Benguela - No meio das sombrias perspectivas que têm estado a marcar este arranque do novo ano “através”, nomeadamente, do aumento do preço dos combustíveis, mas não só, trago novamente impressões avulsas de uma viagem até Benguela, que já se tornou habitual realizar por ocasião da quadra festiva que marca a despedida do ano velho, sem nos garantir mais nada, para além de continuarmos vivos e agora já a começar a fazer contas ao tempo remanescente.

Fonte: Opais

Isto até novas ordens, contra as quais vamos continuar a lutar, pois por aqui, pelo nosso balneário, ainda ninguém parece disponível a querer atirar a toalha para o chão, o que quer dizer que ainda ninguém quer responder a uma das perguntas do famoso “Inquérito de Proust” que é a 26ª e que pretende saber como é que o inquirido gostaria de morrer.

 

Há uma outra pergunta que agora nas entrevistas à personalidades políticas também é muito usada, que é aquela onde se quer saber como é que o entrevistado gostaria de ser recordado.

 

A primeira e única vez que respondi ao “Inquérito de Proust” foi em 2000, tendo, se bem lembro, dito que não tinha nada para acrescentar de concreto, pois ainda não estava nos meus planos passar-me voluntariamente para o outro lado do mundo, de onde até então ninguém tinha regressado vivo, situação que se mantém até aos dias de hoje.

 

Quinze anos depois, se alguém nos voltasse a mandar o mesmo inquérito para os devidos efeitos, responderíamos da mesma forma, embora agora já pensemos um bocado mais no pormenor de uma eventual despedida deste mundo cruel, se nos fosse dada a possibilidade de fazer o cheque in de uma viagem que é claramente sem retorno.

Pela lei das probabilidades, esta remota hipótese já começa, entretanto, a aproximar-se mais da porta do nosso balneário, de nada adiantando estarmos aqui a fazer ouvidos de mercador.

 

Entre Luanda/Benguela/Luanda voltamos a “enriquecer” o motor da viatura que não nos larga há mais de 8 anos com a experiência de mais mil e tal quilómetros pela sempre esburacada estrada nacional numero 100, aos quais se podem acrescentar mais algumas dezenas feitos a percorrer as pequenas distâncias que separam a velha Ombaka das localidades vizinhas da Baía Azul, Catumbela e Lobito.

 

Benguela aqui ao lado de Luanda continua a ser uma boa e recomendável opção para se fazer turismo dentro das fronteiras nacionais, sem entrarmos em outras considerações relacionadas com os preços praticados.

 

Aí vamos ter, certamente, algumas dificuldades em sermos porta-vozes de outras sensibilidades, considerando que neste quesito, só mesmo cada um dos potenciais turistas pode falar da sua verdade, sem ter necessidade de fazer alguma declaração mais formal de rendimentos para pagar o imposto que a lei exige.

 

Sem termos uma ideia das taxas de ocupação das unidades hoteleiras localizadas naquela província, que já começa a estar bem servida neste sector, ficamos com a impressão que ela ainda não está ao nível desejado para sustentar a “industria da paz” local numa perspectiva que aponte para um crescimento mais robusto e sem recuos.

A industria do turismo em Benguela já tem pernas para andar, mas ainda lhe falta alguma coisa no que toca à promoção das capacidades disponíveis através de aliciantes pacotes específicos a serem publicitados em Luanda, onde está localizado o seu principal mercado de consumidores.

 

Não chegamos a ver, porque o acesso ao público ainda não é permitido, mas disseram-nos que já está pronta a centralidade de Benguela localizada nas imediações do Estádio Nacional de Ombaka, na Graça.

 

A pessoa que lá esteve à socapa e que nos falou do projecto, estava verdadeiramente impressionada com a gigantesca dimensão da (ainda) fantasma nova e moderna cidade satélite de Benguela, cuja data de inauguração permanece no “segredo dos deuses”, a espera, provavelmente, da aproximação das eleições de 2017, sendo da nossa inteira responsabilidade esta especulação.

 

O que é facto que ali está guardado mais um trunfo político que o poder vai, certamente, querer jogar na altura em que achar que os dividendos a retirar deste investimento serão os mais rentáveis para a sua imagem/estratégia.

 

O que está, entretanto, à vista de todos é o próprio Estádio Nacional de Ombaka servido por um generoso parque de estacionamento e com instalações anexas/coladas para todos os efeitos, desde os comerciais até aos mais institucionais, mas sem qualquer aproveitamento útil.

 

Tudo vazio.

 

Mais de cinco anos depois daquela infraestrutura ter sido erguida com o dinheiro de todos nós e com todas as condições para ali se desenvolver uma vibrante e multifacetada actividade geradora de rendimentos e empregos, o majestoso estádio continua silencioso e indiferente ao tempo que passa, como se alguém se tivesse esquecido dele ou mesmo proibido a rentabilização daquele amplo espaço.

 

In Secos e Molhados/Revista Vida/O País (8-1-16)