Nos princípios dos anos 50 recuperado da doença  transfere-se para o Sul de Angola, no Huíla, onde trabalha na área administrativa da fábrica Singer. De regresso a Luanda funciona como contabilista, tal como o poeta António Jacinto, seu companheiro de geração literária e correligionário íntimo, que lhe viria a cortar ou aumentar uma ou outra vírgula naquilo que ficou famoso como o Manifesto do MPLA. Com este poeta do Kiaposse, os escritores Domingos Van-Dúnem, Aristides Van-Dúnem e Mário António, fundam, em 1955, o Partido Comunista Português de Angola. Segundo apuramos o poeta da “Rua da Maianga” viria a desistir da febre contestatária e da conspiração clandestina, por alegadamente não querer esconder nada à mulher, revelando-se alguns anos mais tarde pela via reformista do caminho mais fácil do colaboracionismo com as autoridades coloniais. Por essa altura, a luta clandestina era marcada entre outras armas de arremesso político, com a distribuição de panfletos à calada da noite, escritos subversivos onde que se criticava a política nefanda de exploração colonial dos nativos e se dirigiam apelos à luta libertadora.
Cedo se revelaram os dotes litetrários, quando em 1946, aos 18 anos, publica o seu primeiro ensaio literário no jornal “Farolim”.

Em 1948 lança as bases do movimento cultural e artístico “Vamos descobrir Angola”, assinalando uma ruptura “stablishement” literário reinante, onde pontificam os cultores de uma literatura colonial, caçadores do exótico e propagandistas do lusotropicalismo.

Intelectual “engagé”, em finais de 40 e 50 está á testa do “Movimento dos Novos Intelectuais, preocupados em devolver a dignidade aos seus irmãos despossuídos, exaltando-os na sua poesia, figura tipológica traduzida em “ai, Benjamin, sujo, esfarrapado e descalço levei-o ao baile do sr. Januário”. Ele manifesta uma identificação com o seu personagem, situado no último degrau da escada social. Estas motivações, inquietações sociais vão marcar a sua poesia. Das preocupações sociais à radicalização política do ser social vai... um passo de cobra, ou tudo se opera ao mesmo tempo à medida que vai tomando consciência das condições de exploração em que vivia mergulhadas as gentes humildes dos musseques; personagens centrais dos seus raros poemas dialógicos, como a avô Naxa, com quem o sujeito de enunciação do seu discurso poético partilha valores simbólicos, enformam toda uma cultura urbana e rural. “Estão a dizer que é civrização”, interroga-se a velhota com a força do “Makezu”.

Embrenhado nos valores uma vivência intensa no combate clandestion no bairro operário e arredores, em 1957passa por Lisboa e reune-se com um círculo restrito de nacionalistas africanos em casa de Amilcar Cabral. Em 1958, com a PIDE à sua ilharga, foge para Paris depois de uma curta estadia na capital da metrópole, onde vai integrar  com Mário de Andrade, Amilcar Cabral, Guilherme Espírito Santo, Aquino de Bragança e Marcelino dos Santos  o núcleo dirigente do movimento nacionalista das cinco colónias portuguesas, organizado em torno do MAC(Movimento Anti-Colnial), fundado por esse grupo jacobino em Paris, numa reunião de estudo e consulta.

Em 1960 está em Conacry onde se instala a direcção do MPLA, onde fazem parte MPA(presidente), Viriato da Cruz(secretário-Geral), reverendo Domingos da Silva, vice- presidente, o médico Eduardo Macedo dos Santos, ( o seu incondicional Matias Miguéis), Manuel Lima, secretário para a defesa, acabado de desertar do exercito português, onde foi o primeiro alferes miliciano negro, para juntar-se ao Movimento de Libertação Nacuional, o médico Hugo de Menezes, o primeiro a aportar à capital da Guiné de Sekou Touré.

Em 1962/63, rompe com o MPLA(por incompatibilidades de relacionamento pessoal e insanáveis querelas ideológicas com Agostinho Neto, a quem acusava de ser um “agente português”, pela forma miraculosa como fugira de Portugal, com ajuda do PCP), já em Leopoldoville actual RDC, de que foi fundador e primeiro secretário desde 1960, em Conacry, secundando o seu primeiro Presidente, Mário Pinto de Andrade. Por essa altura, vale lembrar, o movimento nacionalista urbano em Luanda se encontrava disperso em células clandestinas reunidas em várias siglas como a UPA, MIA, PLUAA e MINA, este último capitaneados por Agostinho Neto, Joaquim Pinto de Andrade e Pedro Pacavira. Os três últimos agrupamentos políticos  fundidos com a ala do efectivo “leadership”, baseado em Conacri, dariam lugar ao MPLA nos primórdios dos anos 60, movimentando-se no eixo Conakri- Brazzaville- Kinshasa e clandestinamente em Luanda, apesar da decapitação da sua liderança interna, aprisionada, e da detenção, igualmente, do grosso dos seus militantes e aderentes da causa nacionalista.

