Luanda  - Na quadra festiva do Natal de 2015, no âmbito da Cultura, a Dona Isabel dos Santos, filha do Presidente Angolano, tomara a iniciativa de trazer ao palco musical angolano uma cantora americana, bem extravagante, na sua manifestação artística, que fez levantar a poeira e provocar um debate aceso e contraditório no meio público, e sobretudo, nas redes sociais.

Fonte: Club-k.net

Se tratava da cantora Nicki Minaj, de raça negra, tipo Barack Obama, bem conhecida pela sua magia feminina, da articulação corporal, como instrumento artístico de dança, assente no nudismo, na sexualidade e na graça da beleza. Ela aposta­se e capitaliza­se nesta componente integral – morfológica, fisiológica e psicológica – como instrumentos poderosos de encanto, de fascínio, de paixão e de estímulos de sentidos e de instintos sexuais, de quem lhe assiste.

A música, a dança, a beldade e a sexualidade são elementos fundamentais, inerentes da mulher, que projectam seu carácter e que lhe transforma num autêntico mistério, que encanta o mundo, de modo distinto e maravilhoso. A mulher, de modo geral, é mestre da dança e da canção, que domina os grandes palcos culturais e estabelece a sua supremacia feminina em todas comunidades humanas – primitivas ou modernas.

As grandes celebrações e convívios da classe alta e da nobreza, por exemplo, são animados e divertidos por cantoras e dançarinas, de corpos expostos, bem enfeitados, cuja beldade é o motivo de encanto e de relaxe psicológico. Isso é uma realidade evidente de todos povos do mundo – africanos, árabes, europeus, asiáticos e americanos. Alias, a mulher é a fonte da vida, repositório de sapiência e força motriz das sociedades.

Feita uma incursão breve na história da humanidade, o nudismo ou o naturalismo são realidades inequívocas do homem, quer no passado quer no presente. O lazer na praia, na piscina, na catarata ou no jardim turístico, por exemplo, é um acto do nudismo e do naturalismo, da expressão mais íntima da naturalidade e da sensualidade humana.

Na minha tribo Mbunda, do grupo étnico Nganguela, uma jovem noiva, na cerimónia de enlace matrimonial é minuciosamente embelezada; bem decorada com missangas, colares e pulseiras; com óleo natural; com pós brancos e vermelhos de barro; cabeça bem trançada; com peito todo descoberto, saliente e irradiante; sentada na esteira, ou na pele da onça se ela é da família nobre; com olhos cintilantes, serena, meiga, apaixonante e digna. Bem­disposta para ser apreciada e louvada por todos, uma revelação de cultura, de feminilidade e de beleza.

Destaca­ se, nesta referência, a beldade mística da mulher mucubal, da província do Namibe, que representa não só o símbolo da beldade angolana, mas sobretudo, da qualidade particular e natural da mulher preta, sem quaisquer enfeites que caracterizam a mulher moderna, e que ocultam a naturalidade da pessoa. Logo, por muito tabu que envolve a cultura negro­africana, mas a realidade inequívoca é esta, que não se afasta tanto da cultura nativa de outros povos do mundo.

As nossas comunidades indígenas estão recheadas de muitos valores costumeiros, de carácter tradicional, que representam as nossas matrizes culturais, inibidas ou ocultadas pela modernidade da civilização ocidental. Por sua vez, a civilização ocidental é protótipo da cultura pré­história, cuja origem está bem fixada na Africa Negra, que reinava o Império Egípcio, onde a beleza natural, marcada pela seminudez, era o factor dominante e fascinante.

A antropologia universal, na sua diversidade cultural, racial e étnica, é evidente neste respeito, em toda extensão geográfica do globo. As estátuas, os monumentos e as representações figurativas de artes plásticas da antiguidade revelam nitidamente o nudismo, o seminudismo, o naturalismo e a sexualidade humana, como o enfoque da matriz cultural. Os patrimónios culturais da Igreja Católica Romana, espalhados pelo mundo inteiro, por exemplo, são os mais vastos e os mais ricos das artes plásticas, figurativas da realidade cultural da antiguidade, nas quais o naturalismo e a feminilidade têm o destaque.

Lembro-­me tão bem da controversa havida em torno da estátua de Muana­Puo, da cultura Chókue, instalada na saída do Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, em Luanda, e por contestações públicas tivera sido retirada. A nudez da estátua feminina é que provocara as emoções negativas do público, na base de tabus, que não reflectem os factos indisputáveis da cultura indígena angolana. Pois, uma estátua é uma obra de artes (escultura) plásticas, e a arte chókue é uma das artes mais expressivas e mais apreciadas do mundo.

Os canais televisivos da Africa Magic, do DSTV, são fontes mais ricas para perceber bem a profundidade da cultura negro­africana, na sua diversidade, de estudos comparativos da realidade contemporânea das comunidades negras. O seminudismo ou naturalismo, de ambos sexos, na vivência quotidiana, na arte, na música e na dança, reflectem a mística da beleza negra e o carácter específico dos valores costumeiros – quer no sentido positivo quer negativo.

