Huambo - Apesar de saber que a sua filha de apenas cinco anos possuía uma inteligência sem igual, nos mais diversos campos do saber, como todo e qualquer pai, preocupado com a formação do seu rebento, Frederico Vitungayala inscreveu-a numa escola do bairro, mas, durante as aulas, Pumo sentava-se, dando costas ao quadro e ao professor, insatisfeita por não ver nem ouvir novidade alguma

Fonte: O País
Crianca dotada.jpg - 56.79 KBDe acordo com a menina que responde pelo nome de Laurinda Capumo Vitungayala e nasceu a 11 de Março de 2009, no bairro Calilongue II, zona de São Pedro, no Huambo, tudo o que o professor falava ela já sabia, por isso achava que estava a perder tempo e decidiu falar com o pai para não voltar à sala de aulas.

“Eu lá não estava a aprender nada, tudo que o professor estava a ensinar eu já sabia, então ficava a brincar, a escrever no chão e não virava para o quadro”, disse Pumo, como é carinhosamente tratada por familiares e conhecidos.

A rapariga de cinco anos de idade esperava era ouvir mais informações sobre a história de Angola, África e do mundo inteiro, conhecimentos predominantes no seu leque de cultura geral, que não deixa de incluir outras disciplinas do campo científico.

Contactado o professor da chamada escola comunitária do bairro da Alemanha, Benjamin Adelino Miguel, de 22 anos, ele reconheceu que a menina era superdotada, pois, durante as sessões de aula, segundo conta, Laurinda Capumo Vitungayala não lhe prestava atenção.

“É uma garota que sabe muito, principalmente sobre história de Angola e África, incluindo as suas políticas”, declarou, despertando a sociedade em geral para um apoio urgente a uma criança que se pode tornar embaixadora angolana no campo do saber.

O professor recordou a primeira intervenção de Laurinda, quando alegou que, certa vez, no período de intervalo, a menina lhe perguntou se o que lhe cabia dizer sobre a pátria era apenas a conhecida frase «Angola é um país grande e belo», uma questão que deixou o docente bastante admirado, dada a idade da sua interlocutora.

“Não consegui responder-lhe nada e ainda não sabia que estava metido com uma menina que detinha mais conhecimentos do que eu”, desafogou, reconhecendo que se sentiu um pouco envergonhado e muito ultrapassado, quando a pequena Pumo começou a detalhar pormenores relacionados com o passado, bem como de ordem numérica sobre população, relevo e outros registos estatísticos, que o educador reconheceu não serem do seu domínio.

Benjamin Miguel revelou que a inclusão de Laurinda Capumo Vitungayala numa turma da 2ª Classe já foi fruto de uma avaliação diagnóstica feita pela classe docente do referido estabelecimento de ensino, para não atrasá-la, já que se lhe constatou avançado conhecimento.

“Mesmo assim, depois da convivência da menina com os professores, principalmente comigo, notou-se que a menina estava a perder tempo”, sublinhou, acrescentando que o director da escola já tinha segredado ao corpo docente da escola comunitária que, a julgar pela idade, a menina sabia mais do que todos da instituição.

O instrutor, que descreveu Laurinda Vitungayala como uma criança muito calculista, séria e sincera em tudo o que fazia, ao ponto de não aceitar sempre participar em brincadeiras comuns aos petizes, ficou triste com saída de Pumo da instituição.

Benjamin Miguel gostaria imenso que a família da pequena tivesse capacidade para viajar e residir com ela num país europeu como França, Inglaterra ou Itália, ou nos Estados Unidos da América (EUA), onde a criança poderia ter um acompanhamento mais eficaz.

Preocupado com as variadas reacções que a inteligência de Pumo pode causar no seio dos angolanos, o professor Benjamim aconselhou os compatriotas a não menosprezarem a situação, levantando cogitações que tenham a ver com anormalidade de saúde psíquica de Laurinda, como alegou ter ouvido em alguns cantos da Cidade Vida.

Enquanto a criança permanecer no país e se fizerem novas tentativas de inserção numa sala de aula, Benjamin Miguel gostaria que, a julgar pela bagagem da rapariga, não fosse numa categoria inferior à 7ª Classe.

Testemunhas infantis

Seu irmão de 12 anos de idade, Drácula Kalembe Vitungayala, frequenta a 7ª Classe e encontrou em Pumo a solução para todas as suas tarefas de casa.

“Desde que comecei a estudar a sétima só peço a minha irmãzinha para me resolver as tarefas da escola e ela faz tudo muito bem, até quando chego na turma, os professores me elogiam”, contou o primeiro filho de Frederico Vitungayala, que revelou já se ter tornado famoso, por ser irmão de uma criança superdotada de apenas cinco anos.

