Lima - O ministro das Finanças, Armando Manuel, encontra-se em Lima (Peru) desde segunda-feira a participar nos trabalhos da assembleia anual do Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial.

Fonte: Angop

A pretexto disso, concedeu entrevista à imprensa angolana para falar da conjuntura internacional e alguns temas de actualidade no país, numa altura em que o Executivo se apresta para submeter o Orçamento Geral do Estado (OGE) à aprovação da Assembleia Nacional.


Quais são os grandes temas em discussão nesta reunião anual conjunta do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional?

Armando Manuel (AM): Nós podemos começar com a avaliação do novo modelo operacional do Banco Mundial implementado em Julho de 2014, com o objectivo de melhorar a oferta de serviços do Banco Mundial. Isto é, um atendimento mais célere das demandas dos países membros. Destacamos uma análise pontual aos grandes objectivos estratégicos de desenvolvimento para o milénio.

Depois da conferência de Addis-Abeba, teremos a oportunidade de abordar de forma mais profunda, avaliar aquilo que são na realidade os desafios para a mobilização de recursos financeiros necessários para satisfazer os objectivos de milénio.

As reuniões anuais de 2015 decorrem num momento muito especial, em que fazemos uma análise ao estado da economia global, onde na generalidade assistimos uma desaceleração do crescimento económico, com excepção da reanimação assistida na economia americana e algumas economias avançadas.

As economias emergentes que, nos últimos anos, se constituíram na alavanca de crescimento da economia global estão neste momento assistindo um arrefecimento significativo nos seus índices de crescimento.

Pode destacar alguns países?

AM - Estamos aqui a destacar o caso do Brasil, da Rússia, da África do Sul e da China. Não obstante, encontramos na Índia um quadro resiliente, mantendo positiva a sua perspectiva de crescimento. Encontramos, a seguir, um conjunto de países com economia de fronteira, onde Angola faz parte.

Estes países, fortemente expostos pela baixa no preço das suas matérias-primas de exportação, estão todos eles sujeitos a ajustamentos do quadro fiscal e cambial, especificamente para os casos, em que a base da produção ainda se afigura bastante frágil e o nível de consumo comporta ainda uma forte parcela de produtos e serviços de importações.

Este quadro dá lugar de igual modo à desaceleração dos níveis de crescimento e em alguns casos o crescimento da inflação. Ora, este é o quadro que deverá ser objecto de reflexões profundas por parte dos principais condutores da política económica, académicos e outros profissionais reunidos na cidade de Lima.

Qual poderá ser o contributo de Angola nestas reuniões?

AM - Para além das extensas reuniões bilaterais com banqueiros e os encontros de alto-nível que deveremos manter com as autoridades de Bretton Woods, na generalidade Angola deverá constituir-se em caso de referência para variados painéis. Apraz-me referir que temos dois painéis a abordar as opções de política económica em ambiente de volatilidade dos preços das commodities e aqui teremos um cenário em que será apreciado o caso de Angola.

Ao lado do Chile, este painel terá a mesa os ministros das Finanças dos dois países, partilhando as opções de política com altos quadros do FMI e Académicos. Um segundo painel, em que Angola constitui referência, abordará o quadro das economias africanas de referência.

Como será esse diálogo de opções de política económica?

AM - Angola fará ainda abertura do painel de diálogo de opções de política económica a ser realizado pela 1a Constituência Africana do Fundo Monetário Internacional, que vai abordar a mobilização de recursos; o desenvolvimento em penetração dos mercados financeiros domésticos e mobilização de recursos privados; e a flexibilidade da política económica e a agenda de diversificação económica em ambiente de volatilidade de preços.

Teremos ainda a oportunidade de, no quadro de uma acção conjunta com Banco VTB da Rússia e o Standard Bank da África do Sul, partilhar com uma comunidade alargada de investidores o quadro de opções da política económica e as oportunidades de investimentos financeiros e reais para a economia angolana. Trata-se de uma acção importante no âmbito da elevação da percepção e reputação do país junto dos operadores das principais praças financeiras.

