Luanda - A Unidade da Guarda Presidencial (UGP), pode cometer crimes à vontade, a sua impunidade é absoluta. É um exécito paralelo ao serviço de um homem, vinte mil homens pagos não se sabe bem como, pois os seus emolumentos nem sequer figuram no Orçamento Geral do Estado

Fonte: Folha8

O mês de Novembro, prestes a terminar, comporta datas marcantes na história do mundo e na nossa história. Mas nem todas são “felices recuerdos” como foi a nossa Dipanda, basta relembrar os dramas das Torres Gémeas do dia 11, em Nova York, e os dias 23 e 27 desse mesmo mês, recordados com a mágoa e o sentimento de revolta que a impotência perante duas gritantes provas da insignificância da vida humana para este regime JES/MPLA. A esses dois dias “negros” juntaremos um terceiro dia, esse de Setembro de 2013, reunindo assim três mostras da podridão da paz em que, diz-se, estamos a viver.

Os dias 23 e 27 de Novembro, que passaram sem quase ninguém se lembrar disso, são efemérides de dois actos bárbaros protagonizados pela Unidade da Guarda Presidencial (UGP), cometidos contra dois angolanos que se batiam pela liberdade de expressão (ver no nosso Top Secreto) , dois assassinatos repelentes, um deles em 2003 e o outro em 2013, respectivamente de um lavador de viaturas, “Cherokee”, e de um militante da CASA-CE, que deu azo a uma aparatosa intervenção de batalhões militarizados ao serviço da Presidência da República no decorrer do funeral desse militante da CASA-CE. Comecemos por este último.

Nesse dia, 27 de Novembro de 2013, o cortejo fúnebre para o último adeus ao jovem engenheiro “Ganga”, Manuel de Carvalho Hilbert Ganga, assassinado pelas costas quatro dias antes pela guarda presidencial (UGP), estava a decorrer normalmente, quando uma espalhafatosa composição da Polícia Nacional (não PNA, mas  PMPLA), bloqueou a estrada com meios bélicos descomunais, enquanto helicópteros sobrevoavam o teatro das operações a baixa altitude.

“Tinha começado assim um Requiem pagão, belicista, sem música nem coro, organizado pelas forças policiais partidárias, a mando de JES, deixando ao torreiro do sol, por mais de duas horas e em clara contravenção à nossa tradição e costumes, o corpo de um herói involuntário, o jovem engenheiro de construção civil, Ganga, dirigente da organização juvenil da CASA-CE, segundo maior partido da oposição, assassinado pela UGP, como supramencionado, sem que os acompanhantes do funeral pudessem fazer fosse o que fosse. Ficou demonstrado assim em que pilar assenta a insensibilidade e a monstruosidade deste regime que nem mortos respeita”…

In memorium a esse dia retornamos a um outro dia de Outono de 2003, não 23, mas 26 de Novembro, maneira como outra de render homenagem não só ao “Ganga”, mas também a todos os que foram vítimas dos excessos intoleráveis da UGP.

Nesse ano, o rapper MCK, então com 22 anos, conferiu à sua arte de cantar a revolta da juventude angolana uma extraordinária notabilidade política e social, em parte devido a uma intervenção assassina da guarda pretoriana do presidente José Eduardo dos Santos, por obra da monstruosa crueldade dos soldados da UGP, que, a frio, amarraram e arrastaram o lavador de carros Arsénio Sebastião “Cherokee”, 27 anos, para a água, no embarcadouro do Mussulo e o afogaram, ignorando os pedidos de clemência da multidão que se tinha amontoado em redor e circulava pelo local.

Que crime Cherokee teria cometido para merecer tão sumária execução pública?

Tinha cantado!

O crime dele foi cantar, repetimos, cantar!

Aconteceu simplesmente os efectivos da Unidade de Guarda Presidencial (UGP) surpreenderem o rapaz a cantarolar “A Téknika, as Kausas e as Konsekuências” de MCK, também conhecida como o “Sei Lá o Quê, Aiué”, uma crítica acintosa ao governo de Dos Santos. Mataram-no lentamente, para que servisse de lição a todos

 (de notar que, por mero acaso, foi também num dia 27 de Novembro que nasceram Bruce Lee, o lendário lutador de Kung Fu, e Jimi Hendrix - “É fácil tocar blues, mas é difícil senti-lo”, dizia Hendrix, o mago da guitarra eléctrica.

  Impunidade e mistério da fonte dos salários

Quanto ao terceiro dia a que aludimos na introdução deste artigo, foi em Setembro, dia 24. Aconteceu já noite feita, quando  o nosso director, William Tonet, foi vítima de um atentado atribuído a soldados da UPG no momento em que ele saía da Universidade onde dá aulas no bairro Morro Bento. “Uma viatura com homens fortemente armados vinha em sentido contrário e provocaram de propósito um choque  com a minha viatura, desceram da camioneta em que se faziam transportar, apontaram armas e deram empurrões de forma ameaçadora”, explicou o nosso director, acrescentando que os supostos soldados da UGP  se puseram-se em retirada quando pessoas se aproximaram do local.

Bom, tirando os danos sofridos pela viatura de WT, nada de grave se passou, mas o mais penoso é que ficou patente, uma vez mais, a impossibilidade de protestar contra a selvajaria dos soldados da UGP e isso numa altura em que temos vindo a verificar um endurecimento da já de si ríspida e tradicional repressão policial (da Polícia Nacional em geral), efectuada sobretudo sobre quem não manifeste adesão ao regime político instaurado desde há quase 40 anos no nosso país. Pelo mesmo andar do andor tem-se verificado um desaparecimento progressivo e constante do respeito pelas leis de Angola, a começar pela própria Constituição, que é positivamente massacrada, pisoteada ou ignorada pelas mais importantes e ufanas instituições encarregadas de a defender e de velar pela sua obediência.

No caso vertente, UGP/WT,  o valor da versão da vítima é insignificante, uma vez que a UGP está acima da lei, a pontos de as suas viaturas nem sequer terem placa de matriculação quando saem à rua e os seus soldados serem anónimos, sem nome, sem rosto e, em casos como este, sem rasto possível de seguir. O caso do atentado a WT nem sequer existe para esses senhores do Poder!

Por outro lado, a impunidade dessas pessoas que manejam os monstros motorizados que são as “carrinhas” da UGP, estende-se à impotência PN, interdita de agir a propósito de seja que caso for atinente às suas exacções, abalroamentos, eventualmente crimes e assassinatos. Toda essa gente goza de uma impunidade tacitamente institucionalizada!

Esta agressividade é “normal”!, está no sangue dos nossos governantes ex-guerrilheiros e já não espanta ninguém. Mais clamoroso, um verdadeiro escândalo, é que essa tropa ao serviço de JES, à parte fruir de impunidade total, é um autêntico exército paralelo independente das FAA. São cerca de 20 mil homens pagos ao preço da miséria, numa saga em que o dinheiro se evapora ao sair dos cofres do Estado por vias quase tão misteriosas como as do Padre Eterno – no Orçamento Geral do Estado nem sombra há do colossal preço (centenas de milhões…) que o Estado tem de pagar a essa guarda de um só homem -, pois a maioria daqueles que devem ser pagos cem mil, recebem uns trinta e se protestarem… “Ai é!?! .. Jacarés em cima deles, pois então!