Luanda - Observamos no país, com bastante frequência, exemplos de profundo e preocupante desrespeito ao Estado, à propriedade pública e privada ou alheia. Há também casos de desrespeito dos espaços públicos, e, inclusive, há registo de situações em que não se cuida bem da própria propriedade.

Fonte: Club-k.net

Os factos observados que nos inspiram a tratar este tema, resumem-se ao seguinte: Dano ou uso indevido de bem público; Desafio a autoridade do polícia; Bloqueio de via pública; Desvio de conduta de água pública; Destruição de troços de linha-férrea; Cobrança compulsiva de valores monetários por serviços não prestados; Apropriação ilegal de terreno; Desenvolvimento de actividade comercial e outros serviços em lugar impróprio; Despreocupação com a higiene e saúde publica; Tomar banho despido em plena via pública; etc. Na verdade, o que nos preocupa são os altos níveis de indisciplina que se confundem com o desrespeito ao Estado e à Lei e o atropelo às normas e regras de boa convivência social.

Cabe aqui, narrar um episódio, (em que fizemos o papel de observador participante), que ilustra bem a indisciplina e o sentimento de impunidade de muitos cidadãos: O camionista vendedor de burgau, em plena praça, só pode proceder a venda e entrega do produto após pagar obrigatoriamente determinado valor a um grupinho de jovens (vulgarmente chamados matocheiros) que não prestaram serviço algum, senão o de assistir a chegada do cliente.

As causas destes comportamentos podem estar ligadas à: Ineficiência e ineficácia da Administração Pública; Distanciamento da Administração Pública; Excesso de burocracia e de atitude de “Deixar Andar” generalizada; Falta de rigor na aplicação da Lei e das suas sanções; Baixa divulgação das leis e outras normas relacionadas ao comportamento social dos cidadãos bem como das respectivas punições; Taxa alta de desemprego; Carência de infraestruturais económicas e sociais; Crescimento acelerado da população e sua má distribuição territorial; Deficiência no ordenamento do território; Baixa cobertura policial do território; Redução do papel educador das famílias; Excesso de informalização da economia;

Nicolau Maquiavel (1449-1512), na sua obra O Príncipe, se interrogou, em clara alusão ao papel do Estado: “ …De tudo isso, resulta um dilema: Se mais vale ser amado do que temido ou se o contrário. O ideal é ser as duas coisas, mas como é difícil reunir as duas coisas, é muito mais seguro – quando uma delas tiver de faltar – ser temido do que amado”. Chamamos aqui Maquiavel, não obstante o contexto histórico muito diferente, para dizer que o reforço da autoridade do Estado ou do respeito ao Estado e à propriedade pública, ou o aumento da disciplina dos cidadãos, pode ser conseguido com recurso ao poder coercivo do Estado, à capacidade preventiva da Lei, à força da moral cívica e religiosa e ao poder educador da família e da escola. È preciso que estes factores conjugados criem o medo das punições que o Estado e a Lei podem impor.

O medo, tal como ensina a psicologia, tem o seu lado positivo, pois nos dá os sinais do perigo, das ameaças à nossa sobrevivência, nos ajuda a distinguir o que é bom ou mau para a nossa própria vida, bem como para a dos outros. As pessoas, pode parecer duro dizer, precisam, em nossa modesta opinião, aumentar os níveis de medo da Lei e do Estado, e das suas punições, para que adoptem melhor postura ante a propriedade pública ou de outrem, e mesmo em relação aos espaços públicos.

Contudo, convêm esclarecer que não nos referimos, àquele medo que paralisa, incapacita ou coarcta a liberdade e a democracia. Claramente nos referimos ao medo da punição por danificar o bem público e de outrem, medo da punição ou multa por delapidar o património do Estado.

Sendo imperioso melhorar o quadro de disciplina, aumentar o respeito pelo Estado e à Lei, sugere-se: - A concepção e implementação de programas de educação especialmente dedicados às Leis, normas e regras de boa convivência social urbana e rural; - Rigorosidade na aplicação e divulgação das Leis e outras normas relacionadas ao comportamento social; - Aceleração das medidas de redução da informalização da economia; - A adopção de medidas que reforcem a disciplina e responsabilização dos cidadãos; - Continuação da elevação dos níveis de escolaridade da população e de emprego dos jovens.

Não estamos a propor a adopção de medidas duras ou impopulares. Na verdade o que estamos a propor é a continuação ou o aprofundamento da campanha de educação cívica, levada a cabo, há alguns anos atrás, de regaste de valores cívicos e morais. Talvez fosse aconselhável produzir aquilo que alguns chamam de Manual do Cidadão, o qual comportaria, de forma clara e acessível, aspectos de educação cívica, moral e jurídica, bem como os deveres e direitos dos cidadãos.

A família, a escola, a igreja e outras instituições, precisam, com base em programas específicos, ampliar o foco na formação de bons cidadãos, disciplinados e respeitosos dos melhores princípios da convivência social e da Lei. Pois, o que sugerimos é justamente, a junção de sinergias para o resgate do respeito do bem público, privado, do espaço público, da Lei e do próprio Estado. Maquiavel sugere que o Estado pode ser duro, pode ser temido, mas não deve ser odiado.

Parece-nos, que ser rigoroso na restauração da disciplina dos cidadãos não restringe nem a sua liberdade, nem a democracia e não inspira ódios. De resto, a disciplina dos cidadãos é vantajosa para os governados e para a governação.

 

Luanda, 2 Outubro de 2015

⃰ Licenciado em Ciências Sociais e em Gestão de Empresas