Luanda - No dia 19 de Novembro de 2014, teve lugar, na Assembleia Nacional, mais um debate, em sede da discussão da proposta de OGE para 2015. O Deputado da UNITA Raul Danda fez a sua intervenção  cuja  íntegra reproduzimos.

Fonte: UNITA 

Excelência Senhor Presidente da Sessão;

Ilustres Auxiliares do Titular do Poder Executivo;

Caros colegas Deputados;

Minhas Senhoras e meus Senhores:

Somos chamados aqui, a exemplo do que vem sendo feito anos a fio, para mais um exercício de aconselhamento construtivo, sim, mas chamando as coisas pelos seus nomes. O Grupo Parlamentar da UNITA, conforme dizia na sua declaração política feita no passado dia 13, não se vai cansar de apontar as falhas e dizer o que acha que devia ser o caminho a seguir para termos orçamentos mais equilibrados, mais verdadeiros, com menos buracos, menos sacos (azuis, verdes, vermelhos, ou outros) que concorressem, de facto, para os objectivos, os mesmos, que vêm sendo inscritos no Relatório de Fundamentação do Executivo, entre os quais a melhoria da qualidade de vida dos angolanos, a garantia dos pressupostos básicos necessários ao desenvolvimento, a inserção da juventude na vida activa, a inserção competitiva de Angola no contexto internacional, a preservação da unidade e da coesão nacionais.

Desde já, este exercício de análise do OGE, na Especialidade, começou anteontem, segunda-feira, com uma nota negativa: a ausência dos senhores ministros na auscultação aos parceiros sociais; auscultação de algum modo inútil, sempre realizada de forma serôdia, pelos frutos que a mesma não produz. É nosso entender que essa auscultação teria sido de algum modo frutífera se fosse feita no momento da feitura da proposta de OGE. Mas assim não tem sido, apesar de, todos os anos, aconselharmos o Executivo a faze-lo. Os parceiros sociais deixam-se os seus afazeres, vêm para aqui, emitem as suas opiniões, muito válidas, por sinal, e de que servem? A promessa de que poderão ser tidas em conta em “exercícios futuros”, sem que se saiba em que futuro mora esse “futuro”. Eles próprios disseram-no. E é pena que o Executivo tenha estado ausente para ouvi-lo directamente. Mas como os deputados se transformaram em “mediadores” entre os parceiros sociais e o Governo que com eles não dialoga, o recado está dado.

Senhores membros do Governo,

Em nome de orçamentos mais equilibrados e participativos mesmo, os diferentes ministérios, governos provinciais, enfim, deviam primeiro ouvir a sociedade, através desses parceiros, e a proposta de OGE devia trazer, anexados, relatórios dessa auscultação. Isso não se faz e temos os orçamentos como os temos.

Como temos orçamentos que teimam em ter como único pilar de peso a receita petrolífera, V. Exas. estabeleceram despesas na ordem dos 73 biliões de dólares, quando a capacidade de captação de receitas se situava nos 43 biliões. E em vez de reavaliarem as despesas, preferiram optar pelo exagerado endividamento do país, na ordem dos 30 biliões. Num só ano! Este orçamento oferece aos angolanos o maior défice orçamental desde 2002.

SENHOR MINISTRO DAS FINANÇAS:

Que critérios terão ditado a escolha desse “corta-mato” marcado por tão grande endividamento? Por que razão se insiste em viver apenas do petróleo, tendo a economia sempre sujeita a terramotos (ou “economotos”), com o tremer do preço desse produto?

O preço do barril do petróleo baixou e, muito infelizmente, continua essa tendência. Hoje, os senhores estarão certamente a coçar a cabeça – passe o termo – com esse cálculo das receitas com base no preço de 81 dólares por barril de petróleo. Mas uma coisa que não foi dita e que gostaríamos de saber é o que se foi fazendo com o diferencial entre os 95 dólares orçamentados e os mais de 110 dólares que vigoraram como preço real?

