Luanda - Integra da intervenção do lider da bancada parlamentar da UNITA, Raúl Manuel  Danda no  debate, na especialidade, sobre a proposta de OGE para 2015 que teve lugar esta sexta-feira (20), em Luanda. De acordo com constatações, tratou-se do polémico dia em que vêm para o parlamento os governadores provinciais.

Fonte: UNITA 

A Danda  intervenção  provocou literalmente a ira da  Governadora de Cabinda, que insurgiu-se contra o deputado, chamando-lhe  "mentiroso", "imbecil" e  "boca de aluguer de alguns cabindas"

 

REPÚBLICA DE ANGOLA

ASSEMBLEIA NACIONAL

GRUPO PARLAMENTAR DA UNITA

OGE 2015–ESPECIALIDADE – MAT E GOVERNOS PROVINCIAIS – 22.11.14

Excelência Senhor Presidente da Sessão; Excelências Senhores Ministros;

Ilustres Senhores Governadores Provinciais; Caros Deputados;

Nos últimos dias fomo-nos debruçando sobre a estrutura central, pelo que caberá hoje a vez às estruturas locais. Tendo sido eleito pelo círculo provincial der Cabinda, é desta província que vou falar esta manhã. Vou, pois, dirigir-me à S. Exa senhora Governadora da minha província, a quem me vou atrever dar um ou outro conselho, se me permitir.

Senhora Governadora:

1.No dia 22 de Novembro do ano passado, dirigi-me a V.Exa, aqui nesta sala, e dizia que, mesmo não tendo sido cumprida a promessa feita por Sua Excelência o Titular do Poder Executivo, no que diz respeito às modalidades de reatribuição da verba relativa às Receitas Fiscais referentes à exploração petrolífera no enclave de Cabinda, a Lei do Orçamento Geral do Estado para o exercício económico do ano de 2013, atribuía à província uma verba de cerca de 170 milhões de dólares, resultante dessas receitas. Perguntava eu, na altura, se esse dinheiro lhe tinha, na totalidade ou em parte, chegado às mãos. Entre o sim e o não parece ter prevalecido o “nim”. Fontes junto do seu Executivo disseram-nos que essa verba tinha encontrado dificuldades em atravessar o grande rio Zaire. No presente exercício económico – e refiro-me a 2014 – a verba subiu mais um bocado, fixando-se em 17.6 biliões de kwanzas. E eu renovo a pergunto: Senhora Governadora, desta vez o dinheiro atracou?

Para o exercício económico de 2015, a lei do OGE sugere que essa verba seja um pouquinho mais baixa – constrangimentos económico-financeiros obrigarão a isso – fixando-se em 14.9 bilhões de kwanzas, ou seja 150.7 milhões de dólares. Sabia que os meus colegas da província do Zaire iriam certamente reclamar, mais uma vez, pois acham que o Zaire estará a produzir mais petróleo do que Cabinda, mas, enfim, se não for erros no cálculo da produção, há-de ser, provavelmente, força do “estatuto especial” parido no Namibe há uns anitos. Bem! Apesar de eu não perceber que matemática o Executivo tem estado a seguir na fixação desse montante, tanto na atribuição como na reatribuição, há-de prevalecer a pergunta: Senhora Governadora, essa verba aterra em Cabinda? A pergunta não tem como propósito julga-la. Longe disso. A minha intenção é, como diziam os antepassados, “Tchaku, Tchaku, mazi ma nwa Mbwa”. Eu vou traduzir para a Senhora Governadora, para os senhores deputados perceberem: quando o cão bebe água, faz aquele barulho característico “tchaku-tchaku” o que, em língua ibinda, significa “o que é teu, é teu”. Quero ajudar, na minha condição de deputado.

Cabinda vai receber uma verba avaliada em 702.17 Milhões de dólares, quase metade do que recebe o Kwanza Norte, província que apenas é ultrapassada por Luanda e Benguela. O Executivo saberá porquê. Quanto a mim, gostaria de saber se, com esse dinheiro, a Sra. Governadora vai conseguir minimizar os muitos problemas que vive a província que superiormente dirige.

