Luanda - A analise histórico­ constitucional angolana, nos remete a 1975, angola torna­ se um Estado Soberano como consequência de uma revolução que teve inicio na década de 60, não quer dizer que antes desta data não tenha havido resistência a ocupação colonial, pelo que a 10 de Novembro de 1975, o comité central do Movimento Popular de Libertação de Angola­ (MPLA) aprovou a Lei Constitucional (designação da primeira constituição material de Angola).

Fonte: Club-k.net

Após a proclamação da Independência, instaurou­se a I República caracterizada por um regime não democrático, pela existência de um único partido político (sistema monopartidário, classificação de Giovanni Sartori apud António José Fernandes – Introdução à Ciência Política. 3a edição. Porto Editora. Porto: 2010, p.201), supressão na constituição formal dos direitos liberdades e alguns direitos garantias a favor do Estado poder (autoritarismo classificação de Lipset e Rokkan – party systems and voter alignments. Free press. New York: 1967, p.68), bem como a instituição de um sistema de economia centralizada (vide o preâmbulo da Lei constitucional de 1975).

A Lei constitucional de 1975 foi sofrendo sucessivas revisões (vide as revisões de 1976, 1977, 1978 e 1980) pelo que do ponto de vista substancial em nada alterava a estrutura do Estado, sendo certo que as revisões operadas visavam reforçar as competências do Presidente da República face ao Conselho de Revolução, bem como reforçar as opções ideológicas do Estado (vide Sousa, Bornito e Correia, Aderito – História Constitucional de Angola)

Neste sentido, das sucessivas revisões operadas destacamos as mais importantes revisões a de 1980 e a 1991. A revisão de 1980 não alterou o regime político até então vigente, mas consideramo­la importante porque:

- alterou todo o titulo referente à organização do Estado angolano para responder à necessidade de instituição dos órgãos eleitos do poder de Estado, nesta altura apesar do sistema de partido único, surge a Assembleia do Povo (vide o preâmbulo da Lei no 12/91 de 06 de Maio).

A revisão constitucional de 1991 (ou também ruptura constitucional em virtude de se alter toda estrutura do Estado a partir da institucionalização de um novo regime político, vide Gouveia, Jorge Bacelar – Direito Constitucional de Angola. Editor IDILP. Lisboa: 2014, p.82­85) operada através da Lei no 12/91 de 6 de Maio, constitui a mais importante transformação do Estado angolano desde à independência pelos seguintes aspectos:

Instaurou a II República através da institucionalização de um novo regime político, ou seja, o Estado angolano deixou de ser monista e passou a pluralista ou democrático de Direito (vide Miranda, Jorge – Teoria do Estado e da Constituição. Coimbra Editora. Coimbra: 2002, p. 514­516) permitiu a participação organizada de todos cidadãos na vida política nacional e na direcção do Estado; ­ ampliou o reconhecimento e protecção dos direitos, liberdades e deveres fundamentais dos cidadãos no âmbito de uma sociedade democrática; ­ assim como consagrou constitucionalmente os princípios da reforma económica, sobretudo aqueles que visavam estimular a iniciativa e a protecção da actividade de todos os agentes económicos .

A ruptura constitucional de 1991 viu­se reforçada com a revisão de 1992 operada através da lei 23/92 de 16 de Setembro, sendo que as primeiras eleições quer presidenciais quanto parlamentares tiveram lugar em 1992 nos termos da Lei 23/92, que remetia para Assembleia eleita a aprovação da Constituição (vide o art.o 14 da Lei de Revisão constitucional, bem como os artigos 158 e seguintes da Lei constitucional)

A Lei Constitucional de 1992, Lei no 23/92 de 16 de Setembro, grosso modo visou o seguinte:

­- Alterou a designação do Estado para República de Angola, do órgão legislativo para Assembleia Nacional e retirou a designação popular da denominação dos tribunais (Vide os art.o 1, 2, 120);

­- relativamente aos direitos fundamentais, introduziu alguns novos artigos visando o reforço do reconhecimento e garantias dos direitos e liberdades fundamentais, com base nos principais tratados internacionais sobre os direitos humanos a que angola aderiu (vide o titulo II);

­- No que concerne aos órgãos do Estado foram introduzidas profundas alterações que reformularam toda a redacção anterior. Proclamou­se a República de Angola como Estado democrático de direito (vide art.o 2) e como consequência os institutos típicos deste tipo de Estado constitucional, nomeadamente a supremacia da constituição e legalidade; separação de funções e interdependência dos órgãos de soberania (vide art.o 53 e a alínea c) do art.o 54), bem como o respeito a vida e dignidade da pessoa humana (vide os art.o 20, 21 e 22).

