Luanda - O Sindicato Nacional dos Técnicos de Justiça e Administrativos da Procuradoria Geral da República (SINTEJAPGR) pode convocar uma greve na primeira semana de Outubro, por a entidade patronal não ter honrado os pontos constantes no caderno reivindicativo apresentado em Junho

Fonte: O País
A decisão saiu de uma reunião deste sindicato realizada no Sábado, 20, no anfiteatro do Instituto Nacional de Estudos Judiciários (INEJ), em Luanda, que contou com a participação dos filiados de Benguela, Bengo, Kuanza- Norte, Lunda-Norte, Huambo, Huíla, Luanda, Namibe e Uíge.

Durante o encontro, os participantes concluíram que depois de esgotados os prazos mínimos para a materialização dos entendimentos, agravado pela falta de informações ao Sindicato pela entidade empregadora, os próximos dias serão decisivos para uma paralisação geral em todo o país.

Na reunião orientada pelo secretário- geral, Roberto da Silva Bernardo, na qual participaram os secretários provinciais e/ou seus representantes, alegou-se não haver vontade da PGR em ver resolvida a reclamação apresentada pelo sindicato, numa altura em que o assunto já se arrasta há quase três meses.

Durante o encontro, que serviu para auscultar os filiados, os participantes tiveram os ânimos exaltados, alegando ser inadmissível que haja instituições de Justiça com mais dignidade do que as outras. “A PGR não tem sensibilidade de estimular os seus funcionários”, disse um dos participantes, que trabalha no Tribunal Provincial de Luanda.

Os participantes acusaram a direcção da Procuradoria Geral da República de minimizar os 19 pontos apresentados no caderno reivindicativo, referindo que a mesma está bem servida em termos salariais e regalias sociais, em detrimento dos funcionários que se dizem injustiçados e que alegam auferirem salários de miséria.

Segundo apurou O PAÍS, os intervenientes, maioritariamente técnicos de justiça e administrativos da PGR, disseram sentir-se desprezados pela entidade patronal, se comparados com o pessoal dos outros ramos da Justiça, em termos de condições salariais e laborais.

Um dos magistrados do Ministério Público (MP) que também esteve presente no encontro, revelou que há situações em que os funcionários da Procuradoria Geral da República ficam muito tempo nas paragens de táxi à espera do transporte, com os processos na mão, e alguns até de crime, correndo o risco de sofrerem assaltos.

No entender deste jurista, esta situação só acontece “porque não existem meios de transportes para apoiar os funcionários” durante as horas normais de expediente, acrescentando que o mesmo não sucede com outros sectores da Justiça, os quais evitou citar.

Para ele, a “dignidade de cada Procurador representa também a dignidade da própria Procuradoria Geral da República”, como instituição que zela pela justiça dos cidadãos e dos organismos públicos ou privados. “ Tem de haver dignidade para com as pessoas e não cinismo”, desabafou.

A greve, que se pretende, segundo foi acordado por unanimidade, deverá prolongar-se até que a entidade patronal satisfaça os pontos essenciais que estão no caderno reivindcativo, “ como forma de pressionar quem de direito para resolver o que lhe é devido”, disse um conhecido jurista.

Segundo soube este jornal, junto do sindicato, a comissão criada em obediência ao despacho nº0043/2014, de 18 de Junho, do Procurador Geral da República, João Maria de Sousa, e coordenada pelos procuradores gerais adjuntos da República, Manuel Domingos e Pulquéria Van-Dúnem, em resposta ao caderno reivindicativo, remeteu o assunto à entidade patronal, mas até ao momento “nenhuma palha foi movida”, dizem.

Exigências

Num rol de 19 pontos, o sindicato exige, entre outras situações, a aprovação de um regime jurídico da carreira de técnicos de Justiça, realização do concurso exclusivo de acesso e promoção dos técnicos de justiça e funcionários do regime geral.

Outra exigência também apresentada pelo representante dos trabalhadores é a aquisição de viaturas para as diligências e para o transporte do pessoal, já que não vem sendo possível pagar-se o subsídio de transporte. Recomendou-se também a abertura de um refeitório.

Os milhares de funcionários filiados neste Sindicato defenderam, através dos seus representantes, a elaboração anual de um programa de formação que abranja todos os funcionários dentro e fora do país, assim como para os que ingressem, passando a beneficiar de uma formação obrigatória para melhor desempenho das suas funções.

Quanto aos mais antigos funcionários, que a formação seja especializada, respeitando os objectivos preconizados pela Procuradoria Geral da República (PGR). Sobre o aumento salarial, este assunto foi retirado por não ser da competência da direcção da PGR.