Para começar, a situação crítica dos empreendedores locais – sobretudo os pequenos – cujas empresas têm estado a morrer. Eu já havia levantado esta questão no dia 22 de novembro do ano passado, aqui. Não estou a falar das grandes empresas mas aquelas pequenas que andam a minguar sem possibilidade de chegarem a médias.

Assiste-se ainda, a exemplo do que eventualmente se passará noutros locais, à falta de assunção do facto de que não são governadores que assumem compromissos, que contraem dívidas, mas sim os Governos Provinciais. E, ao que tudo indica, muitos daqueles empreendedores que se tornaram credores do Governo Provincial, ao tempo do meu ilustre colega, o deputado Mawete João Baptista, foram simplesmente esquecidos como se se estivesse à espera que Sua Excelência o Titular do Poder Executivo o volte a nomear, para mais não fosse, para ir pagar uma dívida que, repito, não é sua, mas sim do Governo Provincial de Cabinda!

Sabemos todos que os empreendedores em Cabinda continuam a lutar com as armas que podem pela sobrevivência, à espera que numa maternidade qualquer nasça o tão esperado Porto de Águas Profundas que parece que vai ser construída entre o Caio e o Buco-Mazi. Com a verba que vai receber, a Sra. Governadora poderá ajudar esses empreendedores?

No ano passado, eu já falava das padarias que se multiplicam, em Cabinda. Isso até é bom para as pessoas terem pão para o alimento. No entanto, Sra. Governadora, está a crescer perigosamente um monopólio nesse domínio, numa verdadeira concorrência desleal, onde o monopolista (ou a monopolista) asfixia os pequenos padeiros para depois lhes comprar as padarias.

O lixo é outro problema. Não tanto na vertente de quem suja, mas de quem faz a sua recolha. Há empresas que fazem a recolha do lixo; fazem o seu trabalho, bem, mal ou mais ou menos; mas quando a direcção da província muda, mudam igualmente os prestadores de serviço. Será por uma questão de maior eficiência e eficácia? Será que se acha melhor mudar, tendo em conta a relação custo-benefício? E quem serão os donos dessas empresas? E para a limpeza e saneamento o OGE, para Cabinda, traz inscrita a verba de 1.5 biliões de Kwanzas (página 270), 15,3 milhões de dólares.

Sra. Governadora, “Bakulu ba ta nonga: kamba una wi kwenda ku moka, kaza una ufuminya kuaw, m’possa bobo”. “Aconselha-se quem sai para passear, para se divertir, e não quem de lá vem. Pois, se tiver de praticar algum mal, já o terá feito”. Julgo que essa situação não pode, de forma nenhuma, concorrer para o alcance dos objectivos nacionais que este e anteriores orçamentos se propunham atingir de “desenvolvimento do sector privado”, de “melhoria da qualidade de vida dos cidadãos”, nem de “preservação da unidade e da coesão nacionais”.

2. No ano passado, referindo-me à edição no 14 da revista de informação “Ngonge”, destinada a publicitar as realizações do executivo de Cabinda; edição de 2010, segundo a qual haveria “dias melhores” para as populações de Cabinda – e, na altura, V. Exa. também fazia parte do Executivo, mesmo não sendo titular – eu perguntava se sentia que esses dias tinham chegado. Na altura, falou-me nas vias que ligam as aldeias de Katabuanga, etc., etc., como demonstrativo dessa melhoria. Muito bem.

