Lisboa – A justiça angolana continua cada vez mais a deixar muito a desejar. Talvez seja por isso que, a maior parte das vítimas, ou seus parentes, optam infelizmente, por fazerem justiças por mãos próprias quando se sentem lesadas pelos órgãos competentes, manipulados pelos juízes irresponsáveis e sem qualquer mínimo brio profissional.

Fonte: Club-k.net

          Família poderosa que resolve tudo com dinheiro

Recentemente, três famílias angolanas que perderam seus filhos (jovens na flor da idade) num aparatoso acidente de viação provocado por Guenad Octávio Vueloca Afonso, filho de um dirigente do regime que resolve os delitos com dinheiro, por excesso de velocidade e condução em estado de embriaguez, viram o juiz da causa dos crimes comuns do tribunal provincial do Kuando Kubango, Hélder Pedro António, a mandar ir para casa o “assassino”, sem mais nem menos, enquanto decorre o recurso ao tribunal supremo interposto pelos advogados de defesa.

Mas antes, o juiz Hélder António ordenou simplesmente o réu – com uma carta de condução atribuída depois do acidente e que nem sabia onde tratou), pagasse 300 mil kwanzas de caução carcerária e 18 milhões de kwanzas de caução económica as familiares das vítimas em gesto de recompensa, ou seja, indemnização. Além da taxa de justiça.

Perfeita sincronia entre o juiz da causa e a família do réu em saber de antemão qual seria o tecto disponível e, na verdade, duas horas depois da sentença, estavam aí os 18 milhões para evitar prisão do filho mesmo sendo culpado, demonstrando poder, arrogância e tráfego de influências.

Sabe-se que desde a data (24 de Outubro de 2015) em que se registou o violento acidente – no troço Menongue/Cuchi – que provocou as mortes de Eurico Kachilingui Tchimue Tchiwila, Abilio Augusto Vidigal e Hélder Manuel dos Santos Poa, o filho da poderosa família do Kuando Kubango nunca esteve detido (nem sequer por um minuto) pelas autoridades.

Facto que deixou de perplexa a cidade de Menongue e os familiares das vítimas que foram apelidados tribalmente de ‘mukuakuizas’, em dialecto local, que traduzindo literalmente significa “pessoas que não são naturais do Kuando Kubango”, pelos familiares do “assassino” na última sessão do julgamento que o processo número 85/2015 conheceu neste mês de Fevereiro.

“Como é que os ‘mukuakuizas vão nos pôr presos na nossa terra?”, questionavam os familiares do réu.

Apesar de os pesares, diante de tantas irregularidades e vícios, o juiz Hélder António decidiu aplicar inicialmente uma pena de um ano e seis meses de prisão efectiva. E quando o réu estava a ser dirigido para prisão, os seus advogados protestaram da decisão anunciando que iriam recorrer ao Tribunal Supremo e propuseram que o seu cliente, assassino, aguardasse em liberdade o recurso e o juiz Hélder António aceitou sem qualquer fundamento.

O mesmo ordenou simplesmente ao réu a pagar uma indemnização de 18 milhões (um para cada família), 12 para a viatura destruída e o resto para a taxa de justiça, enquanto se aguarda o veredicto do Tribunal Supremo.

Guenad, filho intocável do administrador do Dirico

Típico de “filhinhos do papai”, o jovem Guenad Octávio Vueloca Afonso, de 26 anos, é aquele tipo de filho “insurrecto” que goza sempre da protecção dos pais por mais que apronte. O “bad boy” faz tudo o que lhe der na gana e saiu sempre impune, graça a intervenção do pai, Afonso Dala.

Vale recordar apenas alguns delitos que este jovem  já cometeu:


- Em 2008, saiu ileso de acidente de viação no Cassequele, na altura conduzia um Toyota Starlet.
- Em 2013, foi expulso compulsivamente da República da Rússia onde estudava como bolseiro;

- A 12 de Outubro de 2015, em Menongue, corrompeu um regulador de trânsito para lhe passar a multa, como se este regulador tivesse apreendido a sua suposta carta de condução que por sinal já andava nas mãos da polícia.