Os angolanos estão preocupados com o facto de os orçamentos trazerem sempre optimismos exagerados do PIB. Toda a gente sabe, toda a gente vê que não é assim!

SENHOR MINISTRO,

Esta proposta de OGE é, para não variar, excessivamente optimista e contém conclusões bastante contraditórias face à realidade dos factos:

• Se em 2014 há registo de um desequilíbrio das contas internas e das contas externas, com as primeiras a registar um défice global de 0.2% do PIB, e as segundas a indicarem uma balança de pagamento de 2.7 mil milhões de dólares – o que representa mais de metade do défice registado em 2009, altura em que ocorreu a crise económica mundial;

• Se as exportações petrolíferas caíram em cerca de 4.6% do previsto em 2014 – e tudo indica que esta tendência decrescente irá manter-se ainda por muitos meses, devido ao fraco comportamento das principais economias mundiais, às tensões políticas externas e os factores operacionais negativos no país;

• Se o nível de execução do OGE de 2014 não foi para além dos 81%;

• Se os Programas de Investimento Público foram executados em apenas 71%;

• Se o OGE para 2015, comparativamente ao de 2014, é inferior em 6.5 mil milhões de kwanzas;

• Se o PIB de 2014, que o Executivo previa crescer em 8.8%, ao que tudo indica vai crescer menos de metade disso;

Como entender que, de um contexto tão frágil e fragilizado se possa ter um crescimento do PIB, em 2015, na ordem dos 9.7%, calculado com base num crescimento do sector petrolífero de 10.7% e do sector não-petrolífero de 9.2%?

SENHOR MINISTRO,

Mais uma vez o Governo vai gastar 381,9 mil milhões Kz, isto é, 5% do OGE, em “outros serviços”. Agradeço que o Senhor Ministro das Finanças explique aos Deputados e aos angolanos, de modo geral, o que são esses “Outros Serviços”.

Por outro lado, e apesar de haver uma ligeira melhoria, continuamos a verificar que a distribuição do bolo orçamental vai continuar a jogar a favor das assimetrias. A estrutura central de governação continua com 72% das receitas totais, continuando a cuidar da maioria dos projectos, mesmo os de impacto local; enquanto as estruturas locais ficam com 28%. Melhorou um pouco. Mas quando se pode fazer mais – porque pode-se, sim – é preciso fazer. Até porque isso facilita a prossecução do objectivo traçado no vosso “Plano Nacional de Desenvolvimento” de garantir os pressupostos básicos necessários ao desenvolvimento. Porque razão insistem com esse “controlar-tudo-cá-em-cima”?

No debate na generalidade, solicitei ao senhor Ministro das Finanças um esclarecimento sobre notícias postas a circular segundo as quais o Executivo teria emitido mais uma garantia soberana a favor da BIOCOM, que parece ter esbanjado o seu capital e pediu socorro ao Titular do Poder Executivo. Hoje, poderá dizer-nos alguma coisa sobre o assunto? Eu agradeço.

SENHORES MINISTROS,

Como é que se pode pretender falar em crescimento visível, com peso, do sector não-petrolífero, com o desprezo permanente a um sector importantíssimo como a agricultura? Como é que se pode pretender falar em diversificação eficaz da economia quando as verbas destinadas à Agricultura voltam a baixar este ano, caindo em 10%, para 53 mil milhões Kz, para um sector de importância estratégica na diversificação da economia e no combate à pobreza? E o senhor Ministro da Agricultura não diz nada?

Para empolar o peso da Agricultura eleva-se o número de agricultores no país a cerca do dobro do que realmente existe. Fala-se em 2.5 milhões de agricultores! Estão aonde se o os números do censo dizem que são quase metade disso? E é com esses números falsos que se pretende empolar o PIB! Tenham dó!

O meu colega Deputado Vitorino Nhany está sempre a falar da falta de assistência técnica ao sector agrícola. Os parceiros sociais também o disseram, anteontem. Somos potência regional – pelo menos pretendemos – mas os nossos camponeses continuam com o primitivismo da enxada!