A edição no 16 dessa revista, que fala do plano de desenvolvimento da província de Cabinda, traz uma biografia da mulher, da religiosa, que governa Cabinda. Essa curta biografia traz à luz a dirigente, hoje governante – porque pode ser-se dirigente sem se ser governante – que, apesar da sua pouca idade, se engajou de forma profunda na luta de libertação nacional, tendo ajudado, no período da colonização portuguesa, muitos jovens a fugirem para se engajarem na luta armada de libertação nacional, e tendo, já no fim do período colonial, acolhido os guerrilheiros aquando da sua entrada triunfal em Cabinda, com militâncias na OPA e na OMA – estive a citar a revista Ngonge, edição no 16, Ano 13. Eu apelo a essa mulher revolucionária que utilize os recursos, mesmo poucos, que tem estado a receber e que vai receber em 2015, para governar todos de forma igual. Porque os relatos que vêm de Cabinda, de todos os sectores da sociedade, incluindo dos seus próprios “camaradas” de partido, dizem que os cabindas sentem saudades do General Mawete João Baptista. Acredito que a Sra. Governadora já ouviu isso reiteradas vezes. E isso não pode ser bom para si.

É verdade que os Governadores Provinciais têm competência para nomearem os seus colaboradores, mas aconselho algum cuidado nisso, sobretudo quando, mesmo sem nos apercebermos, começamos a incorrer em algum nepotismo, nessa matéria. É que dizem os cabindas, dentro e fora do seu partido, que a Sra. Governadora preocupa-se mais com a família, mesmo nos assuntos da governação. Não sei se é verdade ou não, mas é o que dizem. E certamente V. Exa terá já ouvido isso. Dizem, por exemplo, que tem o irmão como Secretário Provincial da Cultura; o ex- marido como Secretário Provincial do MAPESS (nem sei se ainda se chama mesmo assim); tem a filha como Directora do Gabinete; tem o genro a dirigir o chamado DAPIGOT (Departamento de Administração, Património, Informática, Gestão de Orçamento e Transportes); tem o sobrinho do marido como Secretário-Geral do Governo; tem o sobrinho do ex-marido como Director do Plano; tem o ex-cunhado como Assessor. Até podem todos ser muito dotados, muito competentes. Mas poderá ser entendido assim? E o mesmo se estaria a passar com algumas empresas que prestam serviços ao Governo Provincial. Ora, se isso for verdade, não estariam os recursos alocados à província a ser mal utilizados, sobretudo quando o Artigo 10o da Proposta de Lei que aprova o Orçamento Geral do Estado para o Exercício Económico de 2015 lhe dá a possibilidade de firmar contratos até 999.999,99 USD, sem que seja necessário o visto que marque a fiscalização preventiva do Tribunal de Contas? É mesmo preciso – se o conselho passa – ter alguma cautela para não manchar a sua imagem.

Senhora Governadora,

3.A exemplo do que se passa no resto do país, os medicamentos são um verdadeiro problema também em Cabinda. O problema ficará resolvido com os 231.6 milhões de kwanzas inscritos na página 269?

4.Na mesma página 269, está uma rubrica “Programa de Promoção do Programa de Habitação Social”, com cerca de 4.8 biliões de kwanzas. Esse programa será de construção das chamadas “casas evolutivas” que, segundo explicações que nos foram dadas pelas autoridades locais, são casas inacabadas destinadas aos cidadãos que nada têm e a quem se vai pedir que as concluam? Se sim, essas casinhas não podiam ser melhoradas, evitando esse imbróglio aos destinatários?

5.Ainda na página 269, no fim da página, há uma rubrica “Comemorações do 11 de Novembro – dia da independências nacional”, com 49,6 milhões de Kwanzas; e outra rubrica “Efemérides e datas comemorativas”, com 29.4 milhões. Talvez fosse melhor fazer-se a contracção, criando apenas uma despesa. Por outro lado, com a necessidade de contenção da despesa, não seria bom reduzir um pouco, só em 2015, o dinheiro para a festa? Não estamos a dizer para não se festejar, conforme pareceu entender-se ontem. Apenas gastar um pouquinho menos. É uma sugestão.

6N.a Despesa de Funcionamento e de apoio ao Desenvolvimento (página 270), tem um “Serviço de Cardiovascular”. Julgo que o “de” talvez esteja a mais. Se sim, que seja removido.

7. Nos PIPs para o município de Cabinda, está prevista uma despesa para a construção da vala de drenagem no Tchizo. Aquela obra tem estado a causar muitos constrangimentos à circulação, pelo que exortamos o Executivo Provincial a acelera-la.

