Luanda - O Governo de Angola deve voltar aos mercados já no próximo ano ou no ano seguinte, disse à Lusa a assessora jurídica que preparou e coordenou o lançamento da emissão de dívida pública em novembro.

Fonte: Lusa

Em entrevista à Lusa a partir de Luanda, a sócia da sociedade de advogados 'FBL Advogados', Djamila Pinto de Andrade, disse que "não está nada previsto para breve, mas dado o sucesso da operação de novembro, Angola ficou com mais uma fonte de financiamento em cima da mesa que muito provavelmente voltará a ser usada em 2016 ou 2017".


A advogada, que também trabalhou com o Executivo angolano no lançamento da bolsa de valores em Luanda, foi uma das responsáveis por todo o trabalho jurídico de lançamento da primeira emissão de dívida pública em 'eurobonds', no princípio de novembro, que permitiu a Angola encaixar 1,5 mil milhões de dólares, pagando uma taxa de juro que ronda os 10% ao ano.

Questionada sobre este valor, que na prática significa que Angola devolverá aos investidores o dobro do que pediu emprestado no decurso do empréstimo, até 2025, Djamila Andrade reconhece que "para a realidade europeia as taxas são altíssimas", mas lembrou que "num mercado emergente e qualificado como de risco, foi uma grande vitória para o Estado, porque mesmo nos empréstimos bilaterais as taxas não são muito mais baixas".

Até ganhar a confiança dos investidores, sublinhou, "temos de suportar estas taxas".

O processo de lançamento de uma emissão de dívida soberana começou a ser trabalhado em 2011, e conheceu uma forte aceleração nos últimos meses dada a degradação das condições económicas do país, nomeadamente no capítulo das receitas para os cofres públicos, que caíram a pique com a descida do preço do petróleo desde meados do ano passado.

Questionada sobre os quatro anos de preparação, Djamila Andrade admitiu que o processo demorou mais do que o previsto, mas elencou um conjunto de dificuldades próprias de um país em crescimento e de uma economia que dá os primeiros passos no mercado de capital, para além dos constrangimentos estatísticos conhecidos.

"O país precisava de uma certa organização e nestes processos de emissão nos mercados internacionais é preciso fornecer elementos devidamente organizados, e não só financeiros, é mesmo uma radiografia do país", disse, notando que "o grau de exigência da informação, do detalhe e precisão da informação solicitada foi a maior dificuldade" para quem coordenou o processo de compilação e apresentação da informação aos investidores.

"Os mercados financeiros procuram minimizar o risco e valorizar o que é relevante; sempre que há emissões novas, há sempre uma grande preocupação de, na primeira emissão, levar à exaustão o processo de informação para determinar o risco", acrescentou o advogado da Abreu Advogados Miguel Castro Pereira, que tem uma parceria com a FBL Advogados em Angola e que também participou no processo.

"Fomos massacrados no 'roadshow' sobre a situação do país", acrescenta Miguel Castro Pereira, considerando que o facto de a procura ter sido três vezes superior à oferta mostra que, "apesar das circunstâncias, os investidores acreditam que se vai dar a volta e que a emissão acaba por ser muito atrativa face ao risco" que Angola apresenta.

"Nunca houve qualquer problema em servir a dívida, Angola sempre honrou os seus compromissos, e isso tem valido muito a favor do país; toda a gente tem presente as dificuldades mas esforçamo-nos pela diversificação da economia", conclui a advogada angolana.

A primeira emissão de dívida pública em 'eurobonds', em novembro, obrigou o presidente da Imprensa Nacional a passar a noite em claro para publicar as condições do financiamento até cinco horas depois, recorda Djamila Pinto de Andrade.

"O decreto ministerial [sobre a emissão de dívida] tem de estar publicado até cinco horas depois [de concluído o processo de emissão de dívida], mas com a diferença horária [para os Estados Unidos, um dos mercados onde o 'eurobond' foi lançado], tivemos de colocar o Presidente do Conselho de Administração da Imprensa Nacional à espera, durante a noite, para receber o documento e colocar na hora", revela a advogada.

Esta foi uma das várias dificuldades caricatas que a sociedade de advogados teve de ultrapassar na preparação e lançamento deste emissão de dívida pública, que tem uma maturidade de 10 anos e uma taxa de juro a rondar os 10%, o que significa que Angola terá de devolver aos investidores, até 2025, o dobro daquilo que pediu emprestado, ou seja, cerca de 3 mil milhões de dólares.

"A FBL teve de ultrapassar constrangimentos legais e regulamentares, e foi um processo de aprendizagem", lembra a advogada, comentando o processo de preparação para a emissão feita a 5 de novembro deste ano.