SENHOR MINISTRO DA ECONOMIA:

A página 112, nas “Despesas Por Programa”, traz uma rubrica designada “Programa de Deslocação Industrial”, com a verba de 32.2 milhões de kwanzas. Na página seguinte há uma outra denominada “Programa de deslocalização Industrial”, este já com uma verba 790.3 milhões de kwanzas. O que significará isso?

Por outro lado, nessa página 113, temos duas vezes a mesma coisa: “Programa de desenvolvimento das micro, pequenas e médias empresas”, com verbas diferentes. Um erro?

SENHOR MINISTRO DA CONSTRUÇÃO:

1. Todos os anos temos construção de edifícios no âmbito do Protocolo de Lusaka, e isso nos últimos cerca de 20 anos ou mais. Em 2015, o que é que se vai construir de facto?

2. No país, o primeiro local onde se prometeu a construção de uma centralidade foi Cabinda. Têm estado a nascer centralidades noutros pontos do país, o que é bom. Mas, e Cabinda? Tem sido falta de verbas, estabelecimento de outras áreas prioritárias, ou há outros motivos?

3. Na auscultação realizada na segunda-feira com os parceiros sociais, falou-se do facto de estarem a ser plantadas muitas palmeiras – segundo diziam – mal plantadas, com custos de aquisição e de manutenção muito elevados, quando se podia optar por soluções que podem minimizar melhor os custos. Porque adoptar esse tipo de soluções?

4. Este Parlamento tem sido chamado a aprovar os orçamentos para aqui trazidos por V. Exas., mesmo se proibido de fiscalizar a execução dos mesmos. Mesmo a título informativo, é possível dizer-nos em que pé anda o novo Aeroporto de Luanda?

5. Por último, na página 173 da proposta de OGE, está inscrito um “programa nacional de construção de infraestruturas administrativas e autárquicas”, com cerca de 41 milhões de dólares. É com esse dinheiro que vamos fazer autarquias ou é mesmo para ir marcando o passo à espera que o ano de 2017 chegue e passe?

SENHOR MINISTRO DOS PETRÓLEOS

Este Orçamento, diz-se, assume os grandes objectivos nacionais fixados no plano nacional de desenvolvimento do Executivo para o período de vigência do vosso mandato, a saber 2013-2017. Entre esses objectivos, a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Ora, há relativamente pouco tempo, aos angolanos foi dada a assistir a triste cena de jovens profissionais da Clínica Girassol que, cansados do tratamento desigual; cansados da política injusta de “salário desigual para trabalho igual”, com agências que exploram e roubam os trabalhadores enquanto o Governo observa o filme; resolver usar a ferramenta constitucional da greve. Como muitas vezes é privilegiado quem viola a lei, muitos foram postos na rua, enquanto a outros era dito “ou aceitas estas condições humilhantes, ou vais para a rua”! É esse o tratamento dado por uma instituição hospitalar que até nega assistência de emergência ao filho de um dos seus enfermeiros. A Clínica Girassol está ligada aos petróleos. O Senhor Ministro não faz nada? Na Huíla, trabalhadores da SONANGOL, foram postos na rua sem o mínimo ressarcimento. O Senhor Ministro não vai fazer nada?

SENHOR MINISTRO DOS TRANSPORTES:

1. Hoje não vou falar do Porto de Águas Profundas do Caio, sobre se vem ou não vem. Isso vou esperar. Para quem esperou desde a realização do 1º Congresso do MPLA, altura e que se prometeu esse porto, pode esperar mais um pouquinho. Se não for nesta, será na outra encarnação, se Deus quiser. Quero apenas é pedir que o seu ministério assegure que não sejam atropelados os direitos dos cidadãos naquela zona onde poderá nascer, finalmente o Porto. Não estou a afirmar que seja o seu ministério a atropelar esses direitos. As empresas que vão ou estão a trabalhar no local (a EMCICA e a Caio Porto) levaram para lá as máquinas sem que se tivesse feito a necessária negociação com quem tem direitos sobre aquela parcela de terra. O senhor Ministro conhece bem o proprietário, o mais velho Pedro Cláver. Ele já está muito velho mesmo e, a cuidar dos assuntos da família, foi o seu filho José Barreto Cláver Pitra. As 59 cabeças de gado do homenzinho foram levadas para parte incerta, ao que se diz por pessoal do governo provincial de Cabinda; o senhor José Barreto Cláver Pitra foi posto na cadeia, por orientação do senhor procurador provincial, em cumprimento de ordens superiores – as eternas “ordens superiores” – transferido da DPIC para a penitenciária do Yabi; e agora por enquanto em liberdade depois do pagamento de uma caução de 2.7 milhões de kwanzas.

