Luanda - Quer gostemos ou não, falar da alternância do poder é uma conversa que deve ser encarada com normalidade em estados que se consideram democráticos e de direito. O ciclo da vida prevé um início e um fim, e não há como nos esquivar disso. Várias são as vezes que ouvimos que em Angola não existe uma outra pessoa com capacidades para dirigir o país para além do actual presidente. Ouvimos também que para além do actual partido no poder não existe outra formação política com capacidades e quadros para levar o país a um bom parto.

Fonte: Club-k.net

Bem, os únicos superheróis que conheço nesta vida (e que infelizmente são imaginários) são os que nos foram trazidos, primeiro em revistas da Marvel, e muito recentemente nos écrans da sétima arte. Estou a falar do homem‐aranha, super‐homem, hulk, thor, capitão américa e outros. Portanto, sou de opinião que falar da inexistência de possíveis alternativas é uma falácia que vai contra os designios da lei natural: porque ninguém é insubstituível. Mesmo os maiores governantes que a história universal testemunhou, como são os casos de grandes históricos bíblicos como Rei David e Salomão, ou os Imperadores Augusto (Romano), Meijin (Japonês), Zhuge Liang (Chinês), Genghis Khan (Mongólia), Napoleão, Bismark, o presidente Abraham Lincoln, o primeiro ministro Winston Churchill, e outros grandes líderes tiveram que enfrentar a lei natural. Todos estes estadistas tiveram que enfrentar o inevitável, a substituição. Portanto, o nosso caso não é diferente. A bíblia sagrada relata‐nos que Jesus Cristo instruiu os seus discipulos por cerca de três anos e, quando estes pensavam não estarem ainda preparados para levar avante o ministério por si sós, eis que o seu mestre partiu do seu seio. Para Deus eles estavam prontos, mesmo que não o soubessem. É verdade que existem governantes que são melhores do que outros, mas nunca se saberá quem é quem se não for experimentado.


Deus colocou mais de 24 milhões de almas neste espaço chamado Angola e não acredito que não existam altermativas. O que é importante, na minha opinião, é que devemos estar preparados e naõ ter medo que isso aconteça. É a lei da vida, e ninguém tem o direito de amedrontar o povo para uma eventual alternância. Devemos estar sempre prontos para a mudança, porque ela chega sempre, tarde ou cedo.


O recente pronunciamento do Presidente da República sobre a sua vontade de deixar a cena política em 2018 deve ser encarada com naturalidade e espero que não apareçam pessoas a querer passar idéias segundo as quais o “PR deve continuar porque o trabalho ainda não terminou”. A contribuição do presidente JES à causa da Angola é indiscutível, é necessário que se dê oportunidade ao homem para descansar e gozar a vida ao lado da esposa, dos filhos e dos netos. Algumas pessoas devem ser “desmamadas” e aprender que um país é sempre maior do que qualquer homem. Não queremos ver “opiniadores” e “bucólogos” a defenderem teses indefensáveis. Deixemos o homem ter o descanso que tanto merece.


Em 1975, a quando da independência, o país dispunha de muitos poucos quadros e muitos dos ministros, directores nacionais e outros quadros seniores do governo, naquela altura, nem a 12o classe tinham. Alguns foram indicados a cargos de governação simplesmente devido à sua trajectória política no partido que governava, e não necessariamente porque haviam provado serem competentes para o exercício de cargos de tamanha responsabilidade no país. Vale também a pena realçar que alguns daqueles dirigentes eram verdeiros patriotas que, de forma altruista, deram tudo de si para construir um país melhor para todos. Apesar de que os resultados muitas das vezes eram muito diferentes das boas intenções. Portanto, como sabemos agora, foram provocados muitos estragos à economia e a outros sectores chave cujos danos continuam a ser ressentidos até aos dias de hoje. Portanto, não acredito ser verdade que se diga que uma eventual alternância do poder em Angola irá atrasar com os processos de desenvolvimento em curso. Não acredito que em pleno tempo de paz e com o nível de consciência que hoje vemos na sociedade angolana, possa haver uma outra força política que, uma vez no poder, cause mais danos do que os verificados nos primórdios da nossa independência ou nos anos que seguiram a ela. As minhas razões são bem simples:


