Luanda - Na minha e só mesmo minha humilde forma de observar as coisa neste país e com o conhecimento/dados que possuo, a “questão da raça” é, sem dúvida, aquela que mais apaixona a nossa opinião pública e publicada.

Fonte: O Pais

Não sei se isto é bom ou se é mau, mas que é um sintoma de qualquer coisa que pode não estar a funcionar muito bem, lá isto é.
Necessáriamente, a traduzir a realidade de uma coabitação social que pode não inspirar muitos cuidados, mas que também não nos deve deixar ressonar bem alto e tranquilamente, “através” chamado sono dos justos.


Quer se valorize mais ou menos o sintoma e apesar de Angola ser um país racialmente negro, não se pode ignorar que a “questão da raça” existe independentemente do que possa estar em causa, do próprio conceito e da perspectiva que se dá a abordagem.

Existe e nem sempre é tão pacífica quanto as aparências deixam entender.

Desse ponto de vista e em nome do pouco optimismo que me sobrou na minha reserva estratégica, continuo a pensar que não estamos a beira do abismo, nem pouco mais ou menos.

Contudo, adianto já, muito melhor hoje poderíamos e deveríamos estar, se as assimetrias sociais não fossem tão pronunciadas e não estivessem a ter o comportamento algo contraditório/errático que apresentam.

Isto por mais que as estatísticas oficiais e todos os restantes “xaropes” do mesmo grupo, nos tentem convencer do contrário, quando se fala da distribuição do rendimento nacional, com o seu cortejo de equívocos em torno da pobreza, que acaba por ser a mãe potencializadora de todos os conflitos.

Aqui e no resto do mundo, onde ainda se pensa que é possível resolver os problemas sociais ignorando a necessidade de se engordar muito menos a conta bancária pessoal, para se ganhar mais em matéria de estabilidade e paz social, desiderato para o qual o marketing institucional não está em condições de fornecer as respostas mais eficazes e sustentáveis.

Por vezes esta história do “nosso trungungu” faz-nos lembrar as pessoas que gostam de poupar nos medicamentos, para poderem gastar muito mais na compra da urna funerária e das flores para enfeitarem o último pedaço de terra a que têm direito.

Sinceramente não estou a ver outro assunto que mobilize tanto e tão rapidamente as pessoas para o debate, como é a “maka dos pretos, dos mulatos e dos brancos que nunca deixamos de estar com ela.”

Agora, do ponto de vista da objectividade, ainda é mais fácil de constatar esta tendência, com a entrada em força das redes sociais no nosso quotidiano e com a banda larga da Net a dar saltos de cavalo, enquanto não chega o satélite.

Nesta altura, note-se, as mesmas redes já são o principal barómetro para se avaliarem alguns impactos, sobretudo aqueles que são considerados mais complicados para a gestão dos interesses politico-partidários em jogo no tabuleiro angolano.

É cada vez maior a utilidade destas redes sociais, quer se goste delas ou não, pois elas representam um dinâmico espaço público de inegável valor até como ferramenta da governação.

Valor que se agrega facilmente a própria unidade nacional/coesão social, mas também como plataforma de partilha e diálogo entre as vários entidades/actores que se cruzam aos diferentes níveis da pirâmide que tem mais de um milhão de km2 e agora já conta com mais de 24 milhões de seres vivos.

O tema da raça voltou assim nos últimos dias a fazer parte do debate que vai acontecendo no espaço virtual, depois do sociólogo Paulo de Carvalho ter dado uma entrevista ao semanário que nos hospeda com esta coluna já lá vão mais de dois anos.

A entrevista terá sido motivada pelo recente lançamento em Luanda de um livro sobre o racismo de que o sociólogo é co-autor com mais três ou quatro acadêmicos de nacionalidade brasileira, moçambicana e portuguesa.

As minhas reflexões a volta deste assunto com que hoje decidi “molhar a seco” mais esta crónica, têm pois por pano de fundo este contexto e o intenso debate de que, na mais famosa e planetária rede social fui testemunha e participante ao mesmo tempo.

Sem aqui pretender contrariar ninguém, nem alimentar mais nenhuma polêmica, sinceramente não vejo que por si só a mestiçagem das raças com a perspectiva de se avançar numa determinada direcção mais homogénea, possa ter algum efeito mais benéfico sobre a solução dos inúmeros, imensos e complexos problemas que hoje a humanidade ainda tem para resolver, quando voltamos a estar a beira da guerra fria.

De facto não me parece que alguém seja diferente para melhor do que outro, pelo simples facto de ser o resultado de um desses cruzamentos, o que a confirmar-se seria a negação da própria raça humana.

Continuo a pensar que o mundo como está, com pessoas tão diferentes e tão iguais está muito bem feito e assim deve continuar até que eu me despeça dele.

Desejo antecipadamente que na minha futura e definitiva ausência não apareça por aqui alguém a querer vender-nos a porta de casa alguma poção mágica para ficarmos todos “musticios” e bem comportados, transformando assim a humanidade no melhor local do mundo para todos vivermos em paz e harmonia.

Lamentavelmente, esta humanidade não vai ser tão cedo este “paraíso”, mas para todos nós é bom e muito saudável que ela continue a ser o vibrante, contagiante e belo arco-íris que sempre foi, faça sol ou faça chuva.

O resto em matéria de “mestiçagens” como sempre aconteceu ao longo da história, acontecerá naturalmente sem qualquer tutela ou orientação mais estratégica.
Temos a certeza de que desta vez a virtude não estará no meio de nada, nem de nenhuma mistura, mas com cada um de nós enquanto titulares individuais da raça humana e membros vivos da tal de humanidade.