em Stamford apanhar um taxi para tentar chegar ao aeroporto de  Newark a tempo.

A resposta, se ela não levasse muito a sério a sua função, teria sido, certamente, uma sonora gargalhada.

Já não tinha qualquer hipótese.

Tinha perdido o avião da TAP rumo a Lisboa, o que me iria custar uma multa de trezentos dólares mais cem para dormir nos arredores do aeroporto, para no dia seguinte, esta segunda-feira portanto, conseguir viajar.

Como compensação acabei por conhecer o Juan Bravo, um taxista equatoriano, que, antes de me deixar no aeroporto, me levou a visitar em Elisabeth um dos maiores shoppings/Outlet do mundo, onde se pode grifar a preço de saldo, onde o sonho vira realidade, sem precisarmos de ser aldrabados pelos amigos chineses com as suas imitações baratas e de péssima qualidade.

Mas eu só queria mesmo comprar uns discos de jazz do Jeff Lorber o que consegui a um preço de sonho no Fye.

Vir a NYC e não passar por este “centro do mundo” que é a Times Square, é muito pior do que ir a Roma e não ver o Dikota Chico.

O nosso “naked cowboy”, aparentemente com as mesmas cuecas, lá estava no seu habitual local de trabalho.

Não sei há quantos anos este rapaz bumba com os turistas na Times Square, ganhando a sua vida tirando fotografias pelado, mas eu já o conheço destas andanças desde que visitei pela segunda vez NYC.

Já lá vão alguns anos.

Com a assinatura de milhares animados de dominicanos que vivem em NYC, este domingo aconteceu uma espécie de carnaval em Manhattan, do tipo parada, mais exactamente na 6ª Av., também conhecida pela Avenida das Américas.

Na República Dominicana do Juan Luís Guerra, note-se, “quem no baila no prieta”.

Em Nova Yorque também é assim quando eles se juntam fazendo parar tudo e todos, com a autorização, claro, do Mayor, que depois do Mike Bloomberg, agora é o democrata Bill de Blásio eleito há um ano.

É por esta e por muitas outras, que Nova Yorque é mesmo a cidade mãe de todas as cidades do mundo.

Aqui somos todos uns grandessíssimos  filhos da mãe.

Aqui ninguém quer saber quem é o father.

Somos todos brothers e depois de 11/10 também passamos a ser mais vigiados pela “camarização” da city.

Domingo em Times Square o homenageado foi o músico e activista cívico norte-americano Pete Segeer, num eco-festival simples como foi o próprio em vida, antes de nos deixar no inicio deste ano.

[O cantor e compositor Pete Seeger, considerado como uma das principais figuras de folk e também um activista dos Direitos Humanos, morreu aos 94 anos, em Nova Iorque.

Para Seeger, o folk tinha um sentido de comunidade e era uma forma de acção política.

Pete Seeger cantou para o movimento de defesa dos direitos civis nos Estados Unidos e contra a guerra do Vietname, apoiou a luta pelo ambiente, protestou contra campanhas belicistas e actuou no Memorial Lincoln no concerto inaugural do primeiro mandato de Barack Obama.

Foi ainda mentor de outros que se iniciaram no folk, como Bob Dylan, Don McLean e Bernice Johnson Reagon.

Bruce Springsteen cantou as suas canções em "We Shall Overcome: The Seeger Sessions" (2006) e com Woody Guthrie fez "This Land is Your Land (JN.PT)".]

A novidade é que a Times Square está em demoradas obras de requalificação, o que dificulta de algum modo a circulação de peões e viaturas nesta emblemática praça novayorquina de Manhattan.

Ao fundo a municipalidade colocou uma bancada vermelha para os turistas descansarem que tem a sua frente uma estátua negra onde se pode ver a figura de um homem de pé com um semblante bastante carregado.

Trata-se da estátua do Fhater Duffy (Father Francis Patrick Duffy/1871-1932), que  “vigiou” todos os meus movimentos enquanto lá estive.

É uma homenagem a um capelão militar canadiano que em finais do século 19 e no inicio do século passado viveu nesta zona de NYC.

O soldado-padre participou na Guerra entre os Estados Unidos e a Espanha (1898) e na 1ªGuerra Mundial.

Pelos vistos, o Fhater Duffy que morreu com o peito coberto de medalhas de honra rezava e ensinava a rezar tão bem, como combatia ferozmente o seus inimigos.

Se calhar, como era padre, depois confessava-se a si próprio e perdoava-se automaticamente por algum pecado cometido no exercício das suas funções.

Nunca percebi muito bem a função dos capelões militares.

Seria a equivalente a do Comissário Político nos “exércitos vermelhos”?

NA- Texto publicado  no semanário  ”O País/Revista Vida/Secos e Molhados” ( 15-08-14)