No princípio, o adolescente pensava que a irmã só tinha queda para assuntos ligados à história, geografia, política, mas espantou-se, quando um dia, ao apresentar-lhe preocupações referentes à Matemática, Física e Química, a menina precisou de apenas algum tempo para ler e familiarizar-se com o conteúdo, bem como para pedir esclarecimento do pai e, depois disso, foi só dizer “faz assim”.

“Eu acho que ela basta ler, ouvir ou ver alguma coisa e grava para toda a vida”, rematou .

Margarida Cassova Vitungayala, chamada também de Guidinha, a irmã de sete anos, a quem segue Laurinda Capumo, disse ser a mais amiga da menina sábia, tal como testemunharam os progenitores. Envolvida pelo simpático desafio que é característico nessas idades da infância, ela começou por dizer que a irmã mais nova não lhe ganha sequer uma corrida.

Contando ser desta que havia de passar à frente de Guidinha, Pumo lançou, imediatamente, mais um desafio para uma voltinha no quintal de casa. A prova não teve novidade no que toca à vendedora, confirmando- se, deste modo, a hegemonia de Guidinha.

Visivelmente satisfeita por ter mostrado o seu lado mais forte em relação aos da irmã-sábia, e já entre suspiros, a vencedora predispôs-se a falar da capacidade intelectual da companheira, tendo admitido que irmã sabia muito.

“Aqui em casa, ela dá sempre explicação a todos e nos ensina a mexer no computador e nos telefones”, anunciou Guidinha, tendo referido que, em actividades de manejo de brinquedos, Pumo se mostrava muito selectiva e organizada. A pequena revelou ainda que a sua irmã, quando pega um brinquedo, tem de desmontar para ver o que tem por dentro.

Em hábitos de desmontar qualquer coisa que lhe apareça à frente está o pequeno Estevão Felino Vitungayala, o irmão que segue à Pumo, só que este, depois de desfazer brinquedos, volta a montá-los até atingirem a forma original.

Estevão já sabe contar de um até dez e vice-versa, um exercício que demonstrou à equipa desta reportagem, acrescentando conhecimentos sobre o seu nome completo do pai e da mãe, bem como da terra onde vive.

‘Quero conhecer o Governador Kundy Paihama’

Contrariamente às expectativas de seus familiares e conhecidos que esperavam, como é desejo de Pumo, que ela fosse entrar numa escola para aprender mais, a pequena chora para conhecer o chefe do Governo da Província do Huambo, cujo nome consegue dizer sem errar sequer uma sílaba.

“Olha tio, eu quero conhecer o Governador Kundy Paihama, porque ele representa o povo do Huambo em Angola, só depois gostaria de conhecer outros dirigentes”, disse. Perguntando, a seguir, se o referido político aceitaria encontrar-se com uma criança de cinco anos.

Aliás, de algum tempo a esta parte, Laurinda Capumo tem vindo a surpreender o pai, no que toca a algumas pretensões resultantes de tudo o que ela lê.

“O bom é que ela ainda não me pediu para conhecer algo no estrangeiro, se calhar é por compreender a nossa condição financeira, mas já me obrigou a irmos a Luanda ver o Largo da Independência, para pisar onde Agostinho Neto a proclamou em 1975, o Largo das Heroínas e o Marco Histórico do Cazenga.

Avó com medo

Falando na língua regional Umbundu, prontamente traduzida por Frederico Vitungayala, o último de seus sete filhos e pai da menina-sábia, a velha Laurinda Capumo, de 94 anos de idade, disse que tem medo do facto de a neta possuir tanto conhecimento.

“Na nossa família já houve crianças espertas, mas assim como ela, que aprende tudo muito rápido e nunca mais esquece, nunca houve, por isso eu tenho medo e receio de tratar-se de algo que lhe possa fazer mal no futuro”, confessou a nonagenária que, para ver o seu temor de fora, tinha pedido que levasse aquela que trata de chará, por lhe ter herdado o nome.

A anciã solicita às autoridades locais para fazerem qualquer coisa pela neta que resulte não só no esclarecimento sobre a razão de tanto conhecimento, como também na orientação e acompanhamento da pequena Pumo, de modo a evitarem-se traumas no futuro. Para satisfazer o desejo da mãe, Frederico Vitungayala, ou simplesmente «Chefe Fedy», como é conhecido no Huambo, levou a filha a uma psicóloga, que também é missionária da Igreja Católica, de uma congregação cujo nome não conseguiu recordar, de onde saiu descansado pelo facto de a freira lhe ter garantido que não se tratava de algo preocupante.

