Lisboa - As acusações criminais por difamação e denúncia caluniosa contra o jornalista angolano Rafael Marques de Morais inspiram graves preocupações: apesar daquilo que foi entendido como um acordo negociado entre Rafael Marques de Morais e as autoridades governamentais de Angola na semana passada, é profundamente inspirador de preocupação que esse acordo esteja agora a ser revertido. Os dados indiciam que o tribunal irá proferir uma condenação, que pode resultar numa pena de prisão e a revogação por tempo indefinido do seu passaporte.

Fonte: Publico

Este caso reflete a mais vasta deterioração do clima da liberdade de expressão em Angola, incluindo o aumento do recurso a processos judiciais por difamação e por denúncia caluniosa contra jornalistas, e os abusos rotineiros ou interferência por parte da polícia na actividade de jornalistas, activistas e manifestantes que exercem pacificamente o direito de liberdade de expressão. As organizações e os indivíduos abaixo assinados instam a que o Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, tome medidas imediatas para inverter estas preocupantes tendências.

Rafael Marques de Morais tem sido regular e repetidamente alvo de perseguição por parte das autoridades angolanas, em resultado do seu trabalho jornalístico. As 24 acusações criminais, por difamação e por denúncia caluniosa, inicialmente apresentadas contra Rafael Marques de Morais são exemplo da mais recente tentativa por parte de responsáveis governamentais angolanos para silenciar o seu trabalho de reportagem.

O jornalista tem reportado sobre uma série de casos de alegada corrupção ao mais alto nível e de alegadas violações de direitos humanos, e desenvolve investigações em matérias sensíveis sobre alegadas violações de direitos humanos nas regiões diamantíferas de Angola. Não há conhecimento de nenhuns esforços sérios feitos pela Procuradoria-Geral angolana para investigar de forma imparcial e credível as alegações dos crimes que Rafael Marques de Morais reportou e pelos quais foi acusado de difamação e de denúncia caluniosa.

O Governo de Angola parece estar a usar as leis criminais de difamação para inibir Rafael Marques de Morais de fazer o seu trabalho jornalístico sobre direitos humanos. E ao fazê-lo está a violar o direito de liberdade de expressão, tal como consagrado no Artigo 9 da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e no Artigo 19 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. Impedir Rafael Marques de Morais de fazer o seu trabalho jornalístico sobre direitos humanos é contrário também à Declaração das Nações Unidas sobre os Defensores de Direitos Humanos.

As acusações contra Rafael Marques de Morais estão igualmente em oposição à decisão de dezembro de 2014 do Tribunal Africano para os Direitos Humanos e dos Povos num caso de difamação contra um jornalista no Burkina Faso, e segundo a qual as penas de prisão como sanção para a difamação violam a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

As penas criminais são punições desproporcionadas aos danos de reputação de um indivíduo e infringem a liberdade de expressão. As leis de criminalização da difamação e da denúncia caluniosa são propícias a abusos, como é bem demonstrado no caso de Rafael Marques de Morais, resultando em consequências desproporcionalmente duras. A revogação das leis de criminalização da difamação e da denúncia caluniosa feita em vários países demonstra aliás que estas legislações não são necessárias para proteger a reputação.

Assim, as organizações e os indivíduos abaixo assinados reiteram vivamente a necessidade de o Presidente José Eduardo dos Santos tomar medidas imediatas para deixar claro que o Governo de Angola respeita o direito dos jornalistas, activistas e outros a exercerem o direito de liberdade de expressão. Além disso, insta-se o chefe de Estado a prontamente desenvolver esforços para abolir as leis criminais de difamação e de denúncia caluniosa em Angola.

Sarah Margon, Directora em Washington da Human Rights Watch

Deprose Muchena, Director para a África da Amnistia Internacional

Teresa Pina, Directora Executiva da Amnistia Internacional Portugal

Steve Hawkins, Director Executivo das Amnistia Internacional Estados Unidos

Phil Bloomer, Director Executivo do Business & Human Rights Resource Centre

Mary Lawlor, Fundadora e Directora Executiva do Front Line Defenders

A. Lemon, Professor emérito, Mansfield College, University of Oxford

Aline Mashiach, Chefe do Departamento Comercial e Marketing, Royalife LTD

Andreas Missbach, Director de Operações Conjuntas, Berne Declaration, Switzerland