Lisboa - Os investimentos que o regime angolano fez para o controlo da comunicação social portuguesa, que se traduziram na compra de vários títulos da imprensa escrita, rádios e televisões, estão a revelar­-se num autêntico fracasso.

*Pedro Filipe
Fonte: Club-k.net

Nos últimos anos, Luanda, através de dois empresários que prosperam à sombra do poder político angolano, lançou­-se na compra de acções em empresas lusas ligadas à comunicação social, com objectivo de inverter as suas respectivas linhas editoriais ou, melhor, “domesticá­-las”.


Convém recordar que o mesmo processo ocorreu há cinco anos em Angola, quando empresas “fantasmas” cujos proprietários ocultando­-se em “sociedades anónimas” tomaram de assalto alguns jornais tidos como mais críticos e irreverentes ao poder. Em Portugal, o plano, que se enquadrava numa estratégia de lavar a imagem do regime no «coração do inimigo», levou à compra de acções em jornais como o Sol, i, Diário de Notícias, Jornal de Notícias, O Jogo, Dinheiro Vivo e rádio TSF.

Os dois primeiros títulos tinham sido adquiridos pela Newshold, afecta ao antigo Presidente do Conselho da Administração do BESA, Álvaro Sobrinho, e os restantes pela Global Media, do empresário António Mosquito. Pelo caminho ficou a intenção de compra de acções e consequente controlo da RTP, o principal canal público da televisão portuguesa, assim como dos jornais “Público” e “Expresso”.

Consta que tentativas no mesmo sentido terão tido algum sucesso junto da SIC, ficando, no entanto, por se saber os resultados das negociações. O certo que o Presidente angolano concedera, há dois anos, uma entrevista de 45 minutos ao correspondente daquela estação televisiva no Médio Oriente, Henrique Cymerman.

Em relação à citada entrevista, alguns analistas políticos disseram na altura tratar-­se de um “ presente encomendado”, já que José Eduardo dos Santos não concedia grandes entrevistas há 22 anos a órgãos de imprensa estrangeiros. Mais infeliz tem sido a imprensa angolana, à qual o Presidente da República não concede entrevistas há mais de 30 anos, sendo a última dada à Angop em 1985.


A hora e a vez de António Mosquito Poucos dias depois de ter sido anunciado o fecho da empresa que detém o Sol e i, pelo grupo liderado pelo empresário Álvaro Sobrinho, o semanário Expresso revelou na semana passada que António Mosquito prepara­-se para sair da Global Media, onde detém 27,5 por cento das acções.
A entrada deste último empresário no negócio da comunicação social lusa, segundo alguns analistas, terá surgido numa altura em que o nome de Álvaro Sobrinho já se encontrava sob os holofotes da justiça lusa devido ao seu alegado envolvimento no milionário escândalo financeiro do BES/BESA.


Diz o Expresso que entre as figuras que sabem da decisão de António Mosquito está o angolano Carlos Silva, vice­ presidente do conselho de administração do BCP – banco credor da Global Media que transformou esse crédito em participação accionista ­, que será responsável por agilizar a procura de interessados em adquirir 27,5 por cento de um dos maiores grupos de média portugueses.


Ao mesmo jornal, o presidente não­ executivo da Global Media, Proença Carvalho, nega a informação de que Mosquito esteja interessado em abandonar a empresa, afirmando que não recebeu qualquer indicação nesse sentido.

Com a entrada do empresário angolano na estrutura accionista, o grupo assumiu um plano de redução de custos que incluiu o despedimento de 160 funcionários e outros cortes nas despesas. Em 2013, o défice da Global Media rondava EUR 12 milhões (USD 13,2 milhões), agora deverá ser inferior a EUR 1 milhão (USD 1,1 milhões).

Além de António Mosquito, a estrutura accionista da Global Media é composta por Joaquim Oliveira, o anterior dono da totalidade das acções do grupo (com também 27,5 por cento das acções), o empresário da área musical Luís Montez, filho do homónimo Luís Montez que foi o maior empresário musical em Angola no tempo colonial (15 por cento), e o BCP e o Novo Banco, que eram os dois maiores credores do grupo (30 por cento) e aceitaram transformar esse crédito em acções.

No final do mês passado, o “Correio da Manhã” adiantou que os edifícios emblemáticos dos dois principais jornais do grupo, o do “Diário de Notícias”, que está localizado na zona mais nobre do país, a Avenida da Liberdade, em Lisboa, onde estão as principais marcas de luxo, e o “Jornal de Notícias”, no Porto, estavam em processo de negociação para serem vendidos. O primeiro por EUR 20 milhões (USD 22 milhões), o segundo por EUR 10 milhões (USD 11 milhões).


Ao contrário de Álvaro Sobrinho que detém em Angola alguns títulos, nomeadamente os jornais “Expansão” e “Novo Jornal”, António Mosquito não tem investimentos em jornais ou rádios do país. A sua aposta na imprensa lusa em detrimento da imprensa doméstica valeram­-lhe na altura algumas críticas por ele ter preterido os interesses nacionais a favor de estrangeiros.


A crise que actualmente ensombra o panorama mediático português está a ser encarada como uma séria ameaça ao mercado angolano, onde medram os receios de que alguns títulos da imprensa privada poderão sucumbir ainda no decorrer do próximo ano. Estes receios são fundamentados, em grande medida, no facto de, nos últimos anos, terem desaparecido do mercado só à conta do empresário Álvaro Sobrinho três jornais, nomedamente “Angolense”, “Continente” e “Agora”.