Alemanha - O padre Raúl Tati, uma das vozes sonantes defensoras da causa do povo de Cabinda, considera que a gestão política que o regime de Eduardo dos Santos impôs ao longo de 40 anos foi a mais desastrosa possível.


Fonte: DW

Não há dados exatos, mas tendencialmente o número de presos políticos poderá aumentar em Angola na sequência da operação policial que investiga os últimos acontecimentos em Luanda, imputados a alegados crimes contra a segurança do Estado.

O padre Raúl Tati diz, em entrevista à DW, que o Governo do Presidente José Eduardo dos Santos está a endurecer cada vez mais o sistema de repressão, atropelando todos os dias as liberdades fundamentais dos cidadãos: "Isto de alguma maneira nos dá a entender que o regime está deseperado, ou está atrapalhado."

Segundo o padre Raúl Tati, a regra que vigora no território de Cabinda é a repressão das expressões e sentimentos políticos, através de detenções, perseguições e até mesmo de execuções: "Porque há várias pessoas que desapareceram em Cabinda, que foram executadas, exatamente por causa do problema de Cabinda. A questão do José Marcos Mavungo e de Arão Bula Tempo, tudo enquadra-se dentro dessa perspetiva."

Pressão para desistirem da causa

São práticas recorrentes em Angola, acrescenta este membro do Grupo de Apoio aos Presos Políticos Angolanos (GAPPA). Um dos exemplos é o de Alves Kamulingue e Isaías Cassule, que desapareceram após detenção e execução pelo regime de Luanda.

Entretanto, Marcos Mavungo e Arão Tempo, o primeiro ativista ainda preso em Cabinda, tem recebido assistência médica por parte da esposa do padre Tati, mas com vários constrangimentos nos serviços prisionais.

Relativamente à isso o padre diz que "a leitura que se faz desses constrangimentos é simplesmente que querem levá-lo a desanimar, desencorajá-lo a continuar a prestar assistência. O que significa que querem que aquela gente que está lá, sobretudo Marcos Mavungo que tem o estado de saúde bastante periclitante, que tenha um colapso qualquer lá dentro da cadeia sem assistência médica."

Raúl Tati, que também já esteve preso durante onze meses no enclave, afirma que as cadeias não são hotéis de cinco estrelas: "Já tive essa experiência pessoalmente. São cadeias com um sistema carcerário muito rigoroso. O que sei é que aqueles que são imputados de crimes contra a segurança de Estado têm uma situação mais apertada nas cadeias, portanto há uma vigilância mais reforçada contra eles, e não o fazem contra os outros delinquentes.

Falta de confiança no sistema de justiça

Por outro lado, os procedimentos e prazos legais de prisão não são respeitados. Comenta o nosso entrevistado: "Quem fala disto fala também do próprio sistema judicial angolano que enferma de muitos vícios em termos de prazos e celeridade processual e até mesmo de uma certa submissão ao poder político, porque o sistema judicial não é independente."

"Muitas vezes" – reforça o ativista cabindês – "os Procuradores, os Magistrados judiciais ou os Juizes agem sob a pressão das forças de segurança, sobretudo quando se trata de questões ligadas à política". E como tal, advoga, os presos políticos não têm chance de serem ouvidos com justiça.

Raúl Tati diz: "Eu não acredito em processos justos em Angola, porque para que haja processos justos é preciso que os tribunais sejam completamente independentes."

O padre de Cabinda não tem dúvidas que reina em Angola um regime de ditadura que facilmente se confirma através dos factos. Um deles é a repressão contra a seita de Kalupeteka, no Huambo, que tem relação com esta onda recente de detenções: "De modo que quem fala dos acontecimentos do Monte Sumi, no Huambo, quem fala das atuais detenções, tudo isto está dentro desta natureza do regime, que é um regime que pode fazer tudo. A violência em Angola é uma questão genética do regime."

No meio de todo este cenário, Raúl Tati admite que o futuro de Cabinda ainda é uma incerteza, enquanto continuar este regime no poder em Angola: "O que está a acontecer no resto de Angola é apenas uma mostra que a natureza deste regime não é para resolver os problemas, este regime não é para a felicidade dos angolanos, nem tão pouco dos cabindas."

Para o ativista, a prática não mudou 40 anos depois da independência, que sucedeu os longos anos de luta de libertação.