Senhor Ministro, o método é a diálogo, primeiro, e a concertação, para depois se passar para a indemnização. Nunca a intimidação e a violência. A meu pedido é que, enquanto governante, ajude a salvaguardar os direitos dos cidadãos.

2. Gostaria de aproveitar a oportunidade para solicitar ao senhor ministro que nos informe sobre que parceria terá sido assumida entre a TAAG e a EMIRATES, em que consiste e quando começa.

SENHOR MINISTRO DA ENERGIA E ÁGUAS:

O sector sob sua responsabilidade não é fácil; é complexo. Exige de si muito trabalho e muita perspicácia. No entanto, não podemos deixar de levantar as questões na busca de correcções.

Em Cabinda, os problemas de luz estão as ficar insuportáveis. A central térmicas de Santa Catarina, inaugurada há pouco tempo, queimou uma coisa qualquer no momento em que se fazia o ensaio. Não se conhece horizonte temporal para resolver o problema, e o povo está a sofrer. E, para mal dos pecados, a turbina do Malembo – o meu Malembo – não funciona. A situação está má.

SENHOR GOVERNADOR DO BANCO NACIONAL DE ANGOLA:

1. No passado dia 13 de novembro, quando esta proposta de OGE para 2015 era debatida, na generalidade, exprimi algumas preocupações, minhas e de grande parte dos angolanos, sobre o que se passou com o Banco Espírito Santo Angola – que se transformou em hoje Banco Económico, S.A. O Senhor Governador prometeu que iria fazer-se luz sobre as legítimas preocupações dos angolanos, relativamente ao que se passou no e com o Banco Espírito Santo Angola.

No entanto, foi com uma acentuada preocupação que ouvi o Senhor Governador dizer que nesse processo de metamorfose desse banco, não tinha entrado um único kwanza público. A verdade é que, depois da assembleia-geral extraordinária de accionistas, realizada aqui em Luanda no dia 29 de Outubro transacto, era notícia de capa pelo mundo fora que a SONANGOL tinha entrado no BESA, que passava a Banco Económico. Tenho fé que, com a conclusão do processo – conforme prometeu V. Exa. – iremos saber o que terá ditado a expulsão da parte portuguesa, a continuidade do accionista Geni, S.A., que anteriormente detinha uma participação de 18,99%; ou a entrada para o capital do agora Banco Económico da Lektron Capital (de accionistas chineses, ligado a Pam Sam) e da própria SONANGOL.

Nessa altura certamente saberemos também o que vai ser feito da posição do BES de Portugal, que considerou que as decisões tomadas na Assembleia Geral Extraordinária de 29 de Outubro são “inválidas e ineficazes”, pelo facto de a representante do BES ter alegadamente sido impedida de participar na reunião, sob pretexto de se ter atrasado, pois, para que a assembleia pudesse reunir e deliberar sobre qualquer assunto, seria necessário que todos os accionistas do BESA estivessem presentes na reunião e, ainda, que aceitassem deliberar sobre os pontos da ordem de trabalhos, o que não sucedeu. Bem, sobre isso esperar pelos esclarecimentos. Agora, mesmo com o envolvimento da empresa estatal de hibrocarbonetos o Senhor Governador mantém a asserção de que esse banco não tem nenhum kwanza público?

Muito Obrigado, Senhor Presidente