DECLARAÇÃO DE VOTO

Luanda - A prisão preventiva é uma medida de restrição de liberdade de carácter cautelar, decretada pelo Magistrado, o processo de instrução criminal, sendo que para a sua efectivação, é necessário a existência de requisitos, tais como: prova de existência do crime (materialidade) e indícios suficientes de autoria do crime. Ou seja, a decisão que decreta a prisão preventiva, também deve indicar a necessidade de indícios inequívocos da existência do crime e sua autoria, além de se exigir que o delito praticado pelo agente activo da medida, seja doloso, e punido com pena de prisão maior, à luz do CPP.

Fonte: CASA-CE

A prisão preventiva não poderá ser decretada quando estiverem presentes os pressupostos da liberdade provisória. Igualmente, quando estiverem presentes quaisquer dos pressupostos excludentes de criminalidade, fica a prisão preventiva proibida de ser decretada.

As medidas cautelares, nomeadamente a prisão preventiva, são instrumentos ao serviço da garantia do processo de conhecimento do cometimento do crime e do autor ou autores do mesmo. São portanto, instrumentos de outro instrumento, ou seja, instrumentais ao Direito Penal. Daqui se infere naturalmente, que a incidência da prisão preventiva, é uma medida cautelar excepcional dentro do ordenamento jurídico, com incidência no campo da liberdade pessoal do cidadão. Deste modo importa compreender em que momento, tal medida afronta os princípios constitucionais resguardados pela CRA e consequentemente, as hipóteses da sua admissibilidade. Nesta conformidade, pode­se concluir que caso a prisão preventiva não seja utilizada nos estritos limites permissivos, invadirá o campo dos direitos fundamentais, particularmente em sede dos princípios que guarnecem o cidadão, em evidente mecanismo de antecipação dos efeitos da pena.

A constrição da liberdade do cidadão por meio de prisão, no contexto da Constituição vigente, é tida como medida excepcional de “ultima ratio”, na aplicação de uma sanção às infracções penais. Isso porque a liberdade (aqui tomada na sua acepção stricto senso de liberdade de locomoção, do direito de ir, vir e permanecer) é a regra na configuração do Estado Democrático de Direito que vivemos ou deveríamos viver.

Apesar disso, e mesmo assim, observando­se o cometimento de crime, faz­se necessário levar em consideração os pressupostos processuais e o índice de autoria e materialidade do crime (fumus commissi delicti), bem como os pressupostos cautelares da conveniência da instrução criminal e do asseguramento da aplicação da lei penal (periculum libertatis), como pontos de partida para a determinação da prisão preventiva, enquanto medida cautelar. Além disso, alguns outros factores devem ser levados em consideração, haja em vista a excepcionalidade da medida e sua função instrumental de protecção à efectividade do processo. Destarte, destacam­se a título de conhecimento: a acessoriedade da medida, sua provisoriedade, sumariedade, homogeneidade e variabilidade. Caso portanto, não sejam observadas essas características da medida cautelar em geral, e da prisão preventiva em particular, corre­se o evidente risco de se tornar uma medida abusiva, antecipatória do cumprimento da pena ou mesmo prisão manifestamente ilegal e afrontadora dos princípios constitucionais.

Ora, por virtude de ter finalidade de limitação da liberdade do cidadão, não deve pois, ampliar a sua incidência mais do que a medida necessária para o seu alcance, ou mesmo do seu fim, para não incorrer na afronta aos direitos, liberdades e garantias fundamentais, ancorados na CRA, a todos aqueles que a sofrem.

Portanto, os fracos indícios de probabilidade de indicação de que alguém tenha cometido algum delito, não autoriza a imposição da constrição de sua liberdade na modalidade prisão preventiva. Porquanto, a prisão decretada nestas circunstâncias, reputa­se manifestamente ilegal, atentatório aos direitos fundamentais, em total confronto ao princípio da presunção de inocência. Hodiernamente, mesmo o jus puniendi, tem por obrigação executar a pena de acordo com os princípios constitucionais e, principalmente, dar à punição o carácter adoptado pelo ordenamento jurídico, pois não se pode olvidar que o preso, conserva todos os direitos não alcançados pela perda da liberdade. Assim, a privação da liberdade, deve perseguir um fim condizente com a democracia e os ditames constitucionais, razão pela qual até mesmo em matéria de Execução Penal, prevê­se que, além do carácter punitivo, a sanção penal deve ter como função a ressocialização do agente, isto é, preparar o agente criminoso a voltar à vida em sociedade, em condições para a “harmónica integração social deste”.

Chegados a esta encruzilhada doutrinal e dogmática, impende à consciência jurídica cujo fim último é a prossecução da justiça, não ser ético, nem moralmente aceitável, que ao invés de se perseguir a prossecução do princípio da celeridade processual, se pretenda em violação ao princípio da presunção da inocência, que o ónus da incapacidade organizativa do Estado, para a concretização desse desiderato quão fundamental, quanto directamente influenciador da paz e harmonia social, ao presumível agente criminal. Se efectivamente quisermos evoluir para os fins a que se destinam as medidas de coacção, nomeadamente a medida cautelar de privação de liberdade, a prisão preventiva, é ingente que mais do que partir para a perspectiva da construção de mais cadeias, como um certo sector auxiliar ao Titular do Poder Executivo defende, se enverede para a criação de condições para a prevenção do cometimento do crime, e no caso do seu cometimento, para a celeridade processual, enquanto garante da confiança no sistema e veículo para a concretização da paz e harmonia social.

Por considerar que a proposta de Lei ora em discussão, não dá garantias dos pressupostos acima elencados, e, propiciar longevidade na tomada de decisões, penalizando sobremaneira aquele que até prova em contrário, goza do princípio da presunção de inocência, votei contra esta proposta de Lei e disponho­me a trabalhar com todas as forças vivas da Nação, na concretização de uma Lei de Prisão Preventiva racional, não atentatória aos direitos, garantias e liberdades fundamentais vertidos na CRA, por forma a garantir a celeridade processual e consequentemente, a paz e a harmonia social.