8.Não me vou referir ao problema da luz, pois, o senhor Ministro da Energia já prestou os devidos esclarecimentos e nós fazemos figas para que, na verdade, o problema conheça um fim muito rapidamente.

9.Também não me vou referir de novo à centralidade de Cabinda que, conforme nos disse o Senhor Secretário de Estado do Urbanismo, brevemente começa a ser erguida. Vamos só fazer votos para que o “brevemente” não se eternize domo tem estado a acontecer com o Porto.

10. E, por falar em Porto, anteontem fizemos a solicitação ao senhor Ministro dos Transportes para que interceda no caso dos atropelos aos direitos dos cidadãos, que estão a ocorrer na zona onde eventualmente se vai finalmente erguer o Porto. Quero fazer a mesma solicitação a V. Exa. É que as empresas que vão ou estão a trabalhar no local (a EMCICA e a Caio Porto) levaram para lá as máquinas sem que se tivesse feito a necessária negociação com quem tem direitos sobre aquela parcela de terra. A senhora Governadora conhece bem o proprietário, o mais velho Pedro Cláver. Ele já está muito velho mesmo e, a cuidar dos assuntos da família, foi o seu filho José Barreto Cláver Pitra.

 

A família diz que as 59 cabeças de gado do homenzinho foram levadas para parte incerta, e a família diz que isso se fez por ordens do governo provincial; o senhor José Barreto Cláver Pitra foi posto na cadeia, por orientação do senhor procurador provincial, em cumprimento de ordens superiores; foi transferido da DPIC para a penitenciária do Yabi; tendo sido depois posto em liberdade na sequência do pagamento de uma caução de 2.7 milhões de kwanzas.

Senhora Governadora, o método é o diálogo, a concertação e a indemnização. Nunca a intimidação e a violência. Por isso, eu peço que, enquanto governante, ajude a salvaguardar os direitos dos cidadãos. Já bastou a tragédia da senhora que teve um ataque fulminante quando a sua casa (boa casa, por sinal) foi demolida no local onde se diz que vai nascer a MEDIATEC, em Cabinda.

11. Em todos os municípios está inscrito um “Projecto Água para todos”. A constatação que fizemos, em visita recente aos municípios de Cabinda, foi de que tem havido muitos furos, que custam o que custam, mas que jorram água na primeira tentativa ou na inauguração, mas depois já não sai água nenhuma. Ter-se-á conseguido encontrar uma outra forma de fazer as coisas que poupe recursos e faça brotar água?

12. O Hospital Provincial não há jeito de andar. As obras de reabilitação daquela unidade hospitalar já vêm do tempo em que era Governador o Dr. Aníbal Rocha. Os médicos, naquele hospital são de opinião de que aquelas instalações já não conseguem dar resposta às necessidades, quaisquer que sejam os remendos aplicados ou a aplicar. A sra. Governadora, nas muitas visitas de campo que tem estado a fazer, deve ter o mesmo sentimento que o exprimido pelos médicos, enfermeiros e utentes daquela unidade hospitalar. Será que ainda não é tempo de se pensar em construir um hospital central para Cabinda?

13. Sra. Governadora, para quando a inauguração e início de funcionamento do novo hospital de Cacongo que, no orçamento relativo ao ano prestes a terminar, trazia, para além dos 5.5 milhões de dólares dedicados à sua construção, já em fase derradeira, uma verba destinada ao fornecimento de mobiliário e equipamento?

14. Para terminar, duas notas: para a primeira sairei de Cabinda para o Cunene, para pedir ao Executivo Central que preste maior atenção a essa província, que tem problemas muito particulares. E não me parece que os 80 biliões de Kwanzas que lhe são atribuídos sirvam para muita coisa. Mesmo se em ambiente de alguma austeridade, pode-se dar mais ao Cunene.

Segunda nota: Sendo a Comissão Nacional Eleitoral uma unidade orçamental, a sua direcção nunca vem para cá porquê? Não é preciso?

Muito Obrigado Senhor Presidente