1. O país dispõe de mais gente preparada do que nunca;

2. Não concordo com o argumento segundo o qual a maioria dos quadros (melhor) formados pertencem ao partido no poder. Muitos dos quadros atrelados ao partido no poder só aí estão para usufruirem das oportunidades que a militância lhes propociona. Na maioria dos casos, não existe uma correlação entre o ser militante e as convicções ideológicas. Alguns teóricos da ciência política alegam que a ideologia na politica já faleceu há bastante tempo. Por isso, eu acredito que na eventualidade de uma alternância do poder, muitos militantes estariam disponíveis para servirem um novo governo. Muitos militantes não seguem ideologias e estão prontos a irem aí onde o vento soprar melhor. Muitos são por isso quadros do país e não do partido A ou B;

3. Existem muitos bons quadros tanto no partido que governa, como nos partidos da oposição, e também indíviduos apartidários. Precisamos de reforçar a separação de poderes e garantir que haja um maior “check‐and‐balances” (pesos e contra peso) entre o poder judicial, legislativo e executivo;

4. Temos uma maior consciência cívica, que não havia em 1975. Há uma maior pluralidade de pensamentos e a sociedade questiona e exige mais;

5. Os actuais dirigentes do partido no poder, na eventualidade de passarem à oposição, iriam fazer uma oposição acerríma e exigir do novo governo formado por um antigo partido da oposição que faça melhor do que eles. Aí teriamos um sistema de governação dinámico, com contraditório e a democracia iria beneficiar‐se muito disto. Teremos atingido a maturidade democrática quando, na prática, qualquer partido concorrente nas eleições ter as mesmas hipóteses de vencê‐las como qualquer outro partido;

6. As vezes, as verdadeiras mudanças somente são possíveis quando se rompe com um velho paradigma. Porque é difícil vencerem‐se vícios que se confundem com um modus vivendi. Muitos dos processos de desenvolvimento no país não andam devidamente por causa dos excessos de vícios. Algumas instituições e indivíduos com responsabilidade não têm força moral para realizarem convenientemente o trabalho que lhes é esperado por estarem muito comprometidos. Temos alguns bons governantes que poderiam fazer mais e melhor se no quadro em que operam não houvesse tanta sobreposição e uma hierarquização exagerada.


Entristece‐me bastante quando oiço de pessoas, algumas até com um certo nível de instrução, dizerem que não existem alternativas à altura no país, como se os que alí estão tivessem nascido sábios. Então quando é que se estará a altura? Em que país africano se reconheceu ter chegado altura para uma alternância? O ser humano, por natureza, é resistente às mudanças, mas elas não só devem acontecer como são necessarias. É claro que muitos têm medo da mudança por recearem perder as mordomias que a situação actual lhes proporciona e não necessariamente porque pensam no bem‐estar do colectivo. O exercício da alternância não somente fortifica a democracia como também solidifica o processo de paz.

Agora uma coisa deve estar bem clara, independentemente na mudança ou alternativa que possa haver um dia, é necessário que o verdadeiro poder resida de facto no povo e que as instituições sejam fortes o suficiente para combater os excessos e a impunidade. É necessário que se promova mais um estilo de governação participativa continuada e que vá para além da consulta para a obtenção do voto. Porque quer queiramos quer não, os verdadeiros problemas de África residem nos estilos de governação que têm sido implementados nos diferentes Estados.


Tenho consciência que temas como este são normalmente tabús em Angola e muitos anti‐ democráticos e extremistas poderão tirar ilações negativas que vão para além daquilo que pretendi transmitir, mas esta é simplesmente a forma como vejo o panorama político do meu país. Cada um é livre de olhá‐lo a partir do ângulo que achar mais conveniente. Então, quem está a altura de governar Angola?