- A 17 de Outubro de 2015, em Menongue, foi interpelado por um agente regulador quando representava um perigo aos utentes da via pública em plena cidade. O mesmo – já em estado de embriaguez – foi levado para a Unidade Operativa. Passando alguns minutos, Guenad foi posto em liberdade sem o carro.

- A 24 de Outubro do mesmo ano, via Menongue/Cuchi, Guenad, embriagado, tomou por insistência a viatura onde se encontrava os jovens Eurico Kachilingui Tchimue Tchiwila, Abilio Augusto Vidigal e Hélder Manuel dos Santos Poa (na 2ª imagem).
Devido ao excesso de velocidade perdeu o controlo do automóvel, pulando uma ravina de oito metros. Segundo uma fonte da viação e trânsito, a viatura parou a mais de 180 metros da estrada e danificou-se na totalidade como ilustram as imagens.

Mas durante o acto preparatório do processo, o regulador de trânsito que elaborou o relatório sobre o acidente, deturpou as informações evocando que foi apenas a três metros da estrada e mais adiante falou de 60. Suspeita-se que o mesmo foi corrompido pelo administrador do Dirico, Afonso Dala.

Guenad, em Menongue já nenhum agente de polícia de trânsito lhe interpela para evitar perder o emprego. Pois das variadíssimas vezes que foi interpelado pelos agentes, este agride-os verbalmente com ofensas vulgares, além de proferir ameaças.

O juiz Hélder António desrespeitou a lei

Contactado para comentar juridicamente sobre o caso, a jurista Evalina Chagas, explica claramente que tudo que é contrário a lei ou às normas vigentes num país constitui uma ilicitude, ou seja, um crime, contraversão, infracção etc., segundo a doutrina.

No caso de Guenad, filho da família poderosa, a nossa fonte esclarece que “conduzir sob efeito de entorpecentes (álcool) neste caso específico constitui crime, previsto e punível no art.º 80º do Código de Estrada”.

“Agrava nestas circunstâncias a falta de habilitação nos termos do art.º 121º que diz que ‘a carta de condução habilita a conduzir’, comunga neste dispositivo que o autor [Guenad] é um autêntico homicida nos termos do art.º 351º do Código Penal”, continuo.

“Este artigo diz que será punido com a pena de prisão maior de 20 a 24 o crime de homicídio voluntário declaro no artigo 349º, quando concorrer qualquer das circunstâncias seguintes: 1) Premeditação. 2) Quando se empregarem torturas ou actos de crueldade para aumentar o sofrimento do ofendido. 3) Quando o mesmo crime tiver por objecto preparar ou facilitar ou executar qualquer crime ou assegurar a sua impunidade. 4) Quando for precedido ou acompanhado ou seguindo de outro crime, a que corresponda pena maior que a de dois anos de prisão. 5) Nos crimes a que se referem os dois antecedentes números, não se compreendem aqueles que são pela lei, qualificados como crimes contra a segurança interior do Estado, sem complicação de outros quaisquer”, acrescentou a mesma.

Diante desta toda explicação, a jurista diz não compreender em que lei baseou o juiz Hélder António a condenar apenas um ano e meses de prisão ao réu, quando na verdade a mínima seria de dois anos e a máxima 20 anos. “Atesto que o conceito de crime ou delito é o facto voluntário declarado punível pela lei penal; conforme o nº 1.º do Código Penal”, enfatizou a mesma.

“É hora para se responsabilizar todos implicados (desde o réu, o instrutor do processo e o agente regulador de trânsito que omitiu os verdadeiros dados) que a coberto da justiça mancham o prestígio e bom nome da mesma com actos de corrupção e suborno, como aconteceu nas províncias do Cunene e Huambo”, concluiu.