Luanda - A decisão anunciada pelo Presidente da República de “fazer cessar a acumulação do cargo do governador provincial com o de primeiro secretário do Comité Provincial do MPLA” pode pressupor para os menos atentos que este era o sistema que sempre vigorou em Luanda.

Fonte: Semanário Angolense

Ora pelo que se sabe, esta concentração de poderes só terá estado em vigor nos últimos dois anos, com a entrada em cena de Bento Bento, pois não nos lembramos de anteriormente se ter verificado uma tal situação.

Isto quer dizer que nos últimos anos a governação de Luanda só a título muito excepcional  foi feita a partir da Vila-Alice, sendo possivelmente o episódio que a semana passada chegou ao fim, um caso solitário na recente história da província mais emblemática/problemática de Angola.

A decisão de concentrar os poderes foi tomada igualmente por JES numa conjuntura em que o tonitruante Bento Bento (agora certamente mais calmo) estava em nítida ascensão no seio dos “camaradas”, pela sua musculada disponibilidade tornada pública em “controlar milimetricamente a oposição” e mesmo de ir até às ultimas consequências “quebrando-lhe o seu disco duro”, com os resultados que se conhecem.

São palavras e intenções que a memória do tempo ainda não conseguiu apagar e que em nosso entender ajudam a explicar a escolha de Bento Bento para mais uma “missão impossível” no Governo Provincial de Luanda, onde de facto os problemas e as soluções não conseguem dançar o tango ao mesmo ritmo, o que é visível na instabilidade institucional que tem caracterizado a sua gestão.

A transbordante e truculenta energia politica de Bento Bento, que num acesso de fidelidade politicamente pouco correcto chegou a tratar carinhosamente JES de “nosso fofucho”, foi pois encarada “lá em cima” como uma espécie de arma secreta/varinha mágica que Luanda estava a precisar para rapidamente se colocar a tal ordem no circo.

À falta de melhor explicação, esta parece-me ser uma das que mais terá entusiasmado JES, quando se decidiu convocar Bento Bento para a sua equipa, pensando que os problemas da província capital  poderiam ser resolvidos rapidamente com um destemido domador/adestrador de feras ou um decidido “rambo” no posto de comando.

Aliás, tenho para mim que os de “lá de cima” quando olham cá para baixo, estão sempre à procura de um “homem forte” muito especial que possa ser pau para toda a obra, ignorando a importância das instituições, da própria sociedade civil e dos cidadãos.

Na hora da despedida e do balanço preliminar,  a desilusão do Presidente não poderia ser maior ao confessar que “nesta província quem dirige tem de estar a frente dos acontecimentos. Tem de estar completamente disponível, ter grande capacidade e mesmo qualidades especiais para saber prever a situação da evolução, saber orientar os subordinados e saber tomar medidas pertinentes.”

Como é evidente, o primeiro responsável por esta decepção só pode ser o próprio autor da confissão, mas quem levou o atestado de incompetência para casa foi Bento Bento, onde vai ter de o pendurar numa das paredes mais intimas para o resto da vida, a sinalizar, possivelmente, um dos seus maiores insucessos da sua carreira, iniciada como delegado do governo na CUCA.

Se quiséssemos ser mais abrangentes nesta distribuição de atestados de incompetência, diríamos que houve efectivamente um recuo em toda a linha do aparelho do MPLA em Luanda, corporizado no todo poderoso Comité Provincial, restando apurar quais serão as consequências desta separação mais ou menos litigiosa com o “MPLA administrativo”, se me permitirem esta expressão.

Em principio e tendo em conta a sua capacidade de controlar os acontecimentos dentro e fora do seu partido, José Eduardo dos Santos saberá  esquivar-se  como sempre às fagulhas/ricochetes e evitar que o “fogo amigo” provoque outros estragos mais desagregadores na própria coesão do “Eme”.

Fica, entretanto, claro pelo balanço preliminar já feito por JES, que a “dinâmica” do MPLA de Luanda não foi capaz de ajudar a vencer o grande desafio que é “pôr a funcionar o aparelho da administração provincial e das administrações municipais, em pleno, para superarmos o atraso em que nos encontramos e ajustar o passo da governação ao crescimento da procura dos serviços públicos”.

Nesta última curva mais apertada do GPL que por pouco não provocava um despiste seguido de capotamento, a imagem do MPLA provincial acabou por ser a mais penalizada, mas em abono da verdade tudo o que se passou em termos de gestão corrente nos últimos dois anos, tem certamente uma outra explicação mais consistente com a realidade dos factos, que escapa ao que é visível ou ao que nos é dado a ver.

Estamos perfeitamente de acordo com JES quando afirmou que para Luanda “precisamos de um esforço acima da média para podermos atender as necessidades básicas de toda a sociedade, precisamos também de ordem e disciplina, em toda a província, para que cada um saiba o seu lugar e papel e possa dar a sua contribuição”.

O problema agora é descobrir o “caminho marítimo” para chegarmos até lá, sem necessidade de novos regressos ao ponto de partida como tem acontecido.

Todas as experiências feitas até agora com ou sem o MPLA pelo meio, falharam.