Vale recordar ainda que, conforme reza a História, corria o ano de 1956: retirado às suas expensas no Hotel Magestic, em Luanda, redigiu durante duas semanas aquele que viria  ser adoptado anos mais tarde, como sendo o doutrinário manifesto do MPLA, numa conferência em Túnis( rompendo-se com a FRAIN), revelando-se assim um dos mais ardentes protagonistas e sólidos teóricos do “mais amplo Movimento Popular de Libertação de Angola”.

Entre outras outros ensaios literários, publicou em Setembro de 1946, um dedicado à “A arte antiga e a arte moderna”, onde analisa entre outras questões estéticas as conexões entre o fundo e a forma, depois de fazer uma avaliação sobre a evolução da arte, em geral, e da literatura, em particular, no mundo.

Consta igualmente a formulação teórica do movimento vamos descobrir Angola onde “incitava os jovens a resgatar o espírito combativo dos pioneiros da literatura angolana, apelando a uma renovação estética, sem concessão aos caçadores do exótico; uma renovação ,“baseada no senso e na razão africanos” - escrevia ele. Além doutros textos ensaísticos dispersos no país e no estrangeiro, emprestou a sua colaboração emprestada à uma revista de artes e letras da extinta RDA, onde escreveu um artigo sobre a literatura angolana que lhe foi encomendada pelos seus editores. Em 1951 envia a Lisboa uma comunicação, saldando assim a sua participação no âmbito dos debates do centro de estudos africanos, animados entre outros prelectores, por poetas e intelectuais oriundos das cinco colónias portuguesas, designadamente os seus conterrâneos Mário Pinto de Andrade, Agostinho Neto e Humberto Machado, além de Amilcar Cabral, José Tenreiro e  Marcelino dos Santos.

O CEA era o centro de discussão cultural e agitação política, ainda que embrionária, que pretendia, entre outros objectivos, resgatar a identidade cultural africana, violentada pela agressão cultural protagonizada pelos aparelhos(ideológicos) coloniais, através da “reabilitação dos valores nativos destruídos” e dar a conhecer ao mundo as realidades dos seus países de origem.

Quanto à sua brilhante produção poética, apesar da família ter revelado a existência de poemas inéditos da sua autoria, numa última e das raras homenagens públicas a si dedicadas após longos anos de ostracismo político, só se lhe conhecem, em antologias e publicados pela CEI nos finais dos anos 50 e reeditados pela União dos Escritores Angolanos, meia dúzia de antológicos poemas “Poemas”, onde se destacam o clássico “Namoro”, “Makezu”, “Só santo” e “Canto de esperança”(dedicado ao poeta antilhano Jacques Roumain), um dos vates do renascimento cultural do mundo negro, na diáspora, que influenciou a sua geração artística e literária, além de Senghor, Guillen e Langsthon Hughes, entre outros não menos expressivos no manejo da arte da palavra nas Américas, Europa e África. O poeta também havia bebido influencias dos escritores modernistas do nordeste brasileiro. Basta ver que tinha correspondência com uma tertúlia literária no Brasil, na região de Petrópolis, donde lhe viam muitos livros, revistas e jornais que lhe abriram os horizontes para a sua denodada acção cívica, cultural e política.

Ironia do destino.Votado ao ostracismo pelos seus companheiros de rota, o poeta viria a morrer na China, onde trabalhou na fase de lua de mel com a “Revolução de Mao”( de que viria ser crítico severo do culto da personalidade), como consultor da Associação dos Jornalistas e Escritores Afro-Asiáticos e foi locutor dos serviços de língua portuguesa. Banido pelas autoridades chinesas  por divergências ideológicas, morreu na mais vil miséria, vítima de um ataque de miocárdio em Junho de 1973, dois anos antes da independência que ajudou tenazmente a erguer, enquanto um dos adubadores do nacionalismo moderno angolano, na sua fase mais incipiente dos  finais dos anos 40/50 e princípios de 60, a década da “África das nações”.

*Norberto Costa
Fonte: Club-k.net