Luanda - Li com a atenção merecida as declarações do líder do (ainda) maior partido da oposição proferidas em conferência de imprensa realizada na quinta-feira da semana passada. Como não podia deixar de ser, a crise dominou a intervenção de Isaías Samakuva. Na verdade, “dominou”, digamos assim, em sentido inverso, pois o presidente da UNITA tratou de desvalorizá-la em absoluto. Parece que, para ele, a crise não existe.

“Tudo o que vai mal na nossa economia não se deve à crise internacional”, afirmou Samakuva, citado pelo semanário A Capital. Esta frase é espantosa. Ouso sugerir ao jornalista Reginaldo Silva que a inclua no seu interessantíssimo blogue “Morro da Maianga” entre as candidatas à frase do ano. Se me for permitido, manifesto aqui o meu voto sincero e rigorosamente independente por essa declaração.

O líder da UNITA acha que há má gestão por parte do governo. Milhões de outros angolanos, entre os quais me incluo, também acham que, em algumas áreas, há problemas de gestão sérios e inegáveis. O problema, para Samakuva, é que esses milhões, a avaliar pelos resultados eleitorais de Setembro de 2008, não acreditam no genuíno interesse e sobretudo na capacidade da UNITA para resolvê-los. Por isso, preferem continuam a tentar contribuir para melhorar a gestão do nosso país por outras vias, que não uma mudança radical e abstracta, de consequências imprevisíveis. Uma dessas vias são as críticas e as sugestões feitas ao governo e ao partido no poder.

Aliás, na conferência de imprensa que organizou na passada quinta-feira, Isaías Samakuva limitou-se a chover no molhado, ou seja, a lançar ataques ao governo e ao MPLA. Esse é o seu papel, dir-se-á. É verdade. Mas um partido de oposição que pretenda alcançar o poder (ainda é o caso da UNITA?) não pode limitar-se a criticar o governo. Tem de apresentar soluções credíveis e exequíveis.

E o que dizer, por outro lado, do facto do líder da UNITA se ter vangloriado perante os jornalistas, por causa, segundo ele, do aviso do seu partido aos cidadãos angolanos, no sentido de que 2009 seria um ano difícil? É caso para comentar: grande coisa!...

Samakuva também se gabou da posição da UNITA contra o Orçamento Geral do Estado (OGE) deste ano. Segundo ele, o maior partido da oposição votou contra o OGE de 2009 “porque sabíamos que a previsão de receitas do governo não era realista”. Acontece que, na prática, o orçamento foi aprovado, digamos assim, condicionalmente, pois foi acompanhado de uma resolução da Assembleia Nacional recomendando a sua rápida revisão, caso o preço do petróleo se mantivesse durante muito tempo abaixo dos 55 dólares.

De lembrar que o OGE foi aprovado em Novembro do ano passado, quando, talvez mais do que agora, era praticamente impossível fazer prognósticos exactos e rigorosos, no que diz respeito à evolução económica internacional, além da certeza de que a crise tinha vindo para durar. A posição do governo e da Assembleia Nacional, portanto, foi de grande cautela, ponderação e sentido de Estado. A UNITA parece não saber o que é isso, pois está exultante com o facto de as “desgraças” que anunciou se estarem, supostamente, a confirmar.

Para dar alguma consistência à tese de que todos os problemas económicos e sociais do país se devem à alegada má gestão do governo, Isaías Samakuva questionou, enfim, o facto de, segundo a imprensa, o Estado já ter utilizado uma parte das reservas nacionais, estimadas em Novembro do ano passado em quase 18 mil milhões de dólares. A pergunta que deixo aos leitores, para reflexão, é a seguinte: se todos os países estão a ser obrigados a mexer nas reservas para enfrentar a crise, Angola poderia ser o único a não fazê-lo? Somos assim tão especiais?

Ah, já me ia esquecendo que, para a UNITA, a actual crise global não chegou ao nosso país. Por isso, a conclusão da conferência de imprensa de Samakuva só poderia ser uma: a crise não passa, supostamente, de um pretexto do MPLA para não cumprir as promessas feitas na última campanha eleitoral.

Qualquer dia, a UNITA, com o seu permanente discurso auto-vitimizador e a sua obsessiva teoria conspiratória, ainda diz que a crise “é uma manobra do MPLA”.

Fonte: Jornal de Angola