-­ Institui­-se um sistema de governo semipresidencial;

­Assim como confiou­se os processos de fiscalização constitucional ao Tribunal constitucional vide o art.o 6 da Lei de revisão constitucional e o art.o 125 da Lei 23/92, (pelo que do ponto de vista classificatório Angola possui um sistema de fiscalização jurisdicional concentrado especial, somente os tribunais têm competência para aferir questões jurídico­constitucionais, especial – tendo em conta que somente o tribunal no âmbito da estruturação do poder judicial tem como competência de decidir questões de natureza jurídico­constitucional. vide Miranda, Jorge – Teoria do Estado e da Constituição. Coimbra Editora. Coimbra: 2002, p. 720­721)

A Lei constitucional de 92 num sentido de transitoriedade remetia para Assembleia eleita a aprovação da constituição angolana, facto não concluído em 92 como consequência da instabilidade político­militar que se instalou em Angola, bem como a não tomada de posse de alguns deputados da oposição, pelo que dezasseis anos depois, isto é, em 2008, realizou­se pela segunda vez as eleições legislativa e em 2010, conclui­se o processo desencadeado em 1991e 1992, com a aprovação da Constituição da República de Angola – CRA.

A constituição da República de Angola, reiterou a vontade do legislador da ruptura constitucional e num gesto de continuidade define Angola como República soberana, democrática e de direito vide os artigos 1o e 2o respectivamente todos da Constituição, pelo que não há uma nova ideia de direito tão pouco alteração substancial das estruturas do Estado, ou seja, do Regime político, angola desde a ruptura constitucional 91 que instaurou a II República e continua na II República, facto que não se pode confundir com a terceira legislatura, assim somente de forma errónea se pode afirmar que estamos na III República.

Do ponto de vista classificatório a constituição que ora completa cinco anos é democrática ou popular em virtude de ser aprovada por uma assembleia nacional constituinte eleita pelo povo; é unitextual tendo em conta que tudo o que é constitucional em termos formais está na constituição; rígida porque as normas constitucionais só podem ser modificada através de um procedimento de revisão especifico e dentro de certos limites formais, circunstanciais e materiais vide os 233, 234, 235 e 236; não é compromissória tendo em conta que não resultou de pactos das forças politicas e sociais; é longa como consequência de ser unitextual e por fim é programática, ou seja, contem normas tarefas ou normas que enunciam os fins do Estado e cuja execução necessitam da intervenção do legislador ordinário, bem como a existência de condições materiais vide o art.o 21o.

Em termos de praticidade da Constituição da República de Angola ainda é discutível a sua aplicação real se entendermos que a teleologia do principio do Estado democrático de direito ficou afectado quando por exemplo o tribunal constitucional entendeu que não se pode interpelar os auxiliares do titular do poder executivo, assim como a constituição não prevê qualquer mecanismo de fiscalização da actividade do titular do poder executivo, salvo alguns mecanismos previstos nos artigos 127, 128 e 129. 

Apesar do desenvolvimento que se verifica no que concerne aos direitos fundamentais, a constituição muitas das vezes tem tido papel de constituição semântica ou instrumento, uma vez que muitos dos direitos liberdades e garantias não são respeitados, quer por entes públicos assim como pelos cidadãos, estes últimos muitas das vezes por desconhecimento.

A inexistência até então das autarquias locais, pode postular uma inconstitucionalidade por omissão e, consequentemente uma inconstitucionalidade material em virtude da violação do principio do Estado democrático, ou seja, as autarquias resultam do principio da democracia participativa ( vide Oliveira, António Cândido de – Direito das Autarquias Locais. 2a edição. Coimbra Editora. Coimbra: 2013, p. 79­82), mas esta posição só seria viável se algumas condições socioeconómicas e organizativo­funcionais fossem acauteladas.

*Mestrando na fase de investigação em Direito na especialidade de ciências Jurídico­Políticas pela Universidade Autónoma de Lisboa