A Africa Magic, sobretudo os filmes dos autores nigerianos, fazem um estudo comparativo bastante crítico entre o direito costumeiro e o direito positivo, mostrando os elementos positivos e negativos de cada um deles. Pois, o direito costumeiro ou o direito positivo são reflexos de diversas culturas que se manifestam nos hábitos, nos costumes, nos usos, nas práticas e nas crenças dos povos. Através disso, permite distinguir os elementos positivos e negativos de ambas civilizações e dos impactos que exercem sobre o meio social.

Na evolução das sociedades, através de um processo intenso e gradual de interacção, assimilação, aculturação e integração, resulta­-se na alienação de determinados valores culturais, que caiem em desuso e tratados de «maus costumes». Os valores culturais que se afirmam neste processo, quer nativos quer importados, se transformam em «bons costumes», conformando­ se com a ética e a moral de momento.

Acontece que, a cultura dos países fortes e avançados, como dos Estados Unidos da América, tem o potencial de afirmar­-se e de impor­se sobre as culturas dos outros povos menos avançados. Porque são considerados, neste respeito, como sendo elementos mais actualizados e mais consentâneos com a realidade desta época. Acima disso, a civilização norte americana é uma miscelânea de várias culturas, vindas de diversos continentes, mas sob o domínio anglo­americano.

Por outro lado, os anais da história da humanidade registaram as influências enormes dos Impérios Egípcio, Grego, Otomano, Romano, Britânico e Francês, que marcaram, de modo indelével, a civilização universal. Hoje, os Estados Unidos da América, por exemplo, afirmaram­-se como uma superpotência global, que se impõe, em termos cultural, no Mundo. O gosto pelo estilo da vida americana cresce continuamente em todos países do mundo, incluindo na China. Queira ou não, isso é uma realidade indubitável, que vai­se pendurar no tempo e no espaço.

O que me leva a fazer esta reflexão não consiste em defender a iniciativa da Dona Isabel dos Santos, mas de abrir as mentes das pessoas sobre os desafios que nos colocam diante o nosso passado colectivo, como Estado­Nação, cujo reflexo tem o peso psicológico enorme. Tendo em consideração os factores da globalização que se expandem e se afirmam continuamente em todos países do mundo. Não obstante, a Dona Isabel dos Santos não tivera sido feliz em disponibilizar avultado soma de dinheiro para encher a carteira de uma cantora estrangeira, numa altura desta, da crise profunda financeira que abateu sobre o país, sem recursos adequados para suprir a fome e a pobreza extrema que afligem a maioria esmagadora do povo angolano.

Não acreditado que, os artistas angolanos, que estiveram nos palcos, nesta quadra festiva do Natal, tiveram sido concedidos um décimo deste valor, oferecido de borla àquela afro­americana. Deste modo, a Dona Isabel dos Santos faltou­lhe o patriotismo, a sensibilidade humana, o coração de mãe, a solidariedade, a sensatez e a honestidade no uso de recursos públicos, à que ela tem acesso fácil, por ser filha do Presidente José Eduardo dos Santos, que manda em tudo e em todos. Isso revela também a profundidade da corrupção, da indiferença e da irresponsabilidade que se instalou na Cidade Alta.

No ponto de vista cultural, a cantora Nicki Minaj, a negra americana, é problemática de como ela explora a sua feminilidade para atrair o público – de modo positivo ou negativo. Porém, observando bem o comportamento da mulher angolana, sobretudo da Cidade de Luanda, no que se trata de seminudez ou da sexualidade, como manifestação de modernidade e da civilização ocidental, não foge muito daquilo que a Nicki Minaj expôs no palco, cá em Luanda. Até as mais velhas, consideradas tias, que deveriam servir de exemplos, aparecem seminuas nos meios públicos, num ambiente de relaxe absoluto, sem preocupar­ se com a opinião pública que lhes aprecia com desdém e desprezo. Fazem­-no com estravagância e sem pudor, pior que a cantora americana.

Portanto, este contexto é bastante complexo e exige uma ponderação profunda sobre a realidade cultural angolana, como Estado-­Nação, de matriz negro­ africana. Se a Dona Isabel dos Santos teve a ousadia de convidar a Nicki Minaj é porque teve o aval do Presidente da República, sobretudo da Ministra da Cultura. Ali estará o nó da questão, deste debate ardente que se desenrolou e continua a merecer comentários por vários círculos da sociedade angolana.

Aproveito esta oportunidade para saudar todos, esperando que a quadra festiva do Natal e do início deste ano, 2016, tenha sido feliz. Desejando que este ano seja próspero e produtivo para todos nós, como uma grande família angolana – Uno e Indivisível.

Bem­ haja Angola!

Luanda, 02 de Janeiro de 2016