Luanda - “Este país não é para velhos”, é o titulo de um aclamado e premiado filme dos irmãos Cohen que data de 2007/2008. A película fala de tudo menos do que a sua “chamada de capa” poderia fazer supor, numa primeira e imediata leitura com os olhos de alguém que tem o nosso contexto social.

Fonte: O Pais

Acabamos por ver este filme “enganados” pelo seu título, embora saibamos que os realizadores raramente deixam os seus créditos por mãos alheias. Efectivamente, estávamos a espera de uma outra história completamente diferente daquela que preenche o enredo extremamente violento do filme mais famoso e comercialmente mais rentável dos Coen.


Na memória e bem gravado, apenas ficamos com o seu sugestivo título a espera de o parafrasear/utilizar numa primeira oportunidade proporcionada pela produção regular das nossas “curtas metragens”, com que vamos radiografando o quotidiano deste “gigante, agora renascido das cinzas”.

Este ensejo surgiu-nos esta semana a propósito da passagem do “Dia Nacional do Idoso” que se assinalou segunda-feira última pela terceira vez, salvo erro, desde que a jornada do 30 de Novembro foi criada pelo Executivo.

Pelo que julgamos saber, esta consagração da data terá acontecido na sequência da aprovação em 2012 da politica pública de apoio social a pessoa idosa em Angola, que é toda aquela que tem mais de 60 anos e que se encontra em “situação de dependência física ou económica e de isolamento”.

Se de facto o filme do Ethan e do Joel Coen tem muito pouco a ver com o seu título, o mesmo já não se pode dizer de um país concreto chamado Angola onde para certos “items”, cada vez se precisa menos da ficção para imaginarmos determinados dramas humanos, porque a realidade a ultrapassa e por vezes de forma bastante generosa.

Assim sendo e diante da realidade, não temos qualquer dúvida em afirmar que Angola ao lado de vários/muitos outros pelo mundo poderia ser um dos países onde se podia facilmente rodar um filme com o mencionado título.

Efectivamente, Angola continua a não ser “um país para velhos” com problemas sociais graves e com os quais o Estado até tem compromissos constitucionais, que desde 2012 passaram a estar plasmados em lei própria.
Também não o é para os outros kotas mais abastados/remediados, diante do deserto que continua a ser a oferta de serviços de instituições especializadas para os devidos efeitos, que vão da medicina aos lares de acolhimento para a terceira idade.

Neste “segmento do mercado”, Luanda com mais de seis milhões de habitantes, 40 anos depois da Dipanda ter sido proclamada, continua a viver apenas de um asilo público para velhos, que é o Beiral da Terra Nova herdado da caridade colonial.

Este ano ouvimos o “ministro da especialidade” fazer algumas promessas que nos fizeram lembrar as “esperanças idosas” cantadas pelo Teta Lando.

A fazer fé nas promessas do cada vez mais kota, João Baptista Kussumua, o Beiral da Terra Nova vai passar proximamente por obras de requalificação.

Ainda não sabemos bem o que se pretende com este investimento público em termos de objectivos mais concretos.

Provavelmente, será o alargamento do Beiral no que toca ao aumento da sua capacidade de absorção dos idosos que são postos no olho da rua das suas próprias casas e pelos seus próprios familiares mais directos, entre filhos e netos.


Este ano, voltamos a ouvir verdadeiras histórias de terror contadas na primeira pessoa pelos idosos vítimas daqueles que eles geraram, criaram e educaram.

Por estas e por muitas outras razões, Angola não é mesmo um “país para velhos”, situação que se pode vir a agravar na sequência da crise instalada e que já lançou para o desemprego milhares de trabalhadores entre nacionais e estrangeiros.

Se para os mais jovens as coisas já estão a “tocar a sargentos”, é fácil de imaginar o que se passará com os idosos socialmente desprotegidos, mesmo aqueles que já foram atirados para o cuidado das poucas instituições públicas de apoio, que mal ou bem estão em funcionamento.

Costuma-se dizer, meio a brincar meio a sério, que quando os políticos mandam arranjar as cadeias é porque, finalmente, começaram a pensar neles próprios e na possibilidade de lá irem parar um dia destes.
No caso do investimento nos asilos esta possibilidade ainda é mais real, antes de mais porque todos estamos condenados a envelhecer, quer queiramos quer não.

Depois, em menor grau de probabilidade, todos também corremos o risco a sermos vítimas da violência usurpadora dos nossos familiares ou de desaparecermos do radar por força de uma demência qualquer do tipo Alzheimer/Parkinson.

PS- Com o título o “País e os Velhos” este texto foi publicado na Revista Vida/Secos e Molhados/O País (4-12-15