Luanda - A Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal (DNIAP) interrogou ontem o activista cívico José Gama por suspeita de ligação ao portal Club-K, ao jornalista Rafael Marques de Morais e à empresária Lídia Amões, na sequência de uma queixa apresentada pelo procurador-geral da República, general João Maria de Sousa.

 

Fonte: Maka Angola

José Gama disse ao Maka Angola que a DNIAP, um órgão da Procuradoria-Geral da República (PGR), “quer saber se conheço o senhor Rafael Marques”.

 

Segundo o activista, a investigadora Elizeth Paulo mostrou-lhe duas notícias que saíram no Club-K – “PGR Estrangula Grupo Valentim Amões”, de 16 de Junho passado, e “PGR Vinga-se de Lídia Amões”, de 24 de Junho – e interrogou-o sobre a autoria e as fontes das notícias.“Expliquei à DNIAP que Club-K é um portal da diáspora baseado nos Estados Unidos da América e que as perguntas devem ser dirigidas aos seus administradores. As autoridades devem fazer pesquisa na internet, que indica onde o portal está alojado”, disse Gama. E acrescentou: “Perguntei sobre a razão das perguntas sobre o senhor Rafael Marques e o que a minha relação com ele tem a ver com o caso, mas não obtive qualquer resposta. Acho muito estranho que eu seja chamado para responder a uma queixa do procurador-geral da República para me perguntarem se conheço o Rafael Marques, num processo sem nexo.”

 

O Maka Angola sabe, no entanto, que este tipo de atitude por parte da PGR não é incomum. A empresária Lídia Amões, por exemplo, encontra-se sob medidas de coacção da PGR há quase dois anos, sem que tenha sido acusada, até à data, de ter cometido algum crime.

 

As medidas de coacção incluem a interdição de viajar para outra província ou para o exterior do país, a sua apresentação quinzenal na DNIAP e a proibição de mudança de residência ou emprego.

 

Segundo um advogado contactado por este portal, que prefere o anonimato, “essas medidas de coacção, na realidade, correspondem a um termo de prisão domiciliária”.

 

Por sua vez, Rafael Marques de Morais é o fundador do Maka Angola, no qual publica e assina regularmente os seus textos. É bem conhecida a sua opinião sobre o procurador-geral da República. A 17 de Julho, em carta aberta ao presidente, escreveu:“O procurador-geral da República, general João Maria de Sousa, precipitou-se ao anunciar publicamente, enquanto zelador da legalidade, que os jovens estariam a preparar um golpe de Estado contra si. Desacreditou o que resta de seriedade deste órgão judicial. O general João Maria de Sousa é muito mau. É péssimo a servi-lo. A descrença no sistema judicial não contribui para a sua segurança.”Em 2009, o jornalista investigou os negócios privados do procurador-geral da República, tendo concluído que, “em termos legais, as actividades empresariais do general João Maria Moreira de Sousa, enquanto magistrado, ferem, de forma grave, a lei fundamental do país”.

 

No entanto, a 20 de Setembro de 2013, os jornalistas Rafael Marques de Morais e Alexandre Solombe foram violentamente atacados pela Polícia de Intervenção Rápida (PIR), à saída de um julgamento, e apresentaram queixa à PGR.

 

O general João Maria de Sousa, a quem a queixa foi directamente endereçada, abafou o caso. Os efectivos da PIR destruíram os equipamentos de trabalho de ambos jornalistas e confiscaram um cartão de memória, sem razão aparente.“Parece-me mais um acto de raiva do que de justiça”, reagiu o jornalista.

 

“Essa obsessão com o meu nome faz-me lembrar um episódio que ocorreu a 5 de Junho passado. Dois militantes e empresários que se dirigiam para o acto de proclamação do Comité de Especialidade dos Empresários e Empreendedores do MPLA, ao notarem a minha presença no mecânico a quem recorreram, perguntaram-lhe por que diabo consertava o meu carro. Ao manifestar-se independente, os dois militantes afirmaram que quando chegar a hora de eu ser “metralhado”, o mecânico também poderá ser atingido como dano colateral”.

 

“Metralhado” é o termo usado para os disparos efectivos de uma metralhadora contra alguém.“Infelizmente, essa é a verdadeira justiça que temos neste país, a do poder arbitrário”, rematou Rafael Marques de Morais.