Ele encara a filha como uma bênção dada por Deus, uma qualidade que não descarta para outros filhos, apesar de reconhecer que, para Laurinda Capumo, a inédita capacidade de memorizar as coisas faça grande diferença. Quanto aos passos de aprendizagem iniciais dados por Laurinda Capumo Vitungayala, o pai fala, de forma irónica, da convivência dela com os jovens e adultos que iam comer e beber no seu restaurante, no bairro da Kissala (ou Alemanha), dos quais ouvia e retinha informações sobre política, economia, desporto e outras, as quais serviam de teste de Quociente de Inteligência (QI) para os de casa, durante as primeiras horas da noite, já que a menina Pumo, de acordo com o progenitor, dorme sempre antes das 20 horas.

Outra modalidade de aprendizagem de Pumo se prende com a leitura feita por alguém e ouvida por ela, que capta imediatamente. Mas, a partir dos três anos de idade, altura em que aprendeu a ler e escrever, Laurinda Capumo começou a comportar-se como uma pessoa autodidacta, lendo e aprendendo sozinha.

“Em casa, é preciso estar preparados, porque, quando ela aprende uma coisa sozinha, põe à prova todo o mundo”, relatou Frederico. Sobre a questão da desistência da filha na escola, Chefe Fedy consentiu, tendo adiantado que ainda tentou levá-la para outro estabelecimento do ensino primário, localizado na zona de São Pedro, onde o director negou simpaticamente.

Por sua vez, a mãe mostrou-se bastante preocupa com as constantes solicitações que são feitas a Pumo por parte de estudantes do ensino secundário e superior, que tencionam ver solucionadas algumas questões científicas, aos quais pediu, encarecidamente, para não forçarem falar com a filha por via do telefone.

‘Quem sabe, sabe’

Na ocasião desta reportagem, Domingo, 26 de Outubro, que decorria na parte Norte do mercado da Alemanha, bairro da Kissala, onde a família de Laurinda Capumo possui e explora um restaurante, a miúda superdotada, conforme já é conhecida pelos munícipes do Huambo e não só, foi posta à prova pelo pai, Frederico Vitungayala, que lhe pediu para falar alguma coisa sobre Angola, África e o Mundo.

Sem titubear, Pumo começou por pontualizar que a guerra civil em Angola tinha começado em 1975, o mesmo ano em que era proclamada a independência de Angola pelo Doutor António Agostinho Neto, a 11 de Novembro, conforme fez questão de recordar a pequena, que referiu também sobre o 4 de Fevereiro de 1961, ano do início da Luta Armada de Libertação Nacional, ao qual realçou o grande significado na história de Angola, pelo facto de um grupo de nacionalistas angolanos ter atacado com catanas e armas na mão as prisões de Luanda.

Em seguida, relatou sobre a atitude brutal do exército português que, em resposta às investidas dos patriotas, chegou a matar mais de três mil angolanos na Capital do país, sem contar as vítimas de outras províncias, como Malanje, Uíje, Benguela, Huambo e outras.

Outras referências históricas citadas por Laurinda Capumo tiveram a ver com a implicação que teve o nome do rei NGola no actual nome do país, a “descoberta” de Angola pelo Capitão-mor português Diogo Cão, em 1482 e a fundação de Luanda por Paulo Dias de Novais, em 1575, tendo sido considerada cidade30 anos depois.

E, geograficamente falando, “A República de Angola é o sexto país africano de maior dimensão, com uma área de 1.246.700 quilómetros quadrados, uma costa de 1650 e uma fronteira terrestre de quatro mil e 837 Km. A população é de 24 milhões e trezentos mil habitantes, a moeda nacional é o Kwanza, que é o nome do maior rio de Angola. O ponto mais alto é o Morro do Moco, com mais de 2.620 metros de altura, localizado na província do Huambo. O território da República de Angola fica situado na costa Ocidental da África Austral e é limitado pela Namíbia, Congo Democrático e Zâmbia, a Oeste pelo oceano Atlântico. Tem 18 províncias e 165 municípios, com 554 comunas. A capital é Luanda, a língua oficial é o português. Recitou a menina que, durante o discurso, descansava somente dois minutos para respirar. A África do Sul, a sua superfície terrestre, a moeda, o seu Presidente, a vida e obra de Nelson Mandela e o partido ANC constaram dos depoimentos da criança.

Relativamente ao ANC, descodificou a sigla, anunciando que significava Congresso Nacional Africano e era uma organização que tinha como principal objectivo pôr fim ao Apartheid, afirmando- se também como um partido nacionalista, criado em 1912. Sabe também que Nelson Mandela nasceu a 18 de Julho de 1918.