Luanda - A recente notícia do jornal Público sobre o fecho da empresa que detém dois jornais portugueses, nomeadamente o Sol e i, do grupo liderado pelo empresário Álvaro Sobrinho, está a causar apreensão nos meios jornalísticos angolanos.

*Pedro Filipe
Fonte: Club-k.net


Os receios estão relacionados com o facto de o império empresarial do antigo presidente do BESA ser também detentor de vários títulos de imprensa em Angola, alguns dos quais já desaparecidos do mercado, nomeadamente os jornais Angolense, Continente e mais recentemente o Agora.


Suspeita‐se que a compra dos três títulos terá sido feita com o objectivo de encerrá‐los, numa estratégia eu visava o silenciamento da imprensa privada. O espectro do desemprego ameaça agora os trabalhadores de dois títulos ainda no activo, nomeadamente o Novo Jornal e Expansão.

 

O sentimento de insegurança estende‐se também aos demais jornais privados que terão sido adquiridos por empresas afectas ao poder, mas que agora têm a sobrevivência ameaça devido à grave crise que afecta a economia angolana. Na sua generalidade, os jornais estão com salários em atraso e sem capacidade para contornar as enormes despesas, uma situação que tem sido agravada com fracas vendas e falta de publicidade.

 

O jornal Público revelou que a decisão do grupo liderado por Álvaro Sobrinho foi transmitida na segunda‐feira num plenário de trabalhadores, tendo lhes sido comunicado que os accionistas do diário i e do semanário Sol decidiram encerrar a empresa detentora dos dois títulos, a Newshold. Em seu lugar surgirá um novo projecto jornalístico que deverá manter os títulos mas que acolherá apenas um terço dos efectivos da actual estrutura.

 

O plano passa por despedir cerca de 120 pessoas e manter apenas 66 trabalhadores, com salários inferiores aos actuais. Em relação à redução dos salários, há quem considere a medida um despedimento indirecto dos trabalhadores. Na origem do fecho, que foi marcado para 15 de Dezembro, estão os elevados prejuízos dos dois jornais, que em 2014 foram da ordem dos 4,4 milhões de euros no Sol e dos 3,8 no i.

 

Quer numa quer noutra empresa registavam‐se já atrasos no pagamento de ordenados. No plenário foi também anunciado que os salários de Novembro dos profissionais das duas publicações serão pagos até ao final da semana, enquanto o subsídio de Natal será entregue até à época festiva. A presidente em exercício do Sindicato de Jornalistas, Ana Luísa Rodrigues, já repudiou a situação e alerta os trabalhadores para que não assinem, "no calor do momento", documentos que lhes sejam apresentados e que lhes possam mais tarde vir a retirar direitos ‐ nomeadamente autorizações que dispensem a empresa de apresentar uma caução para os créditos devidos aos trabalhadores.

 

"O que está a acontecer é uma machadada na diversidade da paisagem informativa em Portugal", observa Ana Luíisa Rodrigues. "Não se faz um diário e um semanário com menos de 70 pessoas". Os dirigentes sindicais vão agora pedir uma reunião à administração da Newshold e outra à pessoa envolvida na manutenção dos dois títulos, o administrador executivo Mário Ramires ‐ que deverá integrar a estrutura accionista do novo projecto ‐, com vista à preservação dos dois jornais, assim como dos postos de trabalho, "renunciado à solução mais fácil do encerramento e do despedimento".

 

Os números mais recentes da Associação Portuguesa de Controlo de Tiragens (APCT), relativos ao período entre Janeiro e Agosto deste ano, indicavam que, no segmento circulação impressa, o i foi o único jornal a ter subidas entre os cinco generalistas, passando para 3969 exemplares este ano, mais 530 que em 2014 (quota de 2%). O diário tinha encerrado 2014 com uma média de circulação paga de 4118 exemplares por dia.

 

No segmento digital, o diário conseguiu 64 vendas digitais, o triplo do conseguido no período homólogo do ano passado, que concluiu com menos de duas dezenas de assinaturas digitais. Na circulação impressa, nos primeiros oito meses do ano, o Sol caiu dos 21.705 para os 20.015 (‐7,79%). O semanário tinha fechado 2014 com uma média de vendas de 23 mil jornais por semana, o que representou uma quebra homóloga de 2,7%.

 

Álvaro Sobrinho foi indiciado por branqueamento de capitais no âmbito de um inquérito do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, tendo recentemente visto o Tribunal da Relação de Lisboa criticar a investigação e levantar‐lhe um arresto de bens que havia sido decretado pelo juiz Carlos Alexandre.