Luanda - No dia (28 de Maio) em que o Tribunal Provincial de Luanda (TPL) condenou  Rafael Marques a pena de prisão suspensa de 6 meses por dita calúnia e difamação contra 7 generais das Forças Armadas Angolanas e suas empresas  envolvidos nos negócios de diamantes, completaram-se exactos 46 dias sobre a data em que o jornalista e activista publicou no seu sítio, makaangola.org., uma assombrosa e desconcertante denúncia de roubo de quase 100 milhões de dólares.

 


Fonte: Club-k.net

O Fundo Soberano de Angola comprou a Kijinga S.A

Numa sustentada investigação que publicou no dia 12 de Abril no seu site, o investigador Rafael Marques denunciou uma operação que, do topo à base, configura um crime: em Janeiro deste ano, o Fundo Soberano de Angola (FSDEA), presidido por José Filomeno dos Santos, filho varão do Presidente da República, transferiu 9 948 750 000 de kwanzas (equivalente ao câmbio da altura  a cerca de US $100 milhões) à empresa Kijinga S.A.


Na contabilidade do Fundo, a milionária transação teve como única justificação o “pagamento de uma nota de cobrança”.
Mas o que é a Kajinga S.A. e do que se ocupa?


De acordo com o makaangola. org., a Kijinga S.A. foi constituída a 4 de Dezembro de 2012 e o seu objecto social é muito elástico, compreendendo actividades como “a prestação de serviços de gestão e apoio às empresas, a realização e desenvolvimento em todas as suas vertentes de estudos e projectos de qualquer natureza, incluindo projectos agrícolas e projectos industriais, a promoção imobiliária, a compra, venda e locação de bens móveis ou imóveis, o comércio geral por grosso ou a retalho, incluindo importação e exportação, e, em geral, o exercício, directa ou indirectamente, de quaisquer actividades de natureza comercial ou industrial permitidas por lei.”


O portfólio de actividades da Kijinga SA inclui, também, empreitadas tais como “adquirir e alienar participações em sociedades, de direito nacional ou estrangeiro, com o objecto igual ou diferente do seu, bem como associar-se com outras pessoas jurídicas para, nomeadamente, constituir novas sociedades, agrupamentos de empresas, consórcios, conta em participação e associações em participação”.


Estranhamente, e não obstante todo esse universo de actividades, a Kijinga S.A não tem um único funcionário a seu serviço. Pelo menos que conste na Administração Geral Tributária do Ministério das Finanças. Por outro lado e apesar do gigantismo do seu objecto social, a Kijinga S.A nem sequer sede social tem. Divide o escritório com o Banco Kwanza Invest (BKI) , à Avenida Comandante Jika, n.º 150, junto à Maternidade de Luanda. Rafael Marques deslocou-se àquele endereço e o que constatou foi  que “ partir da antessala vê-se apenas uma porta que dá para o interior do banco e da empresa Kijinga S.A.”.


O Banco Kwanza Invest, para os que ainda não sabem, foi criado pelo filho varão de José Eduardo dos Santos. Em 2012, ele renunciou formalmente ao cargo de administrador do BKI, do qual era sócio maioritário, e anunciou a intenção de desfazer-se das suas acções por forma a evitar conflitos de interesse que adviriam da sua condição de administrador do Fundo Soberano de Angola.


Não obstante essa renúncia formal, José Filomeno dos Santos continuou “geneticamente” vinculado ao banco. É nele, por exemplo,  que está domiciliada a conta nº AO06005700000014010400124 para a qual o Fundo Soberano drenou a  milionária quantia de 9 948 750 000 de kwanzas destinada a liquidar a “nota de cobrança” a favor da Kijinga S.A.


Rafael Marques não tem a menor duvida que a Kijinga S.A. é uma empresa-fantasma que serve para dar cobertura à transacções obscuras entre o Fundo Soberano de Angola, presidido por José Filomeno dos Santos, e o Banco Kwanza Invest, criado pelo mesmíssimo José Filomeno dos Santos.


Perante a possibilidade, oferecida pelo Maka Angola, de justificar a milionária transação, José Filomeno dos Santos, o presidente do Fundo Soberano de Angola, não tergiversou.


“O Fundo Soberano de Angola realizou o capital próprio de 9.950.750.000,00 Kwanzas num veículo comercial que está focado para a criação de incubadoras de micro-negócios para os empresários angolanos”, escreveu em resposta ao jornalista e activista.


Ou seja, o Fundo Soberano de Angola comprou a Kijinga S.A., uma empresa que não saiu do papel, pelo valor aproximado de 100 milhões de dólares.


