Luanda - O dia 22 de Fevereiro de 2002 é uma data memorável. Lembro-me que na altura vivia no Cacem, Conselho de Sintra e trabalhava aí bem perto, em Massamá Norte numa obra onde se estava a construir uma urbanização de mais de 50 edifícios e que nela trabalhavam homens e mulheres de várias nacionalidades. Os angolanos como eu éramos por aí uns 20.

Fonte: Facebook

Neste dia que parecia ser completamente normal, estava eu e os meus colegas a trabalhar, creio que no reboque de um elevador. Eu era servente.

Estávamos nós entretidos a cantarolar umas musicas da banda (quando trabalhávamos, cantávamos e em outros momentos cada um contava a sua história da banda para ver se o tempo passava mais rápido. Estávamos no reboque quando de repente lá de baixo ouvimos uma voz gritando: SAVIMBI MORREU, SAVIMBI MORREU, SAVIMBI MORREU.

Todos nós, os angolanos, paramos para percebermos se estávamos efectivamente a ouvir bem. E rapaz que gritava já bem próximo de nós continuou a gritar: SAVIMBI MORREU....

Éramos naquele andar, 4 angolanos e mesmo sem a confirmação da veracidade daquela informação nos metemos todos a gritar de júbilo. Abraçamos-nos. Creio que alguns choraram emocionados com aquela noticia. Quem não queria ver morto o sanguinário? Quem não queria ver morto aquele que era há muito considerado o grande entrave para a Paz em Angola?

Ligamos para Angola para obter a confirmação da notícia que de facto veio a confirmar-se. O homem estava morto.

Quase já não trabalhamos empolgados que todos estávamos.

Foi fixe celebrar a morte de Jonas Malheiro Savimbi.

Quando despegamos (despegar é o mesmo que sair do trabalho, na gíria das obras lá na tuba) e já a caminho de casa na estação de Barcarena, havia muitos angolanos que com cervejas e garrafas de vinho na mão, festejavam também eles a morte de SAVIMBI. E não eram só nós os angolanos que festejavam a morte, muita gente de outras nacionalidades também o fizeram. No comboio era só festa.

Em casa, juntamo-nos num número de pelo menos 30 pessoas e lá fizemos a nossa festa. Foi uma festa rija que só terminou porque a PSP (Polícia Pública) foi chamada porque fazíamos muito barulho. Paramos e fomos dormir todos contentes tipo que era o fim duma (fim duma é o dia de receber o ordenado. Neste dia todos dormem contentes).

É óbvio que não se festeja a morte de ninguém, mas convenhamos, a morte daquele homem era esperada por todos e mais de 90%dos angolanos na diáspora o fizeram. Sabíamos que com aquela morte muita esperança renascia. Sabíamos que não mais teríamos que continuar longe da banda com receio de ir a tropa para servir de carne de canhão.

Ontem dia 22 de Fevereiro de 2015, ao ver no facebook tantas homenagens em honra deste homem, um único pensamento me veio à cabeça: porque que não se decreta que a pronunciação da palavra Savimbi seja crime?

Todos nós estamos lembrados das barbaridades que este homem cometeu a nós, a todos nós angolanos. Ele não só matou, não só mutilou, não só rebentou com este país, não só adiou com o sonho de todos nós, ele também martirizou a nossa mente, as nossas emoções e esperanças. Savimbi derrubou, durante anos, com as nossas mais legítimas expectativas de poder viver num país em Paz e isto nem a sua morte pagou.

Paz a sua alma, mas os seus filhos que me perdoam, os seus admiradores e correligionários que me desculpem, mas Jonas Savimbi teve algo que bem mereceu.

Como escreveu alguém ontem no Facebook, o dia 22 de Fevereiro devia ser considerado feriado nacional e o dia da Paz.