Luanda - Filomeno Vieira Lopes, do Bloco Democrático, duvida que os dirigentes africanos deem ouvidos às palavras do Presidente norte-americano sobre a permanência eterna no poder. Mas acredita que poderão levar a pressões.

Fonte: DW

O discurso histórico do Presidente norte-americano na sede da União Africana (UA), na terça-feira (28.07), continua a dar que falar. Um dos temas focados por Barack Obama foi a necessidade de combater a corrupção para poder explorar melhor o potencial económico de cada país.


Além disso, o Presidente deixou também "recados". Obama disse que "ninguém deve ser Presidente para a vida". Mas não avançou nomes. Já o opositor angolano, Filomeno Vieira Lopes, do Bloco Democrático, refere que a crítica assenta que nem uma luva ao Presidente José Eduardo dos Santos, que está há 36 anos no poder.

DW África: O que achou das palavras de Barack Obama?

Filomeno Vieira Lopes (FL): A frase vai muito de encontro a tudo o que se tem passado em Angola. No interior dessa citação existe a ideia de que a Constituição e as leis devem ser obedecidas. Aqui em Angola temos o problema de termos não só uma pessoa, mas um partido político que já se viciou no poder. Isso dificulta o jogo democrático porque esse longo tempo significa muitas vezes que as personalidades, que estão no poder, têm que recorrer a fraudes. Portanto, não há verdade eleitoral. E a democracia não se faz. Eu penso que esta frase vai também de encontro à juventude, que diz que trinta e tal anos no poder do Presidente da República de Angola é muito tempo. É uma afirmação que tem o nosso apoio.

DW África: No discurso da sede da União Africana, Barack Obama também falou diretamente sobre as trocas comerciais com Angola, nomeadamente na área da energia. No ano passado, os Estados Unidos compraram 150 mil barris de petróleo por dia de Angola. Isto não pode ser visto como um apoio ao regime atual?

FL: Os Estados Unidos têm com Angola uma relação que também é de dependência energética. Ultimamente, os EUA têm tentado produzir mais no seu próprio país e, portanto, é reduzida esta dependência. No mundo, o que tem prevalecido é uma política de interesses e essa é a nossa crítica. E com certeza relativamente a Angola a questão do petróleo foi sempre crucial neste tipo de relacionamento. Não haverá diminuição dos negócios com Angola por causa de questoes de carácter político.

Aliás, temos exemplos a nível mundial, que independentemente de existirem Estados democráticos ou ditatoriais, os EUA mantêm relações económicas também. Portanto, não usa isso para pressionar qualquer outro tipo de relações mais ativas no domínio social. E no caso de Angola , o efeito China cria também um ciúme aos países ocidentais. Com certeza que aí esses países, incluindo os Estados Unidos, querem ver aprofundadas as relações económicas com Angola para fazer um certo contra-balanço. Portanto, vamos ter que continuar a desenvolver internamente esforços para que o nosso país seja um país com mais valores. Porque depois há uma contradição: Obama levanta, e bem, problemas como corrupção, como a noção restritiva da democracia e as questões de género. Mas todas essas questões estão ligadas ao desenvolvimento do capital humano e de instituições. Portanto, se não se ataca o problema dos valores, essas questões vão permanecer.


DW África: Mas acha que é um discurso que ficará pelas palavras?

FL: Penso que pode nortear algumas posições, mas não temos muita confiança que isto possa criar situações em que as lideranças africanas hoje se sintam perturbadas. De qualquer maneira, isto também pode ajudar a suportar a argumentação em diversos setores de forma a pressionar mais as suas lideranças internas em África e no nosso caso em Angola.

DW África: E é isso que pretende fazer?

FL: Concerteza que sim. E naturalmente também vamos confrontar sempre os próprios Estados Unidos na política que têm aqui entre nós com esse discurso da sua liderança.