Mas, como todas as empresas-fantasmas, a Kijinga SA não seria a verdadeira beneficiária de milionária transferência. Num chamado “Esclarecimento Público”,  colocado no Jornal de Angola do dia 17 de Abril, o Banco Kwanza Invest revela que em 2012 comprou as acções da  Kijinga S.A. e depois revendeu-as ao Fundo Soberano de Angola.


Por aqui fica claro que a Kijinga S.A foi usada apenas como um entreposto. O verdadeiro beneficiário da transferência, que foi dada a conhecer tanto à direcção do Banco de Poupança e Crédito quanto ao governo do Banco Nacional de Angola, foi o BKI.


No comunicado, o BKI nega que a Kijinga S.A tenha como objecto social “ a realização e desenvolvimento em todas as suas vertentes de estudos e projectos de qualquer natureza, incluindo projectos agrícolas e projectos industriais, a promoção imobiliária, a compra, venda e locação de bens móveis ou imóveis”  e atribui-lhe a vocação de criar “empresas em fase de arranque para micro-negócios de empresários angolanos.” Ou seja, o próprio BKI compreendeu que cairia mal que a  Kijinga S.A., uma empresa que, entre outras actividades, se propunha a comprar e vender bens móveis e imóveis, tivesse uma tão alta cotação no mercado. Daí que decidiu dourar-lhe um pouco o objecto social.


A lenga-lenga do BKI não permite perceber lá muito bem os contornos da Kijinga SA, mas  o Fundo Soberano de Angola definiu a sua aquisição como o “primeiro projecto de integração social no país como um empreendimento comercial sustentável”.


Só os “cientistas” saberão explicar como é que a simples aquisição de uma empresa, criada com o propósito de vender e comprar bens móveis e imóveis, pode converter-se num “projecto de integração social”.  Integração de quem?


De qualquer forma, a transacção deixou claro que o Fundo Soberano Angolano e Banco Kwanza Invest são verso e reverso da mesma moeda. No comunicado do banco, as suspeitas de promiscuidade transformaram-se em certezas.


Perante a montanha de indícios de roubo e corrupção reunidos por Rafael Marques, esperava-se que instituições como o Tribunal de Contas e a Procuradoria-Geral da República juntassem sinergias para resgatar tão rapidamente quanto possível o Fundo Soberano de Angola, património público, das mãos de José Filomeno dos Santos. 


Em qualquer país sério e adulto, logo após a publicação da grave denúncia o presidente do FSDEA teria recebido a visita de oficiais de justiça a  intima-lo  a aguardar em casa os desenvolvimentos do subsequente inquérito.

 
Em qualquer país normal, José Filomeno dos Santos deveria ser preventivamente afastado das cercanias do FSDEA para não correrem perigo os mais de 5 biliões dólares que o pai e Presidente da República colocou sob a sua (irresponsável) guarda e gestão.


No entanto, a caminho de dois meses sobre a gravíssima denúncia, o presidente do FSDEA está livre, com a implícita autorização de continuar a desferir golpes ao erário público.


Por isso, a sentença que recaiu sobre Rafael Marques não pode merecer outra leitura: é a vingança dos sectores do regime mais identificados com a roubalheira e o saque do país.


Na documentada denúncia de RM não  está apenas o filho do Presidente da República. A denúncia cobre todos aqueles que normalizaram no País o roubo, o saque e o enriquecimento sem causa. São esses sectores  que se movimentaram no sentido de quebrar o jornalista e activista.


Com o seu ensurdecedor silêncio, tanto o Tribunal de Contas quanto a Procuradoria-Geral da República agem como se as denúncias de Rafael Marques visassem não pessoas de carne e osso que manuseiam dinheiro de todos os angolanos, mas figuras abstratas. Não se lhes ouviu um só pio e não se lhe registou a menor diligência no sentido de apurar as denúncias. Nada. Nyet!


Com a louvável excepção da CASA-CE, a oposição também ficou siderada. No caso do MPLA,  o que surpreende não é o seu silêncio. Cúmplice da gatunagem e da rapina dos recursos do país, o que surpreende no MPLA é que não tenha, ainda, patrocinado uma manifestando de rua aplaudindo e encorajando mais esse exemplo de “empreendedorismo”  do filho varão do seu chefe.


Com o aval do MPLA, há pessoas neste país que vêm  permanentemente renovadas as licenças para roubar e enriquecer ilicitamente sem temer o menor castigo.


Com o MPLA no poder, os criminosos de colarinho branco não têm por e com que se preocupar. Neste País, lei e justiça só actuam contra pequenos assaltantes de galinheiro. Pessoas bem encostadas só se confrontam com a justiça a seu pedido, e mesmo assim sem garantia de serem atendidas.  Não é sem razão que as cadeias do País estão apinhadas apenas de pés descalços. Isso não é uma casualidade.