A declaração de Luanda no final do African Caucus terá algum tratamento neste fórum?

AM - As nossas sessões de trabalho vão culminar com duas importantes reuniões com a liderança do Banco Mundial e do FMI, contando com a presença do Dr. Jim Yong Kim e da Dra. Christine Lagarde, onde apresentaremos e discutiremos com cada um dos responsáveis a Declaração de Luanda e, mais uma vez, com as autoridades de Bretton Woods desenhar opções para aquilo que se constituem os grandes desafios de África, dentre os quais a cobertura das necessidades de investimento para infraestruturas, a melhoria do ambiente de negócios, o fortalecimento das instituições e o desenvolvimento humano, entre outros.

Permita aproveitar este quadro para uma abordagem em torno da proposta do próximo OGE que foi apreciado recentemente pelo Conselho de Ministros. Que metas e perspectivas para Angola em 2016?

AM - O Executivo angolano continua a trabalhar na conclusão da proposta do OGE para o exercício de 2016. Certamente esta é uma proposta orçamental que procurará equilibrar as fontes de recursos e o seu uso, procurando identificar um nível de endividamento moderado no quadro da responsabilidade fiscal para com as futuras gerações. Todavia, este será um orçamento que vai certamente cumprir com as responsabilidades básicas do Estado.

Destacamos aqui a remuneração dos servidores públicos, o compromisso com as obrigações contratuais de dívida, a garantia das funções básicas do Estado, quer em termos de despesa obrigatória e aquela despesa prioritária de funcionamento, assim como a devolução ou reanimação do investimento público necessário para alavancar o ambiente de negócios frutífero. O Executivo está a trabalhar no sentido de cumprir com a demanda legal de entrega do documento à Assembleia Nacional até dia 31 de Outubro.

Estão criadas as condições para o pagamento dos salários neste último trimestre, principalmente do décimo terceiro?

AM - O Executivo apreciou no mês de Setembro a proposta de programação financeira do Tesouro e principal instrumento de execução do Orçamento Geral do Estado. Esta proposta procura garantir o cumprimento dos pagamentos da despesa de pessoal, o pagamento das responsabilidades contratuais de endividamento do Estado e assegurar a garantia mínima das despesas de investimento.

À semelhança dos anos passados, em que no quadro da responsabilidade fiscal vem sendo adoptada na programação da despesa do pessoal um calendário dedicado procurando assegurar que os servidores públicos recebam as suas remunerações em tempo oportuno, faremos o mesmo este ano.

Todavia, contrariamente aos anos passados, em que iniciávamos o pagamento das remunerações do décimo terceiro no mês de Novembro, para este ano iniciaremos em Outubro. Este exercício de suavização e antecipação representa um esforço acrescido de responsabilidade fiscal, procurando assegurar que os servidores públicos realizem as suas opções de consumo da quadra festiva sem pressões.

Estes pagamentos vão decorrer de forma suavizada nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro, contrariamente ao exercício que vinha sendo feito apenas nos meses de Novembro e Dezembro. Assim, os servidores públicos podem ficar descansados.

O que dizer do momento actual da economia angolana?

AM - Ora nas condições actuais, porque o rendimento do petróleo constituiu até então a principal componente do rendimento nacional, a baixa do preço em mais de 60% deixou o país mais pobre. Esta situação obriga a que todos passemos a trabalhar mais para suprir esta baixa, obriga que tenhamos de revisitar a qualidade da despesa, quer aquela de natureza pública ou a despesa de natureza privada.

Em face disso, quais seriam as soluções?

AM - Precisamos reduzir custos nas nossas operações, precisamos gastar melhor com os poucos recursos que temos. O momento actual obriga que nos tornemos mais eficientes. Precisamos, neste momento, de nos voltarmos para a exploração das demais oportunidades que o país nos oferece.

O país continua economicamente viável, mas precisamos de mudar as nossas mentalidades. Precisamos ver a crise como uma janela de oportunidades. Precisamos ser introspectivos e aguçar a nossa criatividade, tal como da noite escura nasce o dia claro.