Luanda - Durante o último semestre Luanda tem passado por inúmeras restrições no abastecimento de energia eléctrica. Pelo que parece e se recorrermos a prática dos anos anteriores, essas restrições irão arrastar-se por muito mais tempo com a chegada do mês de Dezembro, que representa sempre um mês de difícil gestão nessa matéria.

Fonte: Club-k.net

Até quando é o que se desconhece e esta é a pergunta que certamente qualquer habitante dessa urbe tem feito, sobretudo com a retirada da subvenção ao combustível, porque diante desse quadro a ENDE (Empresa Nacional de Distribuição de Electricidade) passou de fonte efectiva à alternativa aos geradores, que sem dúvida continuará a ser uma indústria bastante rentável. Situação que já vai atingindo um estágio de “tensão latente” e bastante insuportável, as restrições ocorrem a qualquer hora e período do dia, prolongando-se muitas vezes por mais de 24 horas. O que denota uma eficiência na implementação do plano de restrições no fornecimento de energia à província de Luanda. Contrariamente ao que devia ser feito, isto é, desenvolvimento de um plano de fornecimento de energia eléctrica que superasse os défices, que se a memória não me for estéril, remota ao tempo que apenas Cambambe abastecia Luanda.

 

Entretanto, invocar variáveis de ordem temporal e/ou a falta de receitas pode parecer miópia. Por mais de duas décadas e com um custo global estimado em 2,6 mil milhões de dólares foi erguida àquela que até poucos anos atrás foi considerada a maior obra de engenharia do período pós independência em Angola – a barragem hidroeléctrica de Capanda localizada na bacia do Rio Kwanza, município de Cacuso, província de Malange, cuja capacidade de produção efectiva foi estimada para abastecer energia eléctrica a cerca de seis milhões de pessoas em cinco províncias, incluindo Luanda. A entrada em funcionamento da barragem hidroeléctrica de Capanda, criou muita expectativa na superação do défice de abastecimento de energia eléctrica. Todavia, decorrida cerca de uma década desde a sua entrada em funcionamento, Luanda continua a enfrentar situações insustentáveis de restrições no abastecimento de energia e a ter muitos dos seus espaços públicos e servidões comuns de muitos edifícios e equipamentos sociais repletos de geradores. Será que foi um erro passar a idéia de que a barragem de Capanda era a solução do problema energético nacional? Até quando Luanda continuará à aguardar por Capanda?

 

Parece-me ter havido uma mudança estratégica de planos e uma transferência simultânea das expectativas de muitos angolanos, em particular dos habitantes de Luanda, para a barragem hidroeléctrica do Laúca, o maior projecto hidroeléctrico de Angola ainda em construção, que consiste no desvio do Rio Kwanza, na província do Kwanza-Norte. Cujo orçamento está estimado em cerca de 3,7 mil milhões de dólares. Superando Capanda também no que tange a sua monstruosidade em termos de engenharia e capacidade ou seja quatro vezes mais que a barragem de Capanda, cuja entrada em funcionamento está prevista para o ano de 2017.

Se um dos fundamentos da actual onda de restrições no abastecimento de energia eléctrica à Luanda, tem sido a incapacidade e/ou a falta de linhas de transporte, o que pressupõe haver uma maior produção de energia actualmente, justificava-se tanto nessa altura criar um projecto a dimensão de Laúca? Talvez fosse melhor, pelo menos para Luanda, haver maior investimento nas linhas de transporte e distribuição, que ficar na expectativa de cada vez mais energia, que em boa verdade vai tardando em chegar à Luanda.


Resta-nos manter alimentada a expectativa, ainda não afundada pela esperança que após a entrada efectiva em funcionamento da barragem de Laúca, Luanda não tenha que continuar, pelo menos, a (con)viver com restrições, que em bom rigor e nas sociedades modernas, integradas nos Estados Democráticos e de Direito, põe em causa a vivencia de qualquer pessoa com o mínimo de dignidade e nessa perspectiva pela disposição da alínea d) do art.º 21º da CRA que elenca como uma das tarefas fundamentais do Estado angolano a “promoção do bem-estar, a solidariedade social e a elevação da qualidade de vida do povo angolano, designadamente dos grupos populacionais mais desfavorecidos”, as constantes restrições do acesso a energia eléctrica, porquanto a disponibilidade da energia eléctrica representa um incremento na qualidade de vida das populações e todo o cidadão tem direito à qualidade de vida (art.º 85º CRA), pode ser tida como uma omissão de uma das tarefas fundamentais do Estado, salvo melhor entendimento.

Portanto, essa “crise”, no fornecimento de energia à Luanda leva-me a questionar publicamente quais os fundamentos da política energética nacional, sobretudo para o caso particular de Luanda. O desconforto parece-me ser geral, isto é, tanto para os utentes por um lado e os responsáveis deste sector que é o motor de qualquer economia, por outro lado. Mas, também devemos convir que uma informação de melhor qualidade ajudaria muito a formar uma opinião pública mais favorável. Bem-haja todo esforço nesse sentido.

N’junjulo António
Jurista