No que concerne ao pagamento das diferenças dos subsídios de atavio e risco referentes ao ano de 2009 a 2011, este assunto foi remetido ao Procurador Geral da República para se pronunciar. No caderno consta também a criação de Serviços Sociais para atendimento dos funcionários aflitos com problemas de saúde, mortes e outros infortúnios.

Das reivindicações apresentadas à PGR, fazem ainda parte a institucionalização de um prémio ou estímulos para os trabalhadores mais destacados, criando para tal um fundo apropriado. Também defenderam a nomeação dos actuais chefes das secretarias judiciárias e das secções administrativas à luz da legislação vigente.

O documento remetido ao gabinete do Procurador Geral da República defende também a proibição da utilização de funcionários para substituírem os magistrados no exercício das suas funções.

Aumenta número de tribunais no país

O projecto de reforma judicial em curso no país poderá elevar o número de Tribunais em Angola de 18 provínciais para cerca de 60 tribunais de comarca. Quem admitiu é o coordenador da Comissão de Reforma da Justiça e do Direito, Raúl Araújo, quando falava esta Segunda-feira, 22, em Luanda, à margem do seminário de apresentação do referido documento.

Segundo o jurista, esta iniciativa irá permitir a descentralização administrativa e financeira dos tribunais, dando-lhes uma autonomia financeira própria.

Assim sendo, segundo disse Raúl Araújo, dará igualmente a possibilidade de elevar o número de Tribunais de Comarca ao nível dos Municípios, onde já estão identificadas carências neste domínio que o tem levado a morosidade na tramitação processual da população penal.

“Vamos aumentar substancialmente o número de tribunais que vão julgar em todo o país sobre todas as matérias, e os funcionários judiciais que actualmente dependem do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, passarão a depender do presidente do Tribunal da Comarca”, afirmou o magistrado judicial, acrescentando que, com esta nova Lei de Ampliação e Autonomia, os tribunais terão orçamento próprio, discutirão e apresentarão autonomamente os seus orçamentos aos órgãos competentes e serão os tribunais a gerir todo o processo financeiro, recrutamento de quadros e demissão.

A Lei sobre a Organização e Funcionamento dos Tribunais de Jurisdição Comum entrará em vigor em Março de 2015 e prevê a abolição dos tribunais municipais e os provinciais, para a criação dos tribunais de Comarca que terão competência genérica ou especializada.

Durante o debate que contou com a presença de magistrados judiciais, docentes, estudantes de Direito e convidados, o juiz fez saber que a referida Lei já foi aprovada, na generalidade, pela Assembleia Nacional.

Disse ainda que, a mesma Lei irá contemplar uma nova estrutura geográfica do país, agregando desta forma cinco regiões judiciais, sendo a região de Luanda a que irá congregar as províncias do Bengo e Kuanza- Norte, a região Norte que vai reunir as províncias de Cabinda, Uíge e Zaire, a região Centro que agrupa as províncias de Benguela, Bié, Cuanza-Sul e Huambo, a região Sul que vai ligar as províncias do Kuando Kubango, Cunene, Huila e Namibe, e por fim a região Leste com as províncias da Lundas Norte e Sul, Malanje e Moxico.

Futuras inovações

Ainda no decorrer do certame, que se realizou sob o lema “Por Um Novo Sistema Judiciário no Século XXI”, o juiz do Tribunal Constitucional apontou como principais inovações da reforma para a gestão dos tribunais, o aprofundamento da autonomia administrativa e financeira dos tribunais judiciais, o reforço da capacidade de gestão dos tribunais e a promoção da avaliação do desempenho funcional do sistema de justiça.

O responsável anunciou ainda que a comissão propôs também, como inovação, a criação do Conselho Nacional Judicial, um órgão de coordenação do sistema judicial, tendo como função acompanhar o desempenho funcional dos tribunais e demais órgãos do sistema de justiça, emitindo recomendações e conceitos sobre todas as matérias relacionadas com o desenvolvimento do sistema de justiça.

O referido órgão, segundo a fonte, será liderado pelo presidente do Tribunal Supremo, auxiliado pelos ministros da Justiça e dos Direitos Humanos, do Interior, pelo Procurador- Geral da Republica, pelo bastonário da Ordem dos Advogados de Angola e pelos presidentes dos Tribunais de Relação.

Nesta senda, Rui Araújo declarou que esta Lei vai definir as regras de organização e funcionamento das Secretarias quer na tramitação dos processos quer na organização dos arquivos a nível dos tribunais. Assim sendo, o juiz deixou claro que a Lei sobre a Organização das Secretarias dos Tribunais já está a ser preparada.